• Do palavrão ao diálogo – A performatividade do feminismo contra os jogos vorazes da linguagem patriarcal

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11 de abril de 2024 por 

Marcia Tiburi

Publicado originalmente no Livro Filosofia Feminista de Marcia Tiburi, Susana de Castro, Maria Borges, Editora SENAC São Paulo, 2023.

A função performativa do termo feminismo

Um dos maiores problemas que o feminismo enfrenta ao longo de sua história é a questão do seu próprio nome. Representações hostis fizeram do feminismo uma palavra que apavora (scared word)[1]. Tais representações foram construídas pela máquina de produção simbólica e imaginária, discursiva e imagética, que é o patriarcado enquanto sistema de opressão e privilégios e, igualmente, um sistema linguístico como eu gostaria de explorar nesse texto.

A mídia e outros aparelhos produtores e reprodutores de linguagem do referido sistema, tais como igrejas fundamentalistas, continuam favorecendo a incompreensão do termo e do sentido histórico nele contido. A demonização do termo gênero faz parte desse mesmo processo. A pergunta que devemos nos colocar é: qual a importância e a potencialidade do significante “feminismo” na luta feminista e que o torna alvo da guerra patriarcal?  

O que vem sendo chamado há séculos de misoginia[2], o discurso de ódio às mulheres, se efetiva hoje no processo de produção de incompreensão e desinformação em torno de feminismo e gênero. O patriarcado é um sistema manipulatório de massas, como não poderia deixar de ser, enquanto face do capitalismo e do racismo. O discurso de ódio às mulheres e pessoas LGBTQI+ serve ao capitalismo, ele mesmo a forma econômico-política do patriarcado. O racismo, enquanto ódio aos negros e outras etnias não-brancas e o capacitismo, enquanto ódio às pessoas cujos corpos escapam às normas plásticas, visuais e auditivas do patriarcado, são mais que formas, são verdadeiras fórmulas, do mesmo sistema de opressão. Por fórmulas quero dizer um operador teórico-prático de opressão que pode ser usado a qualquer momento por indivíduos, grupos e governos.

Porém, a palavra que apavora à “F word[3], ou “palavrão”, como se diz em português, implica um “potencial epistemológico radical”[4]. Se o feminismo “apavora” é por provocar reviravoltas concretas, mas também por provocar uma virada epistemológica que é capaz de impedir o retorno dos parâmetros de pensamento que sustentam o patriarcado. Feminismo se tornou uma palavra de resistência ao discurso misógino. Isso quer dizer que a palavra ela mesma carrega o sentido da luta epistemológica contra o patriarcado. Assim é que a luta feminista é também a luta por dizer seu próprio nome e, a partir desse gesto de autoafirmação, seguir desestruturando um sistema ideológico de dominação e de opressão.

Dizer-se feminista é, portanto, uma declaração de participação no enfrentamento ao patriarcado e, evidentemente, um problema para esse sistema. Luta é, nesse caso, performatividade[5], o “dizer” tem um potencial de causar efeitos simbólicos intensos. Daí a importância de dizer-se feminista em uma cultura patriarcal.

O feminismo pauta a insubmissão das pessoas ao sistema heteronormativo branco-capitalista-capacitista, a isso, a máquina de produção linguística do patriarcado responde transformando o problema que o feminismo cria para ele em um problema para as feministas, algo que, historicamente, as feministas do mundo todo vem respondendo com a intensificação da luta. Isso quer dizer que a histórica violência patriarcal precisa especializar seu jogo retórico e de inversão de sentidos no âmbito do psicopoder[6]. Alicerçado na prática das violências físicas e verbais, o patriarcado precisa de uma discursividade que garanta a permanência da artilharia anti-feminista nas quais as palavras, as falácias e outras distorções – desinformação e Fake News – são armas de ataque. Isso quer dizer que tanto o termo feminismo, assim como gênero (poderíamos estender essa analise ao termo “identidade”, porém não faremos isso no espaço desse texto), são termos usados contra suas próprias signatárias.

