Década de 70
1975 – Legalizado na França,o debate chega ao Brasil
As discussões sobre a saúde das mulheres já faziam parte da agenda feminista, mas o assunto ganhou maior visibilidade com o regresso das mulheres exiladas, que pertenciam ao Círculo de Mulheres Brasileiras de Paris. Na volta, elas trouxeram na bagagem o polêmico tema do aborto, legalizado na França em 1975 e um dos eixos de luta do movimento internacional de mulheres.
E ntre as décadas de 1970 e 1980, o debate cresce e se fortalece. As reivindicações que envolviam os primeiros debates sobre Direitos Sexuais e Reprodutivos estavam centradas na fecundidade das mulheres, no acesso aos métodos contraceptivos, e contra o controle da natalidade.
A teoria neomalthusiana (Thomas Malthus; 1736-1834) afirmava que só o controle populacional poderia conter a miséria nos países subdesenvolvidos, e nos países chamados desenvolvidos, porque a falta de emprego para toda essa população causaria impacto direto na renda per capita do país. Com isso, emerge a BENFAM (Bem Estar Familiar no Brasil) e outras organizações do tipo, que passaram a atuar fortemente nesse campo, reforçando o movimento higienista e eugenista, com foco em mulheres negras e pobres através de esterilizações forçadas ou mesmo compulsórias em partos cesarianos.
Um dos desafios para o movimento feminista foi enfrentar esse debate, enfatizando que o tema da saúde sexual e reprodutiva das mulheres deveria ser entendido na perspectiva dos Direitos Human
1975 – Ano Internacional da Mulher
Decretado pela ONU, também foi oficializado, depois de muitos anos, o 08 de março como o Dia Internacional da Mulher, no momento da realização da I Conferência Mundial da Mulher, que aconteceu no México, sob o lema “Igualdade, Desenvolvimento e Paz”. Para as feministas brasileiras, que ainda viviam sob o manto da ditadura militar, essa conferência, que contou com a presença de Bertha Lutz e outras, foi um marco importante para a retomada da mobilização das mulheres contra a discriminação de gênero e luta por seus direitos. A nconferência contou com a participação de 133 delegações, sendo 113 lideradas por mulheres. Outro ponto alto da conferência foi a realização do Fórum de Organizações Não-Governamentais, que contou com a participação de 4.000 ativistas.
1975 – Semana de debates
Coletivos feministas que já vinham se reunindo informalmente no Rio de Janeiro (estávamos em plena ditadura no Braszil) souberam aproveitar a cobertura e a proteção de um organismo internacional para promover a questão da mulher e comemorar o ano internacional. Assim, realizaram a Semana de Debates sobre “O papel e o comportamento da mulher na realidade brasileira”, sob o patrocínio do Centro de Informação da ONU, apoiada e organizada pela ABI (Associação Brasileira de Imprensa) do Rio de Janeiro e organizada por um grupo de feministas cariocas.
Acabou por reunir profissionais liberais, estudantes universitárias e donas de casa para discutir os problemas das mulheres brasileiras diante de um auditório composto por mais de quatrocentas participantes.
1975 – Primeiro Projeto de Lei sobre o direito ao aborto no Brasil – PL 177/1975
Projeto de Lei apresentado ao Congresso Nacional pelo Deputado João Menezes, permitindo a prática do aborto até a 12ª semana de gestação. Ainda sob o manto da ditadura militar, as manifestações públicas das feministas e outros atores sociais foram discretas, não se registrando nenhuma campanha de apoio.
Década de 80
1980 – O feminismo brasileiro sai às ruas
Quando a polícia carioca “estourou” uma clínica clandestina no bairro de Jacarepaguá e prendeu enfermeiras, médicos e pacientes pela prática do aborto, as feministas organizaram um protesto e, pela primeira vez, foram a público reivindicar o direito de escolha. O silêncio que envolvia o assunto estava definitivamente rompido e a prática do aborto tornou-se um assunto de domínio público.
Foi ainda na década de 1980 que se ampliou o debate sobre sexualidade, reprodução, aborto, contracepção, sempre sob o viés da autonomia das mulheres em relação ao seu próprio corpo, à vivência plena de sua sexualidade, à livre opção pela maternidade. O crescente número de organizações de mulheres e feministas bradavam o lema “Nosso corpo nos pertence”.
1980 – Lançamento do livro “O que é o Aborto?”
De autoria de Carmem Barroso e Maria José Carneiro da Cunha, integrantes da Frente de Mulheres Feministas de São Paulo, o livro trata a questão do aborto por diversos ângulos: social, moral, legal, demográfico, apresentando dados sobre os aspectos médicos do abortamento, técnicas utilizadas e depoimentos de mulheres que o praticaram.
1980 – Novo Projeto de Lei – Ampliação dos permissivos legais
Apresentado pelo Deputado João Menezes, a proposta visava permitir o aborto em mais duas condições: a situação social da mulher gestante e nos casos de anomalia fetal. Foi rigorosamente combatido pela Igreja Católica e pela bancada conservadora do Congresso Nacional levando ao seu arquivamento.
1981 – Cícera, um destino de mulher
Lançamento do livro de Danda Prado e Cícera Fernandes de Oliveira. Esta última, uma trabalhadora têxtil, negra, mãe de uma menina de 13 anos que havia sido estuprada pelo pai e, diante da gravidez, lutava para conseguir a realização do aborto, conforme previsto no Código Penal Brasileiro.
Danda e outras feministas cariocas acompanharam Cícera em sua peregrinação para conseguir a autorização judicial exigida pelo Conselho Regional de Medicina que, na época, já tinha uma posição bastante conservadora. Infelizmente a batalha não foi vitoriosa e a menina teve que enfrentar a gravidez e o parto, ainda que resultante de abusos sexuais, evidenciando que, mesmo nos casos previstos por lei, as barreiras para acessar o procedimento tornavam praticamente impossível realizá-lo.
1981 – “O Aborto – Direito de Opção”
Artigo de Jacqueline Pitanguy, publicado no Jornal do Brasil com grande repercussão, tendo em vista os diferentes posicionamentos que estavam sendo expressos na mídia, seja pelas feministas, pela Igreja Católica, por categorias médicas e parlamentares.
1981 – Mulheres, chegou a hora de luta pelo aborto livre
Campanha pela descriminalização do aborto, lançada pelas feministas do Rio de Janeiro. Hildete Pereira de Mello relata que produziram um panfleto “Mulheres, chegou a hora de luta pelo aborto livre” e passaram a distribuí-lo nas feiras livres da capital fluminense.
O corpo a corpo com as mulheres ajudava a quebrar o silêncio que envolvia a questão tão amaldiçoada pela Igreja Católica, que reagia através da mídia e das missas.
1982 – Polêmica na OAB
A advogada Romy Medeiros da Fonseca, lutadora histórica, autora do anteprojeto do estatuto civil da mulher casada, apresentou, na Conferência Nacional da OAB, que aconteceu em Florianópolis, o documento “Justiça Social e Aborto”, uma tese defendendo a descriminalização, uma vez que o aborto clandestino era um problema grave que afeta, sobretudo, as mulheres pobres. Embora a proposta tenha sido aprovada na Comissão, a tese não foi submetida ao plenário da Conferência, conforme apregoava o estatuto, por decisão do então presidente do Conselho Federal da OAB, o deputado Bernardo Cabral, justificando que a proposta seria rejeitada pelo Plenário e que para uma campanha vitoriosa era preciso pulverizar a discussão no interior dos órgãos seccionais estaduais da OAB.
1982 – Alerta Feminista para as Eleições
Documento elaborado por diversos coletivos feministas do Rio de Janeiro, que suprapartidariamente encaminhavam as demandas das mulheres aos partidos políticos e seus respectivos candidatos a governador, destacando a reivindicação pela legalização do aborto. Alguns desses poucos partidos incluíram essa demanda em suas plataformas políticas.
1983 – I Encontro Nacional de Mulheres sobre Saúde, Contracepção e Aborto
Organizado pela Casa da Mulher do Rio de Janeiro, Grupo Ceres, Coletivo de Mulheres do Rio de Janeiro; Projeto Mulher do IDAC e Grupo Mulherando, contou com a participação de 57 grupos e mais de 300 mulheres de diferentes estados brasileiros, além de profissionais da área médica e de direito. O propósito do Encontro foi o de trazer ao debate a polêmica questão do planejamento familiar e do aborto através de distintos enfoques e opiniões.
1983 – Sexo Finalmente Explícito
Boletim sobre questões de saúde, sexualidade e aborto, lançado com grande tiragem por um grupo de feministas do Rio de Janeiro, tendo à frente Hildete Pereira de Melo. O jornal defendia a descriminalização do aborto e divulgava questões relativas à contracepção dentro da perspectiva da defesa dos direitos reprodutivos.
1983 – Projeto de Lei propondo alteração no Código Penal
De autoria da Deputada Cristina Tavares/PE, o projeto propunha alteração na redação do Código Penal, visando permitir o aborto por indicação médica (em caso de risco de vida para a gestante) ou ética (em caso de gravidez resultante de estupro), por indicação embriopática (em caso de malformação do feto) e por indicação social (em caso de pobreza extrema em que a família não teria condições financeira de manter a criança).
1984 – O que é aborto?
De autoria de Danda Prado, a publicação fez parte da Coleção Primeiros Passos, da Editora Brasiliense. O texto defende a descriminalização da prática do aborto e argumenta que um dos objetivos do movimento feminista é enfrentar a estrutura patriarcal e racista que sustenta as desigualdades na sociedade e coloca as mulheres mais pobres em situação de vulnerabilidade.
1984 – 1º Encontro Nacional de Saúde da Mulher.
No evento estiveram presentes mais de setenta grupos de mulheres de todo país, resultando na elaboração do primeiro documento público — a “Carta de Itapecerica” — com as reivindicações das mulheres para a saúde integral e onde afirmam que o direito ao aborto é “questão indissociável da saúde da mulher e de sua liberdade”.
