Mulher negra escravizada e ativista política abolicionista.
Josepha Tereza da Silva, mais conhecida comoAdelina, ou Charuteira, foi uma mulher negra, escravizada e abolicionista relevante para a articulação política e sobrevivência dos abolicionistas em São Luís, Maranhão, no século XIX.
Adelina nasceu em 7 de abril de 1859, tendo perdido sua mãe em 1875, ela era filha de uma mulher escravizada conhecida como Boca da Noite. As duas teriam recebido tratamento diferenciado por parte do senhorio. Nascida sob a condição legal de escrava, vivia com a promessa de liberdade que seu algoz e pai biológico teria feito à sua mãe no seu leito de morte. No entanto, aos 17 anos, a promessa não foi cumprida. Seu senhor havia sofrido um revés financeiro à época, decidindo, portanto, fabricar charutos. Ele obrigou Adelina a trabalhar nas vendas, como charuteira e escravizada. Adelina sabia ler, escrever e bordar e era bastante esperta.
O seu trabalho de vendedora de charutos facilitou à Adelina adquirir uma vasta rede de relações e de conhecimento sobre a cidade. Além disso, garantia a ela, mesmo enquanto escravizada, facilidade e liberdade para circular pelas ruas, sendo esse o seu maior trunfo na luta contra a escravatura. Seu ofício a possibilitava articulações com os ativistas do movimento abolicionista para que pudessem se antecipar às ações policiais, além de promover fugas de escravos. Adelina contribuiu pessoalmente para que várias pessoas conseguissem escapar e fugir. Esse teria sido o caso da mulher escravizada Esperança, que fugiu para a província do Ceará com um comerciante português de quem estava grávida.
Adelina se comunicava com pessoas das mais diversas classes sociais com a finalidade de promover a luta abolicionista. Segundo Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil, nas peregrinações pelas ruas de São Luis do Maranhão, quando vendia charutos, Adelina travou contato com os estudantes abolicionistas e se encantou com seus ardentes discursos em prol da liberdade. Ela passou a colaborar efetivamente com a causa abolicionista distribuindo informações e auxiliando na fuga de escravos. Sua privilegiada posição de vendedora ambulante lhe possibilitava manter contato com as mais diferentes ‘fontes’ de todas as regiões da cidade sem despertar tantas suspeitas.
Adelina fazia parte ativamente do Clube dos Mortos, sociedade abolicionista de rapazes. A venda dos charutos também servia para arrecadar dinheiro à causa. Destaca-se que o próprio fato de uma mulher negra articular com o Clube dos Mortos, sociedade exclusivamente masculina, demonstra a singularidade de Adelina, considerando o contexto altamente misógino e racista da época. De fato, isso demonstra o nível de articulação intelectual de Adelina, que conseguiu lutar pelo abolicionismo mesmo enquanto mulher escravizada – um dos maiores alvos das violências biopolíticas e necropolíticas da época e de hoje.
A Biblioteca do Senado Federal em Mulheres de A – Z: Bibliografia de biografias de mulheres, de 2020, seleção bibliográfica, destaca Adelina como uma importante pessoa escravizada e abolicionista, destacando a importante atuação dos mais diferentes perfis de mulheres que atuaram contra a escravidão e que mudaram a história do país.
Segundo Jurema Werneck, a história de Adelina e das mulheres negras são historicamente excluídas dos debates públicos, ainda que elas tenham contribuído tanto para os avanços sociais da humanidade. Resgatar sua história é resgatar e reconhecer a tradição das ialodês, resgatando a agência feminina negra e seu legado de liderança de ação política e insubmissão.
Destacamos que a memória de Adelina é preservada, por exemplo, por meio do material didático Outras memórias e outras histórias dos negros no Brasil, de Sigelinda Maria Zanoni de Andrade. O livro cita Schuma Schumaher e Érico Vital Brasil em Dicionário Mulheres do Brasil e Teresinha Bernardo em Negras, Mulheres e Mães: Lembranças de Olga de Alaketu, dispersando conhecimento sobre a ativista abolicionista na produção didático-pedagógica elaborada como etapa obrigatória na implementação do Programa de Desenvolvimento Educacional da Universidade Estadual de Londrina, em 2010.
Palavras-Chave: #racismo; #abolicionismo; #colonialidade; #mulheresnegras; #escravidão; #pessoasescravizadas.
Texto Adaptado do verbete contido no Dicionário Mulheres do Brasil por: Emilson Gomes Junior, Schuma Schumaher e Ana Laura Becker de Aguiar.
REFERÊNCIAS
- Produções acadêmicas:
ANDRADE, Sigelinda Maria Zanoni de. Outras memórias e outras histórias dos negros no Brasil. Ivaiporã: Universidade Estadual de Londrina: 2010. PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional. Disponível em: 2009_uel_historia_md_sigelinda_maria_zanoni.pdf (diaadiaeducacao.pr.gov.br). Acesso em 19 jun 2023.
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FOTOGRAFIA
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