• 24 de fevereiro – Dia da Conquista do Voto Feminino no Brasil

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15 de maio de 2024 por 

O ano de 2022 marcou o 90º aniversário do voto feminino nacional. Isto porque Getúlio Vargas elaborou o Código Eleitoral Provisório em 1932, estabelecendo que era eleitor todo cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo. No entanto, o Código Eleitoral de 1932 apenas permitia o voto de e para (i) mulheres casadas com o aval dos maridos ou (ii) viúvas e solteiras com renda própria. O voto das mulheres era facultativo, talvez uma tentativa de não estimular as mulheres a exercerem o sufrágio. Em 1934, o novo Código Eleitoral retirou as determinações dos itens (i) e (ii) acima, mas manteve o voto feminino como facultativo. Isto reflete a resistência apresentada pelo machismo da época, ameaçado pela presença feminina nos espaços institucionais de poder, o que inevitavelmente demonstra a força dessas mulheres que desafiavam as normas vigentes. A publicação Linha do Tempo 90 Anos do Voto Feminino no Brasil, organizada pela da Redeh, revela em detalhes todo o caminho percorrido pelas mulheres até o fatídico ano de 1932, assim como toda a trajetória posterior das mulheres brasileiras na política institucional.

Ainda que o sufrágio feminino tenha sido reconhecido nacionalmente em 1932, foi no Rio Grande do Norte que ele surgiu pela primeira vez. A professora Celina Guimarães Viana se alistou e votou em abril de 1928, em Mossoró, Rio Grande do Norte. O Poder Judiciário havia permitido que 21 mulheres, incluindo Celina, que foi a primeira a conseguir esse direito. O Senado, no entanto, invalidou os votos femininos daquela eleição. Isso não conseguiu apagar o pioneirismo das potiguaras, cuja experiência se espalhou entre os jornais, consagrando-as na história. E em resposta à realidade vivida por todas essas mulheres, Celina enviou telegrama ao Senado com apelo para que todas as mulheres obtivessem o direito ao voto – algo conquistado anos depois, ainda que com limitações.

Inevitável compreender que o pioneirismo das mulheres do Rio Grande do Norte influenciou na eleição da primeira prefeita da América Latina. Esta foi Alzira Soriano, que se tornou prefeita de Lages, RN. Assim resta demonstrado que a luta pelo sufrágio impactava positivamente a sociedade, abrindo portas antes trancadas para o ingresso de mulheres na política formal. Outra ação das mulheres que impactou diretamente a ampliação da participação das mulheres na política foi o abaixo-assinado entregue a parlamentares com o objetivo de pressioná-los a aprovar o projeto de lei que tramitava no Congresso. Com 2.000 assinaturas, o documento foi amplamente divulgado pela imprensa. Hoje, ele se encontra no Arquivo Histórico do Senado Federal, preservado como um retrato da realidade das brasileiras de então.

Vale a pena lembrarmos das brilhantes mulheres que pavimentaram o caminho para canonizar o dia 24 de fevereiro de 1932. Uma delas é Leolinda de Figueiredo Daltro, que ocupou ousadamente a cena pública por suas ideias vanguardistas em defesa das mulheres e dos índios. Ao ter seu alistamento eleitoral recusado, fundou, em 1910, no Rio de Janeiro o Partido Republicano Feminino. Seu objetivo era mobilizar mulheres pelo sufrágio, de forma que as mulheres pudessem finalmente exercer seus direitos políticos em todas as esferas da vida política. Importante destacar o papel preponderante exercido por Bertha Lutz no processo de luta pela cidadania adas mulheres. Assim que retorna do exterior a bióloga, motivada pelas lutas das sufragistas que ocorriam na Europa, passa a se dedicar na mobilização das mulheres em defesa do voto feminino. Em 1920 foi uma das organizadoras do I Congresso Internacional Feminista, consolidando a criação da Federação Brasileira para o Progresso Feminino (FBPF), unindo as ligas estaduais ao seu redor e exercendo papel central na articulação das mulheres, na ocupação de espaços na imprensa, na montagem de estratégias para a conquista do sufrágio feminino.