1984 – IV Encontro Internacional Mulher e Saúde
Ocorrido em Amsterdam, Holanda, contou com as presenças de feministas e pesquisadoras da África, Ásia, Europa e América Latina, inclusive do Brasil, ocasião em que é formulada a noção de direitos reprodutivos.
Esse conceito, fruto de construção teórico-conceitual elaborado pelo movimento de mulheres, foi referendado em Amsterdam, trazendo a questão do aborto para a esfera da saúde pública.
1984 – Lançamento do PAISM
Como resultado da luta feminista no campo da saúde das mulheres e contando com a contribuição do movimento da reforma sanitária, em 1984 o Ministério da Saúde lançou o Programa de Assistência Integral à Saúde da ulher – PAISM – que objetivava implementar ações de saúde que contribuíssem para a garantia dos direitos humanos das mulheres e reduzissem a morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis. Elaborado com a forte contribuição do movimentofeminista e pelo movimento da reforma sanitária, como resposta à Comissão parlamentar de Inquérito sobre os problemas populacionais, instalada no ano anterior. O PAISM foi o primeiro programa estatal posto em prática que se propunha a superar a abordagem materno-infantil que vigorava até então, reduzindo as mulheres a seus úteros. Tinha a promoção da saúde como princípios norteadores, buscando consolidar os avanços no campo dos direitos sexuais e reprodutivos, com ênfase na melhoria da atenção obstétrica, no planejamento familiar, na atenção ao abortamento inseguro e no combate à violência doméstica e sexual. Acrescenta, também, a prevenção e o tratamento de mulheres vivendo com HIV/aids e as portadoras de doenças crônicas não transmissíveis e de câncer ginecológico. Além disso, amplia as ações para grupos historicamente alijados das políticas públicas, nas suas especificidades e necessidades.
1985 – Projeto de Lei para Atendimento do Aborto Legal
A deputada Estadual Lúcia Arruda, do PT, apresentou uma proposta de estabelecimento de um programa de atendimento ao aborto legal, previsto no Código Penal. Esse projeto foi inicialmente aprovado pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) e sancionada pelo governador do Estado Leonel Brizola.
Diante do fato, a Igreja Católica lançou uma grande campanha contrária à lei, distribuindo nas paróquias um pedido de revogação, que era lido nas missas, e estimulava os cristãos a se manifestarem contrários à Lei 832/85.
Também se juntou nessa polêmica o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro, que se colocou ao lado da Igreja, levando o mesmo governador a revogá-la, causando uma grande mobilização nacional e muitas críticas.
1985 – Criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM)
Criado por projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional, O CNDM tinha por finalidade “promover em âmbito nacional, políticas que visem eliminar a discriminação da mulher, assegurando-lhe condições de liberdade e igualdade de direitos, bem como sua plena participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do País”.
O corpo técnico era composto, na sua expressiva maioria, por feministas autônomas, vindas de diversas regiões do país e trazendo na bagagem grandes desafios: abrir espaço para a garantia dos direitos das mulheres na estrutura política do governo; ser um canal de interlocução com os movimentos de mulheres; além de formular e monitorar as políticas públicas.
Quatro meses depois de sua criação, lançou uma grande campanha nacional chamada de Constituinte pra valer tem que ter palavra de mulher, em que estimulava o voto em mulheres candidatas comprometidas com a agenda e estimulou uma grande mobilização das mulheres para a participação no processo de feitura da nova Constituição brasileira.
Dessa mobilização resultou a Carta das Mulheres aos Constituintes, contendo princípios e propostas, entre eles o direito à interrupção da gravidez.
1986/88 – LOBBY do Batom
Apelido dado à Equipe do CNDM que acompanhava cotidianamente os trabalhos do Congresso Nacional no período de elaboração da nova Constituição Brasileira e abraçada pela Bancada Feminina, movimentos de mulheres e feministas, responsáveis pelas estratégias e pressão durante o processo constituinte. Destaca-se que o forte e decisivo Lobby do Batom teve que enfrentar muitos perrengues e polêmicas, especialmente diante da possibilidade de incluir no texto constitucional o direito ao aborto através, por exemplo, da consulta popular.
A CNBB, o grupo autointitulado Pró-Life e a Bancada Evangélica, que naquele momento era composta por 34 parlamentares, somaram forças contra o “suave” avanço incluído no relatório do senador José Paulo Bisol, que dizia: “a vida intrauterina, inseparável do corpo que a concebeu, é responsabilidade da mulher, comporta expectativa de direitos e será protegida por lei”. Nem esse, nem outros artigos foram incluídos no texto final. No entanto, a Igreja Católica resolveu investir numa Consulta Popular – permitida no processo constituinte –, sobre a penalização do aborto em qualquer circunstância.
Como resistência, o movimento feminista também lançou sua consulta em favor do direito das mulheres decidirem sobre a interrupção da gravidez indesejada, ou seja, o direito ao aborto. Esgotado o prazo, as duas emendas – uma favorável e outra contra o aborto – foram entregues no Congresso Nacional. Diante da polêmica instalada no Congresso e na sociedade, a Equipe do CNDM e a Bancada Feminina avaliaram que era minoritário o grupo de parlamentares que defendiam a descriminalização do aborto, não havendo consenso nem mesmo na Bancada das Mulheres. Considerando o contexto desfavorável e as ameaças de retrocessos, os movimentos de mulheres, feministas, parlamentares e o CNDM consideraram mais prudente deixar esse assunto para o Código Penal.
1986 – I Conferência Nacional sobre a Saúde da Mulher
Foi durante a 8º Conferência Nacional de Saúde, em 1986, que um grupo composto por feministas, mulheres de organizações populares, sindicais, de partidos e diversas outras entidades começaram a articular a I Conferência Nacional sobre a Saúde da Mulher. Organizada pelo CNDM – Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Ministério da Saúde e Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social, a I Conferência contou com a participação de 900 representantes de todos os estados e territórios da Federação, dos quais 549 credenciadas como delegadas, que trouxeram para o fórum de debate as propostas consolidadas nas pré-conferências realizadas em suas respectivas regiões. Conforme explicitado no relatório final: “A discussão das questões específicas a respeito da saúde da mulher orientou-se pela compreensão de que a saúde está associada à existência de um trabalho estável e condignamente remunerado, assim como moradia, educação, alimentação, saneamento básico e meio ambiente livre de contaminação; saúde, enfim, passa a ser compreendida como o direito a uma vida digna e plena, sem discriminação de sexo, raça, idade ou classe social.
Em relação ao aborto as recomendações aprovadas na Conferência foram: agilização dos processos ético-legais que autorizam o aborto nos casos de gravidez resultante de estupro, como medida que executa e viabiliza a legislação atualmente prevista; garantia plena de atendimento dos casos de aborto previstos na lei, por parte dos serviços públicos de saúde; que seja descriminalizado o aborto; legalizar o aborto, já que o mesmo, nas condições em que atualmente ocorre no Brasil, constitui um problema de saúde pública e saúde mental; e propiciar assistência e condições para que a mulher que decida fazê-lo o faça de forma consciente, sendo-lhe garantida a assistência médica e psicológica. O aborto não deve ser considerado como um método contraceptivo, sendo, por isso, fundamental que seja dado à sociedade o conhecimento dos métodos contraceptivos existentes, visando que o aborto seja uma prática cada vez mais reduzida.
1988 – Criação do Sistema Único de Saúde – SUS
Dois anos após a realização da I Conferência Nacional sobre Saúde da Mulher nasceu o SUS, uma
das maiores conquistas do povo brasileiro. Inserido na Constituição Federal Brasileira de 1988, foi resultado de forte luta liderada pelo movimento da Reforma Sanitária desde os anos 70 com a bandeira “saúde é democracia” e denunciando que saúde não existe desvinculada de outros fatores determinantes à vida das pessoas como habitação, lazer, trabalho, transporte, alimentação e acesso a serviços de saúde público e universal.
O SUS foi regulamentado pela Lei orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990), que estabeleceu a saúde como direito da população e dever do estado, assegurado por políticas públicas.
Mas o SUS também é resultado da luta feminista. A Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes de 1987, exigia a “criação de um Sistema Único de Saúde constituído a partir de uma nova política nacional de saúde e implementado por serviços públicos de saúde coletiva e assistência médica integrados”, com o controle do estado também aos serviços privados. Afirmava ainda que o SUS deveria ser gerido e fiscalizado pela população organizada em Conselhos comunitários. Entre as reinvindicações presentes na Carta, estava a garantia de que o estado brasileiro asseguraria à mulher o direito a decidir sobre seu próprio corpo.
1989 – Criação do primeiro serviço público de aborto legal no Brasil
Em consonância com as reivindicações do movimento de mulheres e com o objetivo de diminuir as taxas de morbimortalidade materno no município de São Paulo, a prefeita Luiza Erundina criou o Serviço de Aborto Legal (Hospital Jabaquara), possibilitando que acontecessem interrupções da gestação nos casos previstos por lei, como risco à vida da mulher e gravidez em decorrência de estupro.
Decada de 90
1990 – 5º Encontro Feminista da América Latina e Caribe
Eem San Bernardo, na Argentina. Mais de duas mil mulheres participaram do Encontro. O cenário das nações latino-americanas, com o fim de ditaduras militares, a inserção das políticas de ajuste estrutural e os números alarmantes de pobreza foram temas em debate que determinaram os rumos desta série de encontros. Lançando um olhar sobre o próprio movimento, as discussões focaram nos desafios do feminismo nos anos 1990 considerando as diversidades, a democracia e a produção interna de conhecimento.
No 5º EFLAC foi criada a Campanha 28 de Setembro – Dia de Luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe. Essa campanha foi coordenada por diferentes países da região, em regime de rotatividade.