A misoginia, enquanto discurso de ódio e tecnologia politico-afetiva, no cerne do regime discursivo que é o patriarcado, afeta a imagem das mulheres e do feminismo em favor do círculo vicioso entre violência verbal (na qual se incluem todas as práticas de silenciamento, xingamento, distorção) e simbólica próprias à dominação patriarcal. Se agentes da discursividade misógina usam o “feminismo” em contextos ofensivos (como o termo “feminazi” que se tornou muito popular em lugares como os Estados Unidos e o Brasil[7]), na continuidade muitas mulheres abominam o feminismo e outras tantas se negam a afirmar-se como feministas. Se, de um lado, pessoas subalternizadas intelectualmente pelos meios de comunicação corporativos no sistema gênero-raça-capital permanecem alheias à análise e à crítica[8], de outro lado, muitas outras não querem adotar em suas vidas uma expressão desabonatória que pode vir a prejudicá-las ainda mais à medida em que se tornam alvo. Se ser mulher ou ser um corpo inadequado ao patriarcado implica a misoginia, já que o patriarcado cria o feminino como um outro a ser abatido, ser e dizer-se feminista implica a possibilidade de ser alvo da misoginia duas vezes[9].

O termo feminismo, bem como a mulher “feminista”, sofre dos mesmos preconceitos que as mulheres, pois o termo mulher é também parte da episteme da violência patriarcal. Logo, se “mulher” sempre foi objeto de misoginia, ser uma “mulher feminista”, uma mulher que luta pelas mulheres e contra o patriarcado, o é numa nova potência. Mulher é um termo que serve para marcar (“isso é coisa de mulher”), para xingar (“só podia ser mulher”), para admoestar e exigir enquadramento epistemológico no regime de gênero heteronormativo (como quando se diz “nem parece uma mulher”), enquanto “feminista” é um termo que, vindo atrapalhar a ordem criada na enunciação aceita da palavra mulher, é tratado como uma abominação.

O patriarcado como regime linguístico de heterodenominação, para o qual o poder de nomear implica dominar a ordem epistemológica e do discurso, precisa impedir o gesto performativo da auto-afirmação que torna alguém autônomo, ou seja, dono de si, no caso das mulheres, donas de seu próprio corpo. A misoginia joga um papel fundamental nesse processo impedindo que a posição feminista avance como uma mediação necessária para a produção da consciência acerca do direito ao corpo.

Para além do preconceito estrutural ou essencial construído pela filosofia, pela teologia, pela ciência moderna e até mesmo pelas artes, podemos chamar de preconceito ativo a ação contra o termo feminismo e o termo feminista no contexto do mundo da vida no patriarcado capitalista. Evitar que a luta das mulheres e pessoas LGBTQI+ avance é o escopo dessa ação. Usando o preconceito ativo como estratégia, o patriarcado consegue produzir uma rejeição à luta fundada na rejeição ao termo usado para expressar a luta. Se dizer é fazer, a fala violenta é ação em si mesma, mas também incitação às violências materiais e físicas que criam e recriam condições simbólicas e concretas em um círculo vicioso. A misoginia é parte fundamental da pragmática do discurso falogocêntrico. Se o patriarcado é estruturado como (e na) linguagem, a misoginia garante a ordem simbólica, conceitual e moral, ou seja, as próprias condições de possibilidade do patriarcado diante das ameaças que ele sofre por parte daquelas que se negam à sua exigência de submissão.

No contexto em que a misoginia é o discurso oficial quando mulheres seriam vistas como uma fraqueza ou um erro da natureza, como se pode ver em todo um período da filosofia europeia clássica que construiu um conceito de natureza feminina (da Grécia antiga à modernidade, como Burke e Kant), as feministas seriam um duplo erro da natureza e da cultura. Feministas seriam mulheres duplamente desnaturadas e portadoras de algo “contranatural”: sua insubmissão. Exemplar, nesse processo, é o ódio a livros como “O Segundo Sexo” de Simone de Beauvoir[10], com sua crítica às mulheres que apoiam o inimigo e sua teoria do “caráter inessencial” das mulheres no sistema do patriarcado, diante do caráter essencial dos homens, faz parte da tecnologia política da misoginia.