Em 2024, o caminho a frente ainda é longo para o exercício pleno dos direitos políticos das mulheres. Um indicativo disso é numérico: mulheres ocupam menos de 15% dos cargos eletivos, mesmo representando cerca de 51,13% da população brasileira. Reflexo disso, o país teve apenas uma presidente em toda a sua história, além de apenas 16 governadoras. Aliás, das 16 governadoras, apenas 8 foram eleitas diretamente, de forma que as outras 8 chegaram ao cargo por serem vice-governadoras que assumiram os postos dos titulares, com quem fizeram e ganharam as campanhas políticas – um exemplo é Benedita da Silva, do Rio de Janeiro. Esses dados emblemáticos são indícios de que há barreiras à entrada de mulheres na política institucional. Embora existam alguns incentivos para a inclusão meramente formal das mulheres na política, considerando que há regra legal para a destinação de 30% dos recursos de campanha para candidaturas de mulheres, e ainda assim nos deparamos com a baixa participação das mulheres nos cargos eletivos.

Devemos reconhecer que as dificuldades para o acesso e a permanência das mulheres na política também tem relação com a violência de gênero, a misoginia e até o risco de morte que mulheres sofrem quando se põem contra determinados embates políticos em defesa de uma agenda progressista que enfrente as desigualdades sociais, sejam elas de classe, gênero e de raça. O maior exemplo disso é a vida e morte da vereadora negra Marielle Franco, que entrou para a história e se tornou semente.

A execução de Marielle é o maior feminicídio político da história brasileira, e gerou comoção e mobilização política por todo o Brasil e mundo. Através de debates sérios sobre as relações institucionais que permitiram a execução de Marielle Franco e Anderson Gomes, poderemos talvez combater a insegurança que assola as mulheres brasileiras, viabilizando a participação plena de todas na política, desde suas participações em conselhos e conferências até o exercício do voto em eleições, levando ao ingresso de mulheres responsáveis e comprometidas na política institucional brasileira.

O 24 de fevereiro – dia da conquista do voto para as mulheres deve sempre ser relembrado, comemorado, em respeito às que lutaram por essa causa e para que mais e mais mulheres consigam derrubar os muros que ainda dificultam suas participações em espaços de decisão política. 

Texto escrito por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.

Palavras-Chave/TAG: #sufragismo #lutapelovoto #mulheres #feminismo #educacao #24defevereiro #política #igualdade

REFERÊNCIAS:

  • Produções acadêmicas:

SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Dicionário Mulheres do Brasil, de 1500 até a atualidade: biográfico e ilustrado. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

  • Sites:

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Jardim Marielle Franco é inaugurado em Paris. Poder360: Brasília, 21 de setembro de 2019. Disponível em: Jardim Marielle Franco é inaugurado em Paris (poder360.com.br). Acesso em 31 mar 2024.

LIMAS, Paola; PORTELA, Raissa. Mulheres na política: ações buscam garantir maior participação feminina no poder. Agência Senado: Brasília, 27 de maio de 2022. Disponível em: Mulheres na política: ações buscam garantir maior participação feminina no poder — Senado Notícias. Acesso em 31 mar 2024.

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Professora Celina Guimarães Vianna, primeira eleitora do Brasil. TSE – Tribunal Superior Eleitoral: Brasília. Disponível em: Professora Celina Guimarães Vianna, primeira eleitora do Brasil — Justiça Eleitoral (tse.jus.br). Acesso em 31 mar 2024.

RODRIGUES, Basília. Polícia Federal prende três suspeitos do assassinato de Marielle Franco. CNN Brasil: 24 de março de 2024. Disponível em: Polícia Federal prende três suspeitos do assassinato de Marielle Franco | CNN Brasil. Acesso em 31 mar 2024.

SCHUMAHER, Schuma; SANTOS, Elaine. Linha do Tempo 90 Anos do Voto Feminino no Brasil. REDEH – Rede de Desenvolvimento Humano, LADIH/UFRJ – Laboratório de Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Laudés Foundation: Rio de Janeiro, 24 de fevereiro de 2022. Disponível em: Online Flipbook (aflip.in). Acesso em 31 mar 2024.

SCHUMAHER, Schuma. “Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização”. Seminário Internacional “Os movimentos feministas ontem e hoje no Brasil: desafios da sua institucionalização”, NEPEM/UFMG – Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher vinculado à Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais: Belo Horizonte, 16 e 17 de agosto de 2018.

SCHUMAHER, Schuma. Quando o passado ilumina o presente.

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