1991 – Criação da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
O acúmulo de forças e o crescente número de entidades voltadas para a defesa dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres levou à criação dessa rede, durante Seminário Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, promovido em Itapecerica da Serra/SP pelo SOS Corpo – Gênero e Cidadania, de Recife/PE, e coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, de São Paulo. É integrada por organizações não- governamentais, grupos feministas, pesquisadoras e grupos acadêmicos de pesquisa, conselhos e fóruns de direitos das mulheres, além de ativistas do movimento de mulheres e feministas, profissionais da saúde e outras que atuam no campo da saúde das mulheres, direitos sexuais e direitos reprodutivos.
1991 – Descriminalizando o Aborto
O Projeto de Lei Nº 1135 foi apresentado pelo deputado Eduardo Jorge (PT-SP) e pela deputada Sandra Starling (PT-MG) e propõe alteração do Código Penal para descriminalizar o aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento.
1993 – Encontro Nacional Mulher e População: nossos direitos para o Cairo 94
Durante a fase preparatória da CIPD, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) criou um comitê nacional composto por representantes dos diversos setores do Executivo, e organizou um processo democrático de consulta nacional. O Encontro contou com a participação de inúmeras organizações não governamentais feministas. Como resultado foi elaborada a “Carta de Brasília”, que reforçou princípios básicos, incluindo a não-coerção, a saúde integral da mulher e os direitos sexuais e reprodutivos.
1994 – A Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD)
Realizada na cidade do Cairo, Egito, foi a maior conferência intergovernamental relacionada ao tema populacional e também um marco na história dos direitos das mulheres. A Plataforma do Cairo, documento firmado pelos países-membros, reconheceu o aborto inseguro como grave problema de saúde pública. Importante salientar que na avaliação do movimento feminista, publicado na revista Enfoque Feminista de janeiro de 1995, a Conferência de Cairo significou um profundo avanço para os direitos das mulheres.
Tanto pelo fato de ser a primeira vez que o governo brasileiro abria espaço para a participação das organizações de mulheres – ainda que na condição de ouvinte – resultado da própria pressão do movimento sobre o governo, como pela posição assumida pela delegação brasileira, mais favorável ao aborto e aos direitos reprodutivos e resistente às pressões do Vaticano. Na Conferência, o aborto foi reconhecido como questão de saúde pública, constando orientações claras para que o aborto fosse seguro, nos casos previstos em lei e que as mulheres tivessem acesso ao tratamento sem discriminação, nos casos de complicações resultantes de abortos inseguros, bem como aconselhamento reprodutivo.
Para promover uma participação ampla do movimento de mulheres brasileiro no processo preparatório da Conferência Mundial sobre a Mulher da ONU (Beijing, 1995), que estava agendada para o ano seguinte.
O marco de sua fundação foi a reunião do Rio de Janeiro onde quase mil mulheres, representando 25 fóruns estaduais, aprovaram a Carta das Brasileiras para a 4ª Conferência Mundial sobre a Mulher.
Após a conferência foi tomada a decisão de manter viva a AMB como estrutura organizativa nacional para levar à frente atividades de monitoramento e pressão política pela implementação das Plataformas do Cairo e Beijing. De lá para cá, a Articulação manteve a incidência em processos nacionais e regionais, reposicionando-se estrategicamente, investindo na formação de novos quadros e na parceria com outros segmentos do movimento de mulheres. Hoje a organização tem como linhas prioritárias de ação o enfrentamento ao racismo e ao modelo neoliberal de desenvolvimento, a luta pela reforma do sistema político e democratização do poder, a luta pelo direito ao aborto, contra as desigualdades de classe, gênero e raça, e por justiça socioambiental.
1995 – Pesquisa Pela Vida das Mulheres, Nenhum Direito a Menos
Promovida pelo Conselho Estadual dos Direitos da Mulher do Rio de Janeiro, Rede de Saúde, Fórum Feminista, AMB RJ e Secretaria de Mulheres do PT, a consulta em espaços públicos entrevistou aproximadamente 1.500 pessoas, e apontou que 95% delas são favoráveis ao aborto nos casos previstos no Código Penal. O resultado final foi encaminhado à Comissão Especial da Câmara Federal em contraponto à PEC 25/92 do Deputado Severino Cavalcanti que propõe o direito à vida desde a concepção.
1996 – Derrotada a proposta de emenda constitucional – PEC 25/1995
De autoria do deputado Severino Cavalcanti essa emenda propunha inserir no preâmbulo da Constituição o direito à vida desde a concepção. Diante da ameaça de retrocesso contra os direitos reprodutivos das mulheres, o CFEMEA, em parceria com vários movimentos e organizações feministas, lançou uma campanha vitoriosa pela não aprovação da proposta, o que ocorreu em Sessão Plenária Deliberativa da Câmara dos Deputados, pela esmagadora maioria de 87% de votos contrários.
1996 – Seminário Nacional: Aborto, Cidadania e Justiça Social
Organizado pela Rede Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, contou com a presença de 50 participantes que discutiram os temas: o papel do Legislativo e do Executivo nas mudanças e cumprimento da legislação na conjuntura, avanços e retrocessos; o debate sobre aborto na agenda feminista, mídia e opinião pública; perspectiva dos prestadores de serviço de aborto – a realidade e a legalidade; direito e acesso – descriminalização ou legalização. Durante os debates, foi destacada a necessidade de ampliação das discussões e de definição de estratégias de médio e longo prazo, tendo como perspectiva o legislativo, a área jurídica, os serviços e os profissionais de saúde, a mídia e a opinião pública.
1996 – Manual para o atendimento de um Serviço de atendimento para aborto previsto por lei
Manual elaborado pelo IPAS, com o propósito de auxiliar profissionais de saúde, lideranças dos movimentos de mulheres e outros segmentos na implantação do serviço de aborto legal na rede pública de saúde.
1996 – Implantação do Serviço de Aborto Legal em Recife e no Distrito Federal
Em Pernambuco, o serviço foi implantado no Hospital Agamenon Magalhães e no Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, e em Brasília, o escolhido foi o Hospital Regional da Asa Sul (HRAS), visando o atendimento às mulheres e adolescentes em situação de violência sexual e aborto legal. A implantação desses serviços foi bem recebida pelos movimentos feministas, pois é parte de suas antigas reivindicações.
1997 – Eu Fiz Aborto
Esse foi o título escolhido para ser estampado na capa da revista Veja, do mês de setembro, cuja matéria e fotos são resultados de entrevistas feitas com 80 mulheres, de diferentes faixas etárias, áreas de atuação e classe social, que corajosamente romperam com o preconceito e o medo e contaram suas experiências em relação ao aborto realizado em algum momento de suas vidas.
1997 – A Comprida História da Lei não Cumprida
Realização de Seminário Nacional sobre Aborto Legal, realizado na Câmara dos Deputados em Brasília, promovido pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Rede Nacional Feminista de Saúde e Diretos Reprodutivos e CFEMEA, com o intuito de esclarecer sobre a importância do atendimento às vítimas de estupro que engravidam e não querem levar essa gestação à termo, ou àquelas cuja gravidezes colocam suas vidas em risco, conforme previsto no Código Penal brasileiro.
1997 – Papa no Brasil
Em outubro de 1997, o Papa João Paulo II veio ao Brasil para o Encontro com a Juventude. Durante sua estadia no Rio de Janeiro, o Papa nas suas pregações e entrevistas, tocou em assuntos nevrálgicos como o divórcio, o aborto e os métodos contraceptivos. Em suas declarações condenou o divórcio, o aborto e os métodos contraceptivos, provocando uma grande reação dos movimentos feministas. A Articulação de Mulheres Brasileiras, Rede Feminista de Saúde, Católicas pelo Direito de Decidir, UNE, CUT e FEBRASGO aproveitaram a polêmica gerada pelas declarações do Papa e organizaram uma Campanha nacional de apoio ao PL 20/91 do deputado Eduardo Jorge (PT/SP) e Sandra Starling (PT/MG), que dispunha sobre a obrigatoriedade de atendimento aos casos de aborto previstos no Código Penal, pelo Sistema Único de Saúde.
1997 – Urnas e Postos do Correio
Incidência pública promovida pela Rede Feminista de Saúde, AMB, e outros movimentos parceiros a favor do PL 20/91, em tramitação no Congresso Nacional, que dispunha sobre a obrigatoriedade de atendimento dos casos de aborto previstos no Código Penal, pelo Sistema Único de Saúde. Milhares de cartões postais com assinaturas foram recolhidos em urnas imitando caixas de correio, instaladas no calçadão da Praia, no Rio de Janeiro, e entregues solenemente em Brasília durante audiência pública no plenário da Câmara, que atraiu militantes que representavam os dois lados: contra e a favor do PL 20/91.
1998 – Norma Técnica do MS – Regulamenta a Atenção as Vítimas de Violência Sexual
Em 1997, o Conselho Nacional de Saúde publicou a Resolução 258, solicitando que o Ministério da Saúde cumprisse sua responsabilidade regulamentando o atendimento, pelo SUS, dos casos de aborto não punidos pelo Código Penal de 1940, mas ainda não normatizados. O documento lembra que, após 57 anos, somente oito hospitais atendiam casos de aborto por estupro.
Destacava ainda que esta lacuna era uma ofensa à dignidade das mulheres e colocava em risco sua integridade. A Resolução alega que o Estado assumiu compromissos nesse sentido frente aos Programas de Ação de Cairo/94 e Pequim/95 e lembra a recomendação da 10ª Conferência Nacional de Saúde de 1996 pela implantação de serviços de referência. A resposta do Ministério da Saúde à Resolução do CNS veio em 1998 quando a equipe da Área Técnica de Saúde da Mulher montou uma comissão multidisciplinar para elaborar uma Norma Técnica ampla, de “Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes”, com medidas para o atendimento integral e multidisciplinar.