A misoginia como atitude da linguagem sempre foi providencial na organização da violência para que ela funcione efetivamente de maneira orquestrada. Ela está presente quando se associa as mulheres à natureza: na imagem da natureza, no que se diz da natureza, e no prisma usado para se construir discursos sobre as mulheres. As predisposições e “originariedades” todas remetem à natureza: a “inconfiabilidade”, “o mistério”, a “impotência”, a “fragilidade”, o caráter de coisa disponível à manipulação, a “sedução”, a “carne”, a “sensibilidade”, o “desejo”, “a beleza”, a “mulher como natureza morta” à qual a arte patriarcal tentou reduzir sua imagem[11]. Cada uma dessas qualidades coloca as mulheres para uma posição subjugada. A inconfiabilidade, por exemplo, foi criada pelo próprio patriarcado como uma categoria operacional do discurso misógino e serve para abalar a relação das mulheres entre si, providenciando espaço de insegurança e fragilização que faz com que elas, por medo umas das outras, se entreguem aos homens com mais facilidade. Mais e mais violência se gera ao redor dos corpos soltos uns dos outros e dos corpos despotencializados pelo poder. A violência patriarcal é também uma metodologia de separação aplicada às mulheres e aos corpos que ele deseja controlar ou descartar. O poder é uma metodologia criada entre os homens para garantir sua coesão, segurança e proteção, e algo que as mulheres não devem usar segundo as normas do sistema patriarcal. Se as mulheres usarem o poder, a confiança simbólica e prática umas nas outras de forma metodológica, o sistema sustentado na diferença hierárquica entre homens e mulheres pode ruir.

Nesse sentido, podemos dizer que o feminismo é um operador teórico-prático mas no sentido de um contradispositivo que desmonta o programa patriarcal. Ele é acionado para desativar o dispositivo do poder da dominação masculina patriarcal. Desmontar a máquina misógina patriarcal é como desativar um programa de pensamento que orienta o comportamento dos corpos. Em outros termos, o patriarcado é um verdadeiro esquematismo do entendimento e um pensamento pronto que nos é imposto para que pensemos e orientemos a nossa ação de um determinado modo: sempre na direção do favorecimento dos sujeitos privilegiados do capitalismo-racismo-capacitismo e de tudo o que sustenta seu poder.

O ódio misógino ao feminismo está ligado ao sistema da heterossexualidade compulsória de submissão dos corpos ao dispositivo da linguagem (podemos falar de uma episteme mas também de uma moralidade ou eticidade patriarcal) segundo o qual as mulheres devem ser objetos para os homens e não sujeitos para si mesmas. Nesse sistema, corpos devem ser encaixados segundo conceitos prévios assim como as ideias e as palavras que veiculam conceitos e ideias na prodiuçao de discursos. O lugar da negatividade é reservado ao termo feminismo assim como foi o lugar do termo mulher[12].

Outra comparação pode nos ajudar a entender o paralelo entre linguagem e sistema patriarcal heteronormativo. Entre pessoas trans que enfrentam o problema da nomeação como mudança de registo civil e os problemas do feminismo com seu nome próprio, há uma analogia que pode nos ajudar a compreender o sistema de nomeação heteronormativa. Trata-se de refletir sobre o sistema de nomeação conveniente à heternonormatividade compulsória.