O documento, lançado em versão eletrônica em 1998 e publicado em 1999, garante à vítima o direito de receber a informação necessária e ter acesso a exames e ações curativas, preventivas e de profilaxia adequadas, incluindo atendimento psicossocial, prevenção de DSTs e Aids e acesso à anticoncepção de emergência e ao aborto. Nos casos em que acontece a gravidez em consequência de um estupro e sendo este o desejo da vítima, ou de seu representante legal, o acesso ao abortamento é garantido sem necessidade de autorização judicial. Na primeira versão da Norma Técnica era exigido o Boletim de Ocorrência como pré- requisito para a realização do aborto legal. Esta exigência foi revogada em 2005, quando a Norma foi reeditada e atualizada. Embora existindo hospitais de referência para a interrupção da gravidez resultante de estupro, todas as unidades de saúde com serviços de ginecologia e obstetícia deveriam deveriam estar preparadas para o cumprimento da Norma Técnica.
1998 – VIII Encontro Internacional Mulher e Saúde, Rio de Janeiro, Brasil
Pela primeira vez sediado na América Latina, o encontro reuniu mais de quinhentas ativistas de 58 países e teve como temáticas centrais “Saúde da Mulher, Pobreza e Qualidade de Vida – Estratégias para o futuro à luz dos recortes de gênero, raça, classe social, orientação sexual e geração”. Foi o primeiro grande encontro pós Cairo e Beijing. Na plenária final foi aprovada a Declaração do Glória (nome do hotel onde ocorreu o encontro), reafirmando a saúde como um direito, a inclusão da saúde dos direitos reprodutivos e dos direitos sexuais como dimensões fundamentais do desenvolvimento e o resgate da centralidade do corpo e da sexualidade na teoria e prática.
1999 – Manifesto de Apoio à Norma Técnica em Defesa dos Direitos e da Cidadania das Mulheres
Uma inciativa da Rede de Saúde, das Católicas pelo Direito de Decidir, o manifesto, que contou com o apoio de articulações feministas e de centenas de assinaturas, foi entregue à Câmara dos Deputados em defesa da manutenção da Norma Técnica editada pelo Ministério da Saúde para “prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes” e em repúdio à proposta do Decreto Legislativo 737/98, de autoria do deputado Severino Cavalcanti que propunha sustar a aplicação da norma.
1999 – Aspectos religiosos sobre o Aborto Induzido
Uma publicação do grupo Católicas pelo Direito de Decidir, apresentando uma reflexão teológica do jesuíta uruguaio Pe. Luiz Perez Aguirre, cujos argumentos levam em consideração a realidade vivida por muitas mulheres e contribui para uma ética pautada na vida concreta e na vivência da fé para que se sintam confortadas no momento de tomar decisões.
Década de 2000
2000 – Campanha 28 de Setembro pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe
Neste ano o Brasil assumiu, através da Rede Nacional Feminista de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos (RFS), a coordenação regional da Campanha 28 de setembro. Ficaram responsáveis por esta representação Angela Freitas, Jacira Melo e Schuma Schumaher. A Campanha 28 de Setembro foi criada em 1990, no 5º Encontro Feminista da América Latina e Caribe (Argentina), quando as participantes reconheceram a necessidade de somar as forças dos movimentos da região para lutar contra a criminalização do aborto. Desde então a Campanha 28 de setembro teve coordenação rotativa, sempre sob a responsabilidade de organizações feministas nacionais de reconhecida atuação em defesa dos direitos sexuais e reprodutivos.
2000 – Aborto Legal, Igreja Católica e o Congresso Nacional
Da série Cadernos, publicada pelo grupo Católicas pelo Direito de Decidir, esse texto de Myriam Aldana Santin é resultado da pesquisa Direitos Humanos das Mulheres: Congresso Nacional e a Igreja Católica com o intuito de entender o papel desse segmento religioso sobre os congressistas diante de projetos ligados aos direitos sexuais e reprodutivos.
2000 – Aborto não é pecado
Com o intuito de marcar a data do 28 de setembro, a Rede de Saúde e Católicas pelo Direito de Decidir utilizaram, durante 04 dias, painéis eletrônicos instalados em duas avenidas movimentadas de São Paulo, para exibirem a mensagem “Aborto não é pecado. Aborto é direito à saúde, direito de escolha e direito de cidadania”, provocando grande repercussão na mídia, como jornais e emissoras de TV, que deram destaque a essa estratégia comunicacional.
2001 – Dossiê Aborto Inseguro
Publicado pela Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, retrata o panorama do aborto inseguro no Brasil e na América Latina e defende a despenalização, visando permitir que uma mulher, diante de uma gravidez indesejada, possa interrompê-la sem colocar sua saúde e vida em risco.
2001 – Nós Abortamos
Edição especial do Articulando, publicação da AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras, como contribuição ao debate sobre a interrupção voluntária da gravidez, nas comemorações do 28 de setembro, levando a público – sem temor ou hipocrisia – a bandeira pela liberação do aborto no Brasil.
2001 – Carta da Guanabara
Durante o mandato brasileiro na coordenação regional da Campanha 28 de setembro pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe, a Rede de Saúde realizou um Encontro Internacional, no Rio de Janeiro, no qual foi elaborada e aprovada por 98 representantes, de 27 países e lançada no dia 5 de dezembro, em Ato Público na cidade do Rio de Janeiro, a Carta da Guanabara, um marco da luta feminista internacional pelo direito ao aborto.
2001 – 1° Fórum Social Mundial
Em Porto Alegre (RS) com a participação de mais de 20 mil pessoas de 117 países, que se espalharam em
oficinas autogestionadas, seminários, conferências, sessões de testemunhos, atividades culturais e plenárias deliberativas.
A AFM – Articulação Feminista Marcosul, juntamente com a Articulação de Mulheres Brasileiras, a Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos, o CLADEM – Brasil (Comitê Latino-americano e do Caribe de Defesa dos Direitos da Mulher), o Observatório da Cidadania-Brasil, a REPEM (Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina), e a Rede DAWN – Global, apresentaram uma proposta que foi acatada pelo Comitê Brasil organizador do FSM, para garantir transversalidade às temáticas de gênero e à
participação de feministas nos principais painéis de discussão. Uma ampla convocação buscou trazer mulheres de todo o mundo para o evento.
No 1º FSM a questão do aborto suscitou uma ruidosa manifestação promovida pelas mulheres no saguão principal da sede do fórum, protestando contra medidas de cortes de verba anunciadas pelo então recém- empossado presidente norte-americano George W. Bush.
Denominada Lei da Mordaça, a nova regra afetava drasticamente a assistência ao aborto nos países do chamado Terceiro Mundo, que contavam com o apoio da cooperação governamental norte-americana.
2001 – 3ª Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas
Ocorrida em Durban, África do Sul. No processo preparatório nasce a AMNM – Articulação Nacional de Organização das Mulheres Negras. Neste período, as organizações de mulheres negras trabalhavam na realização de seminários nacionais e outros eventos de sustentação à agenda das mulheres negras, formulando propostas sobre educação antirracista, combate à violência sexista e racial, legalização do aborto, ações no serviço público de saúde como a introdução do quesito cor nos formulários de saúde, e atenção à realidade específica da mulher negra no PAISM, além de medidas em relação à anemia falciforme e abordagens específicas frente a doenças que incidem mais na população negra, como hipertensão e miomatoses.
2002 – Campanha Contra os Fundamentalismos, o Fundamental é a Gente!
O 2º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre (RS), reuniu 50 mil participantes e contou com uma participação feminista mais estruturada e efetiva do que na primeira edição.
A campanha “Contra os Fundamentalismos, o Fundamental é a Gente!”, lançada pela Articulação Feminista Marcosul, da qual faz parte a Articulação de Mulheres Brasileiras, e apoiada por várias outras organizações internacionais. Essa campanha foi uma resposta à onda de terrorismo islâmico, liderada por Bin Laden, à reação bélica por parte do Presidente Bush e a ofensiva fundamentalista na LAC contra a autonomia e o corpo das mulheres. A campanha ressaltou que os fundamentalismos têm nas mulheres as maiores vítimas e mostrou a importância das vozes feministas na construção de um mundo mais justo e igualitário no qual diferenças, individualidades e diversidades sejam respeitadas.
Dentre as inúmeras atividades realizada pelas feministas no espaço do fórum, destacamos a estratégia bem sucedida de ocupar a passarela do samba da cidade de Porto Alegre para, à frente de uma das Escolas de Samba, saírem em bloco, com o nome de “As Decididas pedem passagem”, onde as faixas expressavam abertamente nossa reinvindicação pelo direito ao aborto.
2002 – Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras (CNMB),
organizada por 10 articulações/redes nacionais, onde produziram um documento coletivo – A Plataforma Política Feminista (PPF). As reuniões preparatórias envolveram cerca de 5.200 mulheres em espaços onde a PPF foi sendo amadurecida e reformulada. O documento avalia o contexto político brasileiro a partir da perspectiva feminista, reafirmando a autonomia de pensamento, o projeto e a ação do movimento, reconhecendo sua pluralidade e valorizando os consensos na luta por igualdade, redistribuição de riquezas e justiça social e o direito ao aborto legal e seguro.
Foi elaborado no momento histórico da campanha presidencial, com acirrado debate político, que precedeu a eleição do primeiro governo democrático e popular no país. A Comissão Organizadora Nacional da CNPM e de redação da PPF foi composta pela Articulação de Mulheres Brasileiras, Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais, Articulação de Organizações Mulheres Negras Brasileiras, Comissão Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT, Rede Nacional Feminista de Saúde Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Rede de Mulheres no Rádio, Rede Nacional de Parteiras Tradicionais, Secretaria de Mulheres do Partido Socialista Brasileiro, Secretaria de Assuntos da Mulher Trabalhadora da CONTEE e União Brasileira de Mulheres.
2003 – Campanha Nenhuma mulher deve ser presa, ficar doente ou morrer por abortar
Lançada pelos coletivos que compõem a Campanha 28 de Setembro pela Descriminalização do Aborto na América Latina e no Caribe, com produção de material comunicacional, atividades em todos os estados brasileiros, sob o slogan: “Nenhuma mulher deve ser presa, ficar doente ou morrer por abortar”, e uma visita oficial à presidência da Câmara dos Deputados para dialogar sobre as ameaças que pairam nos corredores do Congresso Nacional, com dezenas de projetos restritivos e abusivos contra a autonomia das mulheres, especialmente nas questões do abortamento.
2003 – Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SEPM)
Criada a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, como órgão diretamente vinculado à Presidência da República, assessora diretamente a Presidência, em articulação com os demais Ministérios, na formulação e no desenvolvimento de Políticas para as Mulheres. Paralelamente, desenvolve campanhas educativas de caráter nacional, projetos e programas de cooperação com organizações nacionais e internacionais, públicas e privadas.
Em diversos momentos, a SPM teve que conviver com o intenso e polêmico debate em torno do direito ao aborto, presente na sociedade e no parlamento.
2004 – Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher – PAISM
Elaborada pelo Ministério da Saúde, em parceria com setores da sociedade, em especial com o movimento de mulheres e com gestoras do SUS. Essa política se compromete com a “implementação de ações de saúde que contribuam para a garantia dos direitos humanos das mulheres e reduzam a morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis. Enfatiza a melhoria da atenção obstétrica, o planejamento familiar, a atenção ao abortamento inseguro, e às mulheres e às adolescentes em situação de violência doméstica e sexual. Além disso, amplia as ações para grupos historicamente alijados das políticas públicas nas suas especificidades e necessidades”.
2004 – ADPF 54
Ação de Descumprimento de Preceitos Fundamentais foi formalizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) ao Supremo Tribunal Federal em 17 de junho de 2004 sobre o que não deve ser considerado como crime, a interrupção terapêutica induzida da gravidez de um feto
anencéfalo.
2004 – Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal
Criada com o objetivo de estimular e organizar a mobilização nacional pelo direito ao aborto legal e seguro, através de uma coalizão feminista de redes nacionais, organizações e ativistas comprometidas com campo dos direitos sexuais e reprodutivos.
Neste mesmo ano, realizou-se em Brasília a 1ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres e o grupo levou a discussão sobre a descriminalização e legalização do aborto às conferências estaduais preparatórias e incidiu nos debates que permitiram aprovar esta reivindicação na conferência nacional. As Jornadas reuniram 67 organizações no Brasil (entre integrantes e parceiras), além de manter conexão com as redes latino-americanas feministas que lutam pelo direito ao aborto. Junto ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal tiveram uma atuação importante, fazendo lobby e palestrando nas audiências públicas, notadamente nos debates sobre o Projeto de Lei Nº 1135/1991 e a ADPF 54/2004. Outra ação de destaque foi a contraposição crítica ao Estatuto do Nascituro, que entrou na pauta do Congresso Nacional na contramão da luta pela legalização do aborto e do respeito ao Estado laico e democrático.
As linhas de ação das Jornadas incluíram a realização de pesquisas científicas sobre a realidade do aborto no Brasil, atividades para estender e popularizar o debate sobre o tema e estratégias de comunicação e interlocução com a mídia, inclusive produzindo um kit com informações para jornalistas. As Jornadas hoje se encontram desativadas, tendo sido substituídas por outras articulações de luta pelo direito ao aborto.
2004 – I Conferência Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres – CNPM
Organizada pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), em parceria com o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), teve como lema “Políticas para as Mulheres: um desafio para a igualdade numa perspectiva de gênero". Durante três dias, em Brasília, reuniram-se 1.787 delegadas governamentais e da sociedade civil que participaram de muitas discussões e indicaram as propostas de diretrizes para votação na plenária final e que compõem as resoluções finais desta Conferência.
Dentre as diretrizes aprovadas destacamos a que se refere a questão do aborto: “Favorecer as condições do exercício dos direitos reprodutivos, dos direitos sexuais e a livre orientação sexual, descriminalizando o aborto, possibilitando autonomia e bem- estar também neste campo, intervindo contra as distintas formas de apropriação mercantil do corpo e da vida das mulheres, tendo em vista também a exploração sexual, o tráfico de mulheres e o consumo de imagens da mulher”. Também explicita que o governo deve “Garantir que as mulheres em processo de abortamento tenham atendimento humanizado nos serviços de saúde” e “Rever a legislação que pune as mulheres que realizam o aborto. Ou seja, a I Conferência Nacional de Políticas para Mulheres recomenda a descriminalização e a legalização do aborto, com garantia do atendimento humanizado pelos serviços públicos de saúde.
2005 – Política Nacional de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
Lançada em março, pelo Ministério da Saúde, com o intuito de garantir os direitos relacionados à saúde sexual e reprodutiva da população. Essa política provocou uma grande reação da Igreja Católica – contrária a qualquer avanço na área dos direitos reprodutivos das mulheres –, manifestação de organizações feministas a favor e notícias nos principais jornais do país, instalando uma grande polêmica na sociedade.
Entre as diretrizes e ações, 14 propostas estão voltadas ao planejamento familiar, que deverão ser implementadas entre 2005 e 2007. Os principais eixos de ação são a ampliação da oferta de métodos anticoncepcionais reversíveis, os chamados não- cirúrgicos, o aumento do acesso à esterilização cirúrgica voluntária, introdução da reprodução humana assistida no SUS, implementação de atividades educativas em saúde sexual e saúde reprodutiva para usuários(as) da rede do Sistema Único de Saúde e ampliação dos serviços de referência para a realização do aborto previsto em lei e garantia de atenção humanizada e qualificada às mulheres em situação de abortamento.
2005 – Instalação da Comissão Tripartite
Essa Comissão cumpriu a tarefa de estudar e propor um anteprojeto de lei pela descriminalização do aborto, em resposta à demanda aprovada na 1ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres de 2004. A iniciativa, aliás, já era um compromisso do Estado brasileiro, ao subscrever os documentos das Conferências da ONU do Cairo (1994) e de Pequim (1995). O resultado do trabalho da Comissão Tripartite seria encaminhado ao Congresso Nacional pela Presidência da República.
Movimentos feministas, que integravam o CNDM e outras entidades comprometidas com essa causa compuseram a Comissão Tripartite representando a sociedade civil: Articulação de Mulheres brasileiras, Fórum de Mulheres do Mercosul, Rede Feminista de Saúde, Secretaria de Mulheres da CUT, Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). A Comissão Tripartite finalizou seu trabalho em agosto de 2005, justamente num período de turbulências políticas, denúncias públicas e alianças entre o governo e partidos ameaçados. O governo federal, neste cenário, recuou do compromisso assumido com as brasileiras, também internacionalmente, de encaminhar o Projeto de Lei ao Congresso, alegando tratar de uma pauta bomba para o momento.
Momentos antes de ir para a Câmara dos Deputados(as), a Ministra da SPM, Nilcea Freire foi ao Palácio dialogar com o Presidente Lula levando muitos e fortes argumentos: era impossível ignorar a tragédia resultante das consequências do aborto inseguro no Brasil, principalmente para as mulheres pobres; o trabalho realizado pela Comissão Tripartite na construção da Proposta contava com participação do próprio governo, do legislativo e da sociedade civil; o Conselho Nacional dos Direitos da Mulheres (CNDM) havia apoiado unanimemente a proposta, e havia também as pressões dos movimentos de mulheres, reunidas nas “Jornadas Pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro”.Dizem “as paredes palacianas” que deixaram nas mãos da Nilcea a decisão do encaminhamento do Projeto. E ela caminhou até o Congresso, acompanhada pelas conselheiras e equipe técnica, com a proposta debaixo dos braços.
Foi recebida por parlamentares e ovacionada por dezenas de lideranças feministas e populares que gritavam palavras de ordem e exibiam cartazes quando entregou nas mãos da deputada Jandira Feghali (PCdoB), relatora da Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados, a proposta da Comissão Tripartite, que foi apensada ao Projeto de Lei 1135 de 1991, rejeitado depois em duas comissões e arquivado desde 2008.
2005- Proposta da Comissão Tripartite da SPM
Retirar a prática de abortamento do Código Penal, deixando apenas como crime o aborto forçado. Ou seja, impor e obrigar uma mulher a abortar deve continuar a ser crime, pois é uma violência contra a autonomia das mulheres.
O Estado deve garantir o atendimento ao aborto nos seguintes casos: até 12 semanas por livre decisão da mulher; até 20 semanas de gestação em casos da gravidez ter sido resultado de violência; a qualquer momento da gestação em casos de risco de vida da mãe ou incompatibilidade do feto para com a vida (ou seja, problemas de má formação que ocasionarão a morte do feto ainda na gestação ou logo após o nascimento).
2005 – Revisão da Norma Técnica
As Jornadas Brasileiras pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, com apoio da AMB – Articulação de Mulheres Brasileiras e outras redes e movimentos, encaminham uma nota à área Técnica de Saúde da Mulher do MS cumprimentando-as pela revisão da Norma Técnica de Prevenção e Tratamento dos Agravos resultantes de violência sexual contra mulheres e adolescentes, de 1999, e a criação da Norma Técnica de Atenção Humanizada ao Abortamento que dispensa a obrigatoriedade de Boletim de Ocorrência Policial para que a mulher possa interromper a gravidez resultante de estupro, garantido pelo Código Penal desde 1940, uma reivindicação antiga das feministas.
2005 – Dossiê Aborto – Mortes Preveníveis e Evitáveis.
Publicado pela Rede Feminista de Saúde, contém o resultado da pesquisa de Alaerte Martins e Lígia Cardieri, onde traçam perfis de mulheres que foram atendidas em hospitais e morreram em decorrência de aborto, entre os anos de 1999 e 2002 no Brasil.
2007 – 2ª Conferência Nacional de Política para as Mulheres
Proposta e coordenada pela SPM e pelo CNDM, contou com quase 3.000 delegadas, na Conferência em Brasília. Além de validar as diretrizes e prioridades aprovadas na 1ª CNPM e acrescentar propostas novas, foi aprovado na Plenária Final, a proposta de mudança da legislação brasileira que criminaliza o aborto, defendida pela sociedade civil presente e muito polemizada pelas delegadas representantes governamentais presentes.
2007 – Criminalização das Mulheres que praticaram aborto em Mato Grosso do Sul
Numa ação orquestrada por segmentos conservadores do Legislativo Federal, Judiciário local e Poder Público de Campo Grande, invadiram uma clínica da cidade, depois de uma reportagem feita pela mídia onde denunciava a prática clandestina do aborto. A ação resultou no confisco de aproximadamente 10 mil prontuários, processos contra as mulheres, funcionárias e a proprietária da clínica, que também teve seu diploma cassado e apareceu morta, antes mesmo do julgamento.
O caso ganhou repercussão nacional deixando as feministas e outros segmentos que defendem os direitos reprodutivos e autonomia das mulheres estarrecidas diante de tanta brutalidade contra as mulheres, das quais muitas não possuíam condições de arcar com sua própria defesa. Os movimentos feministas reagiram provocando um forte debate na sociedade e o acompanhamento do caso através de várias ações de denúncias sobre a violação de direitos.
2007 – Grupo de Estudos sobre o Aborto (GEA)
Criado com o propósito de reunir pessoas da sociedade civil que trabalham com a questão do aborto no Brasil, em diferentes áreas, para troca de informações, experiências e incidências junto aos poderes constituídos, promovendo discussões acerca do tema “aborto” sob o prisma da saúde pública, e retirá-lo da esfera criminal.
2008 – É criada a Frente Nacional Pelo Fim da Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto
Lançada em ato público no dia 26 de setembro, logo após a realização do seminário latino- americano “Experiencias de Lutas, Avanços e Resistências à Legalização do Aborto na América Latina”, realizado na cidade de São Paulo.
A criação desta Frente é resultado do esforço de dezenas de movimentos e organizações feministas que diante da intolerância, do fundamentalismo e da criminalização das mulheres resolveram somar forças na luta pela legalização do aborto no Brasil, contra a criminalização das mulheres, e de criar um espaço de debates e de resistência nesse contexto de golpe de Estado e perdas de direitos. Dois episódios marcantes antecederam a criação desta Frente: o caso de Mato Grosso do Sul e a rejeição do PL 1135/91.
É importante lembrar que tanto o GEA quanto a FNPLA foram criadas a partir da ação organizada em torno das Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, que se extingue e deixa duas fortes e diferentes articulações de luta pelo direito ao aborto no Brasil, estabelecidas até a atualidade.
2008 – Porque defendemos a Legalização do Aborto
Publicação da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB) dirigida aos parceiros/as e aliadas/os, convidando-as para a luta contra a criminalização do aborto onde afirmam “levantamos nossas vozes em defesa de uma vida plena e livre para as mulheres. Em favor de um projeto radical de transformação social e em favor das lutas libertárias do feminismo, apresentamos nossos argumentos neste debate”.
2009 – Fórum Social Mundial – Belém/PA
Durante uma semana a cidade de Belém foi sede do encontro internacional articulado por movimento sociais, ONGs e sociedade civil para ser um espaço de debate e construção de alianças na luta contra o neoliberalismo, a devastação ambiental, as desigualdades sociais, preconceitos e em busca de um mundo melhor para todes. Como acontece todos os anos, o FSM contou com a participação contundente dos movimentos feministas e de mulheres que, juntas, produziram manifestações, debates, rodas de conversas e assembleias. Uma delas foi a atividade sobre o direito ao aborto, organizada por várias redes nacionais e internacionais e depoimentos de mulheres que já viveram essa experiência.
2009 – O Caso da menina de Alagoinhas (PE)
Menina de 09 anos, pernambucana, vítima de abusos sexuais por parte do padrasto, engravidou de gêmeos, e para ter acesso ao direito de abortar sofreu uma longa penitência por problemas causados pela interferência negativa da Arquidiocese de Olinda e Recife e outros segmentos conservadores. Foi preciso uma intensa mobilização das feministas e de algumas entidades médicas para que o CISAM (Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros/PE), fizesse o procedimento cirúrgico e interrompesse a gestação, situação que estava garantida pelos dois permissivos do Código Penal: risco de vida e resultante de estupro.
Mais uma vez a polêmica sobre direitos reprodutivos, autonomia das mulheres e estado laico foi reaberta, causando um grande debate nacional e internacional.
2009 – 3ª Plano Nacional de Direitos Humanos
Embora a 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos (2008) tenha aprovado propostas avançadas em diversas áreas, o Plano apresentado na sequência foi duramente atacado pelas forças conservadoras, provocando um recuo do Governo Federal, que terminou por alterá-lo. Os retrocessos mais significativos foram nas áreas da democratização da propriedade e regulamentação dos meios de comunicação, da defesa da laicidade do Estado, da união civil entre pessoas do mesmo sexo e da descriminalização do aborto, negando às mulheres autonomia para decidir.
2009 – Aborto no Brasil e países Cone Sul
panorama da situação e dos estudos acadêmicos – Livro contendo um conjunto de estudos e reflexões resultante da pesquisa realizada no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai sobre as condições do aborto nesses países e publicado pelo NEPO – Núcleo de Estudos de População da Unicamp e organizado por Maria Isabel Baltar e Regina Barbosa.
Década de 2010
2010 – Advocacy para o acesso ao aborto e seguro:
Semelhanças no impacto da ilegalidade na saúde das mulheres e nos serviços de saúde em Pernambuco, Bahia, Paraíba, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. Publicação contendo o resultado do levantamento de dados sobre a realidade do aborto inseguro e o impacto de sua legalidade na vida das mulheres. Trabalho coordenado pelo Grupo Curumim e IPAS Brasil, em parceria com Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, AMB, Rede Feminista de Saúde, Cunhã, IMAIS, Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto.
2011 – Governo Dilma
Primeira mulher a chegar à Presidência da República no Brasil, Dilma Rousseff foi eleita, em 2010, com apoio de seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. A campanha eleitoral tensionou a questão dos direitos reprodutivos e a candidata foi pressionada por segmentos conservadores em virtude de declarações suas, antigas, favoráveis a esses direitos.
Reeleita, sua vitória no segundo turno da eleição de 2014 garantiu-lhe um novo mandato, que infelizmente foi recheado de críticas e pressões fundamentalistas contra qualquer avanço na área dos direitos sexuais e reprodutivos. Mesmo com o recuo do governo nessa agenda, o mandato da presidenta foi interrompido por um golpe orquestrado pelo Congresso Nacional, mídia hegemônica e segmentos econômicos.
2012 – STF aprova Interrupção da gravidez em casos de fetos anencéfalos (ADPF 54/2004).
Durante dois dias de julgamento, a maioria dos ministros do STF – Supremo Tribunal Federal (votação foi 08 a 02) considerou procedente ação movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), propondo a interrupção da gravidez por anencefalia sem que a prática configure aborto criminoso, que tramitava na Corte desde 2004 e já tinha motivado várias audiências públicas e muita pressão dos movimentos feministas. O julgamento foi acompanhado por vigílias de grupos religiosos e orações pela não aprovação, também por grupos de mulheres que se manifestavam a favor da ação. Após o resultado, um grupo de feministas comemorou a decisão da Suprema Corte na Praça dos Três Poderes.
2012 – CPMI da Violência contra a Mulher
“Com a finalidade de investigar a situação da violência contra a mulher no Brasil e apurar denúncias de omissão por parte do poder público com relação à aplicação de instrumentos instituídos em lei para proteger as mulheres em situação de violência”, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito iniciou seus trabalhos em março de 2012.
Durante um ano e meio foram realizadas 24 audiências públicas, seguidas de visitas a equipamentos públicos que compõem a Rede de enfrentamento à violência contra as mulheres, analisados os documentos e realizados encontros de diálogo com movimentos de mulheres.
Com relação ao acesso aos serviços de atendimento às mulheres e adolescentes em situação de violência sexual e aborto legal, o documento aponta dificuldades enfrentadas para o acesso, não apenas pelo seu reduzido número em todo país, mas também por estarem centralmente implantados em capitais. Além disso, evidencia a falta de informação sobre a existência e localização dos mesmos, ignorados em boa parte por profissionais das delegacias de polícia e dos demais serviços que compõem a rede de atendimento às mulheres.
Aprovado em julho de 2013, entre as principais recomendações presentes no relatório final, consta; a necessidade de ampliação dos serviços de atendimento à violência sexual e ao abortamento legal; que sejam realizadas capacitações das/os profissionais de saúde visando a qualificação do atendimento, e que a informações sobre os serviços sejam veiculados amplamente para as mulheres possam ter acesso sem dificuldade e verem respeitados seus direitos.
2013 – LEI 12.845/2013 – Torna Obrigatório Atendimento a Vítimas de Violência Sexual pelo SUS.
Conforme o caput da Lei “os hospitais devem oferecer às vítimas de violência sexual atendimento emergencial, integral e multidisciplinar, visando ao controle e ao tratamento dos agravos físicos e psíquicos decorrentes de violência sexual, e encaminhamento, se for o caso, aos serviços de assistência social”.
2013 – 3º Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2013 a 2015)
Elaborado pela SPM – Secretaria de Políticas para as Mulheres, como resultado das Conferências e Planos anteriores. Embora tenha contado com a participação de centenas de mulheres no seu processo, estas consideraram que houve um certo retrocesso em relação às políticas de assistência ao aborto legal, provocado pela pressão dos segmentos conservadores e religiosos.
2013 – Consenso de Montevideo sobre População e Desenvolvimento
Resultante da Conferência, organizada pela Comissão Econômica para América Latina e Caribe (CEPAL) e pelo Governo do Uruguai com o apoio do Fundo de População das Nações Unidas, reuniram-se 24 organismos regionais e internacionais, e 260 organizações não governamentais, muito especialmente as organizações feministas. O evento teve participação total de mais de 800 pessoas, transformando-se assim em uma das maiores reuniões intergovernamentais da região.
O Consenso de Montevidéu é resultado da vontade política e do trabalho articulado dos Estados membros, da contribuição ativa do movimento feminista e de mulheres, e do apoio do sistema das Nações Unidas e do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Inclui mais de 120 medidas sobre oito temas identificados como prioritários para dar seguimento ao Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD) das Nações Unidas, realizada no Cairo em 1994.
Destacamos as que dizem respeito a questão do aborto. São eles: “Eliminar as causas preveníveis de morbidade e mortalidade materna, incorporando no conjunto de prestações integrais dos serviços de saúde sexual e saúde reprodutiva medidas para prevenir e evitar o aborto inseguro, que incluam a educação em saúde sexual e saúde reprodutiva, o acesso a métodos contraceptivos modernos e eficazes e o assessoramento e atenção integral frente à gravidez não desejada e não aceita, bem como a atenção integral depois do aborto, quando necessário, com base da estratégia de redução de risco e danos” e “Assegurar, nos casos em que o aborto é legal ou não está penalizado na legislação nacional, a existência de serviços de aborto seguros e de qualidade para as mulheres com gravidez não desejada ou não aceita e instar aos demais Estados a considerar a possibilidade de modificar as leis, normas, estratégias e políticas públicas sobre a interrupção voluntária da gravidez para salvaguardar a vida e a saúde de mulheres e adolescentes, melhorando sua qualidade de vida e diminuindo o número de abortos”.
2013 – Marcha das Vadias e o Papa Francisco no Rio
A Marcha das Vadias decidiu marcar sua incidência de rua no mesmo período em que o Papa Francisco visitava
o Brasil, tendo como palavras de ordem a defesa do Estado Laico, por políticas públicas sem influência religiosa, pelo respeito à pluralidade e liberdade de crença, de consciência e de religião e pelo direito ao aborto. No Rio de Janeiro, a Marcha – que reuniu centenas de feministas de vários estados brasileiros – foi marcada por ataques e agressões dos fundamentalistas religiosos causando um grande tumulto e muita matéria na mídia.
2013 – Jornadas de Junho outubro
Uma série de manifestações ocorridas em mais de 500 cidades brasileiras levou multidões às ruas, incialmente contra o aumento das tarifas no transporte público, acabou por revelar as inúmeras insatisfações da população com as políticas públicas, com o conservadorismo do Legislativo Federal e retrocessos nas políticas de direitos humanos. Os movimentos de mulheres e feministas fizeram parte desse engajamento popular levando suas bandeiras de luta contra as violências de gênero, contra a criminalização do aborto, em defesa do estado laico e da reforma política.
2014 – Norma Técnica de Interrupção da Gravidez por Anencefalia
O Ministério da Saúde lançou a Norma Técnica “Atenção às Mulheres com Gestação de Anencéfalos” dois anos após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter julgado procedente a ADPF 54 em que a mulher com gestação de anencéfalo pode manter ou interromper a gravidez, conforme seu desejo.
2014 – Lançamento do Dossiê sobre a Criminalização das Mulheres por Aborto no período de 2007 a 2014
Elaborado pela Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, o Dossiê tem por objetivo desvelar de forma sistemática os sentidos da criminalização das mulheres pela prática do aborto no Brasil do século XXI. O dossiê apresenta 20 casos de abortamento que chegaram ao conhecimento público por conta de prisão de mulheres por autoaborto, prisão de terceiros, investigação de venda de medicamentos, ou ainda pela deficiência no serviço de saúde em todas as regiões do Brasil.
2015/16 – Pela Regulamentação da interrupção Voluntária da Gravidez, dentro das doze primeiras semanas de gestação, pelo Sistema Único de Saúde (SUS)
Sugestão Legislativa 15/2014 que propõe a regulamentação da interrupção voluntária da gravidez pelo SUS até as 12 primeiras semanas de gestação, apresentada por um cidadão ao Portal Cidadania do Senado Federal e recebeu mais de 420 mil votos a favor e 380 mil contra. A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) promoveu 05 audiências públicas entre 2015 e 2016 para reunir opiniões de especialistas sobre a questão, dentre eles, ativistas feministas, professores, médicas/os e representantes de grupos e instituições contra e pró-aborto.
A polêmica antiga sobre o direito ao aborto reacendeu os debates na discussão de temas como a existência ou não de vida até a 12ª semana de gestação, o direito de vida do embrião versus a autonomia da mulher, as estatísticas, as consequências do aborto para a mulher e para a sociedade, e o aborto como problema de saúde pública.
2016 – Pesquisa Nacional de Aborto de 2016 (PNA 2016)
Levantamento sobre a prática do aborto no Brasil, realizada pela Anis – Instituto de Bioética e ao IBOPE Inteligência, através de entrevistas e esboçada de maneira que os dados resultantes da mesma pudessem ser comparados aos da Pesquisa Nacional do Aborto de 2010. Os resultados apontam que o aborto é “um fato da vida reprodutiva das mulheres” e concluiu que, em 2015, “417 mil mulheres realizaram aborto no Brasil urbano e 503 mil mulheres em todo país”.
2016 – Católicas lança campanha por Estado Laico e contra os fundamentalismos
Na Luta pelo Estado Laico, Católicas pelo Direito de Decidir – CDD lança uma Campanha em defesa da laicidade como um direito essencial para a vida de todas as pessoas, afirmando que sua violação implica, principalmente, na violação aos Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos.
Em resposta ao golpe ocorrido contra a Presidenta Dilma Roussef em 2016, que culminou com sua deposição, a Campanha apresenta ainda a laicidade como um princípio central para a democracia.
2016 – Trincheira do Aborto Legal, uma ação pelo fortalecimento desta luta no Brasil
Trata-se de um estudo sobre as condições políticas do debate acerca das proposições em curso na Câmara dos Deputados que tratam dos direitos sexuais e reprodutivos, com foco no aborto, feito por Flavia Biroli, como uma das ações do Projeto Trincheiras, coordenado pelo Cfemea, Ipas e Observatório de Sexualidade e
Política.
2017 – Alerta Feminista
Organizado pela Frente Nacional contra a Criminalização de Mulheres e pela Legalização do Aborto, o documento relaciona os principais projetos legislativos que atacam à dignidade, os direitos reprodutivos e direitos sexuais das mulheres, os direitos humanos da população LGBT e do povo negro. Contou com o apoio de mais de 400 assinaturas de organizações, movimentos sociais e circulou entre organizações e movimentos nacionais, na mídia e nas redes sociais.
2017 – 2ª Virada Feminista Online
#PrecisamosFalarSobreAborto24 – Estimuladas pela Frente Nacional contra a Criminalização de Mulheres e pela Legalização do Aborto, várias lideranças feministas e outras personalidades parceiras, ocuparam durante 24 horas a internet para conversar, discutir, informar sobre as implicações e obstáculos para a luta pelo direito ao aborto, causadas pelos meios de comunicação, hoje dominados por religiosos fundamentalistas, especialmente a TV.
2017 – Feministas tomam as ruas do País contra retrocessos na área dos direitos reprodutivos
Para reagir a inúmeras propostas legislativas que tramitam no Congresso Nacional contra a autonomia reprodutiva, como a PEC 181, o PL 5069 e o Estatuto do Nascituro, as integrantes da Frente Nacional contra a Criminalização de Mulheres e pela Legalização do Aborto e de outros movimentos parceiros, ocuparam as ruas, com faixas e cartazes, em mais de 30 cidades brasileiras, para gritar bem alto “O corpo é nosso, não da bancada moralista”.
2017 – Carta ao Parlamento Brasileiro
Em dezembro, um grupo de feministas e parlamentares estiveram no Congresso Nacional para entregar ao Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, uma carta contendo 400 assinaturas de diferentes líderes religiosos, acadêmicos, pesquisadores, artistas de diversas áreas, juristas, e de outros setores e mais 143 organizações e movimentos, onde manifestam preocupação e repudio às Propostas de Emenda Constitucional nº 181/2015, que tramita em Comissão Especial da Câmara, e nº 29/2015, que tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, pois se essas proposituras avançassem o aborto seria totalmente proibido, inclusive nos casos já autorizados por lei, como gravidez resultante de estupro, risco de morte para a mãe e anencefalia fetal. Na ocasião houve um compromisso público do Presidente de que a PEC 181 não
seria pautada.
2017 – ADPF 442
Apresentação da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) ao Supremo Tribunal Federal, apresentada pelo PSOL – Partido Socialismo e Liberdade e ANIS – Instituto de Bioética onde contestam a constitucionalidade da criminalização do aborto e pede reconhecimento desse direito até 12 semanas de gestação.
Um dos argumentos contido na ação diz “a criminalização do aborto descumpre o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e da cidadania das mulheres, pois não reconhece a capacidade ética e política das mulheres de decidirem sobre sua reprodução.
Por outro lado, apesar de todas as mulheres estarem submetidas à criminalização, esta afeta desproporcionalmente mulheres negras e indígenas, pobres, de baixa escolaridade e que vivem distante de centros urbanos, onde os métodos para a realização de um aborto são mais inseguros do que aqueles utilizados por mulheres com maior acesso à informação e poder econômico e, neste sentido, viola o princípio da não discriminação”.
2018 – Lançamento da campanha Nem presa, Nem morta
Criada por diversas organizações feministas das mais diversas áreas, além de mulheres autônomas, tem como objetivo amplificar o debate sobre a legalização do aborto no Brasil uma vez que consideraram o momento fértil, pois o STF realizaria audiências públicas sobre a ADPF 442, assim como a onda verde que tomou a Argentina, favorecendo o acolhimento desse slogan e seus argumentos.
2018 – Audiência Pública no STF sobre a ADPF 442 – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF)
Convocada pela Relatora, Ministra Rosa Weber, durante três dias foram ouvidas mais de 40 pessoas e organizações nas áreas da saúde, do feminismo, direitos humanos, entidades religiosas e estudiosas/os do assunto pós e contra a Arguição que propõe a descriminalização do aborto até 12 semanas de gestação.
Estiveram presentes na audiência, com direito a fala, 06 organizações feministas: Cfemea, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular, Rede Feminista de Juristas, Criola e Grupo Curumim, todas em defesa da descriminalização do aborto.
2018 – Lançamento da publicação “Trajetórias e Argumentos Feministas pelo Direito ao Aborto no Brasil
A publicação reúne os principais argumentos a favor da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 442, em tramitação no Supremo Tribunal Federal.
Apresentados por 10 organizações feministas: Católicas pelo Direito de Decidir, Cfemea, Cladem, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, Coletivo Margarida Alves de Assessoria Jurídica Popular, Criola, Grupo Curumim, Redeh, Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Reprodutivos e SOS Corpo, as petições dos “Amicus Curiae” oferecem a diversidade de trajetórias institucionais do ativismo feminista e seus argumentos favoráveis à descriminalização e legalização do aborto no Brasil.
2018 – Festival pela Vida das Mulheres
Espaço político instalado na Esplanada dos Ministérios mobilizado pela Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto e por organizações em torno da Campanha Nem Presa Nem Morta, contou com a presença de inúmeros movimentos e grupos feministas. Com uma vasta programação durante 3 dias, mesclando debates, rodas de conversas, exposições, apresentações musicais, as atividades do festival aconteceram simultaneamente à Audiência Pública no STF sobre a ADPF 442, provocando muita visibilidade e manifestações favoráveis ao direito ao aborto.
2018 – Amanhecer Pela Vida das Mulheres
Após uma vigília durante a madrugada em frente ao STF, com a presença do movimento feminista, representantes católicas, religiões de matriz africana, evangélicas, espíritas e outras denominações se uniram pela vida das mulheres. Um ato simbólico, cuja estética representava a morte a que muitas mulheres são condenadas pela criminalização do aborto no Brasil.
2018 – 3ª Edição da Virada Feminista: Antifascista e pela Legalização do Aborto
Neste 28 de setembro, Dia Latino-Americano e Caribenho pela Legalização do Aborto, a Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto organizaram uma maratona online de 24 horas, onde através de vídeos, debates, textos ampliaram seus argumentos em favor da autonomia reprodutiva das mulheres.
Em vários estados brasileiros as feministas se mobilizaram e tomaram as ruas com seus batuques, artivismo e atos políticos culturais pelo direito das mulheres de decidirem pelo seu próprio corpo e por seus direitos reprodutivos.
2019 – 2º Festival Pela Vida das Mulheres e Maternidade Livre
Com início na semana da luta internacional contra a morte materna – 28 de maio, a Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto realizou o segundo festival online pela vida das mulheres, como culminância de um processo de atividades realizadas em diferentes localidades do país e nas redes sociais para denunciar os ataques legislativos e regressão de direitos em curso pelo executivo brasileiro.
O Festival levou a dimensão da justiça reprodutiva como condição para a maternidade livre, o estado democrático de direito como garantidor da vida das mulheres e protetor da maternidade livre.
Década de 2020
2020 – Caso do Aborto da Menina do Espírito Santo
Menina de 10 anos, moradora do estado do Espírito Santo, vítima de estupros reiterados desde os 6 anos de idade por um tio, viveu uma dolorosa trajetória em busca de seu direito ao aborto legal. O caso tornou-se público quando o hospital de referência para o aborto legal, onde a criança foi atendida em Vitória, recusou a fazer o procedimento, mesmo tendo sido autorizado pelo juiz da Vara de Infância e da Juventude em sua cidade natal. A repercussão nacional ocorreu com a interferência do próprio governo, quando a ministra “terrivelmente fundamentalista”, que ocupa a Secretaria da Mulher, se manifestou nas redes sociais e fez intervenções para impedir que o aborto legal fosse realizado, como era o desejo da menina e de sua família. Além disso, dados sigilosos foram divulgados por extremista da ultradireita. O fato provocou uma grande mobilização da Frente Nacional contra a criminalização das mulheres e pela legalização do aborto. Além do movimento feminista do Brasil, inúmeras organizações se somaram em repúdio a essa grave violação dos direitos da criança, publicando notas e manifestações de norte a sul do Brasil.
Com apoio do Fórum de Mulheres do Espírito Santo – FOMES e do Fórum de Mulheres de Pernambuco – FMPE, a menina foi levada a Recife, onde o serviço de aborto legal se dispôs a cumprir com o direito dado por lei.
Ainda assim, a criança foi recebida sob gritaria de fundamentalistas religiosos à porta do hospital, provocando nova violação de direitos com grave violência, inclusive com apoio de parlamentares. Apesar dos protestos contrários, entidades científicas, médicas e de classe, junto com o movimento feminista, foram fundamentais para exigir que o direito da menina fosse garantido.
2020 – Decreto 10.531/2020: Ação da Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto
Em reação à publicação a esse Decreto em que o governo "institui a estratégia federal de desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031”, a FNPLA fez um Chamado à Ação Nacional, com objetivo de alertar sobre as graves consequências dessa estratégia para a saúde e a vida das mulheres e meninas. Com cunho fortemente fundamentalista religioso e colocando em xeque o estado laico no País, o Decreto explicita e aprofunda os ataques à Constituição Cidadã de 1988 e, de modo especial, à autonomia reprodutiva das mulheres.
Em nota, a Frente afirma: “O governo assume por definitiva a postura autoritária e fundamentalista, desconsiderando a realidade que cerca a vida de mulheres e meninas nesse país em que, segundo dados do Fórum Nacional de Segurança Pública, a cada 8 minutos uma mulher sofre estupro no Brasil. Dos quase 70 mil estupros, registrados em 2019, mais da metade foram cometidos contra meninas de menos de 13 anos. Como pode o Estado, por decreto executivo, pretender negar o direito de acesso ao Aborto Legal?”
2020 – Publicação da PORTARIA Nº 2.282, DE 27 DE AGOSTO DE 2020, modificando a Norma Técnica do aborto previsto em Lei
Uma conquista da luta feminista foi a exclusão da Boletim de Ocorrência na Norma Técnica para o atendimento de vítimas de violência sexual ao buscarem os serviços de aborto legal, respeitando assim o sigilo profissional e a autonomia das mulheres. Porém, em agosto de 2020, o Ministério da Saúde publica uma Portaria que passa a tornar obrigatória a notificação, pelo médico, à autoridade policial. Com isso, retira das mulheres a decisão sobre a denúncia, além de serem constrangidas a verem e ouvirem o feto/embrião num ultrassom antes do procedimento, normatizando assim a violência institucional nos serviços de saúde.
Essa portaria, após muita pressão e ação enviada ao STF por grupos feministas, foi substituída por uma outra (PORTARIA Nº 2.561, DE 23 DE SETEMBRO DE 2020) que retirou algumas obrigatoriedades, deixando ainda muitas ambiguidades, num esforço do governo federal de tornar cada vez mais difícil o direito de acesso à interrupção da gravidez nos casos previstos em lei.
2020 – Cartilha Aborto no Brasil: Uma abordagem jurídica e prático- informativa
Publicada pela Campanha Nem Presa Nem Morta, trata- se de um material informativo e partilha de saberes voltados, especialmente, para ativistas e pessoas que lutam pela descriminalização do aborto no país.
2020 – Legalização do Aborto na Argentina respinga no Brasil
Depois de um potente processo de mobilização no país, tomado pela onda verde feminista, no dia 30 de dezembro, o Senado argentino votou a favor da legalização do aborto, esperançando outras mulheres da América Latina e Caribe e demonstrando que a luta organizada tem resultados. No Brasil, a mobilização popular tem se esbarrado no grande contingente de mulheres evangélicas que têm sido manipuladas pelos pastores fundamentalistas contrários à autonomia das mulheres.
2021 – Chamado à Ação contra criminalização das mulheres pelo Congresso! Barrar e enterrar o PL 5435
Atentas às iniciativas legislativas em tramitação no Congresso Nacional, a FNPLA lança um chamado nacional à ação, mobilizando o feminismo e as organizações parceiras a repudiarem o avanço no Senado do PL 5435/2020.
Denominado por seu autor de “Estatuto da Gestante”, é na verdade um outro cavalo de Tróia, pois pretende criminalizar totalmente a prática do aborto no Brasil, falando em proteção da vida desde a concepção e em instituir uma bolsa estupro. O Chamado da FNPLA visou provocar uma mobilização nacional das frentes locais e organizações parceiras, iniciando em 28 de setembro até o final das eleições 2022, na intenção de barrar a ofensiva conservadora da ultradireita fundamentalista que busca, por meio lícitos e ilícitos, fincar e consolidar suas raízes nos municípios brasileiros.
2021 – Dossiê Mulheres Negras e Justiça Reprodutiva
Lançado pelo Grupo Criola, em live no dia 01 de outubro, tendo como convidadas ativistas negras e especialistas em Justiça Reprodutiva, integrando as mobilizações em torno do Dia de luta pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe.
O dossiê reúne dados do Brasil e do estado do RJ entre os anos de 2020-2021 e aponta os impactos na saúde reprodutiva das mulheres negras cis e trans e a relação entre justiça social e direitos reprodutivos.
2021 – 28 de Setembro – Dia Latinoamericano e Caribenho de Luta pela Legalização do Aborto
Lançamento do manifesto “Nossa luta é por democracia, direitos, justiça e Fora Bolsonaro!” pela Frente Nacional Contra Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto através de ocupação das redes sociais, especialmente o twittaço em horário pré determinado.
Dezembro de 2021
A luta continua até a conquista da legalização do aborto no Brasil!