Assim como mulheres sofrem e correm o risco de padecer no patriarcado, pois devem adequar-se a ele ou morrer, pessoas trans igualmente sofrem e correm riscos diversos no sistema heteronormativo cisgênero. Da mesma maneira que pessoas trans têm problemas burocráticos, legais e sociais a enfrentar com o seu “nome social” frente ao lugar do “nome” que lhes foi dado pela família em sua estrutura patriarcal (sendo a família a instituição que porta a tarefa burocrática e legal do registro em cartório ou do registro por meio de batismo quando há alguma igreja envolvida no processo de inscrição jurídica formal de alguém que nasce), o feminismo se enfrenta com seu nome como um problema criado pelo patriarcado.

O nome que os sujeitos institucionais imprimem em uma pessoa que nasce pode ser um fator de opressão, como acontece constantemente no processo de nomeação de uma pessoa transgênera. O nome de uma pessoa trans será tratado pelo sistema hetero-cisgênero como um nome inadequado, como se o nome que uma pessoa transgênera busca para si mesma fosse uma afronta ao regime da linguagem do sistema hetero-cisgênero que se auto-coloca como um regime de determinação da verdade. Certamente, o uso do termo cis já é uma afronta a um sistema que acoberta sua ideologia[13]. Se a ressignificação do termo “mulher” vem sendo alcançada a duras penas ao longo dos séculos de enfrentamento ao discurso misógino, para as pessoas trans, assumir um nome próprio e uma autodesignação autorrepresentativa é uma conquista tanto no campo do direito quanto no campo da cultura. O feminismo como expressão carregada de incômodo trabalha pela mesma conquista[14]: a de ser um nome que é considerado “inadequado” e que deve ser reconhecido em sua dignidade, sobretudo pelas pessoas que tem seus direitos assegurados devido às lutas feministas.

O problema do nome na cultura patriarcal sempre foi um problema de gênero[15]. Todo problema de gênero é linguístico, mas também performativo. Assim, pesa sobre os corpos violentados pelo patriarcado a proibição de dizerem quem são e como se veem por meio de suas próprias palavras, sob pena de atingirem de maneira manifesta e provocativa a condição de sujeito (ou seja, donos de si), deixando de ser objetos do patriarcado. Entre o nome próprio e a biografia, e entre o “nomear” a si mesmo e o poder de definir uma autobiografia, avança a política da verdade feminista que visa libertar os corpos da sentença de morte patriarcal.

Gênero como nova bruxaria

A violência que se faz aos corpos marcados como objetos pelo sistema patriarcal tem correspondência na violência que se faz à teoria produzida por mulheres e pessoas LGBTQI+ e àquelas teorias que, pelos mais diversos caminhos, fazem desmoronar os muros epistemológicos dos quais depende o patriarcado. Teorias que estejam no amplo campo dos estudos feministas, de gênero, ou queer ficam na mira da artilharia patriarcal, de um lado, pelo apagamento acadêmico, contra o qual as teóricas feministas vêm lutando, e, de outro, por fundamentalistas que atacam e se organizam para perseguir. O ataque ao campo dos Estudos de Gênero em nossa época não se dá por acaso. Que Judith Butler

A criação de um campo de batalha no contexto da expressão “ideologia de gênero” é o melhor exemplo do que está em jogo[16]. A expressão “ideologia de gênero”, ela mesma uma expressão feminista usada para definir o patriarcado[17], foi sequestrada pela ideologia patriarcal. Contudo, a artimanha pela qual a expressão “ideologia de gênero”, que é o patriarcado, usa uma definição conceitual que a ela se aplica para combater aquelas estudiosas e todo o campo de estudos de gênero, tornou-se popular no Brasil, inclusive em meios escolares[18]. A pesada violência conceitual contra teóricas, pesquisadoras, estudantes, escritoras, a reflexão, a ciência, o mundo acadêmico, e a escola adquiriu ares de verdade em um verdadeiro movimento de populismo patriarcal. Nessa guerra, é o retorno da caça às bruxas o que assistimos, sendo “gênero” a nova bruxaria[19].

A partir de textos de teóricas americanas tais como a antropóloga Gayle Rubin, com seu artigo “O Tráfico de Mulheres: Notas sobre a “Economia Política do Sexo”, publicado em 1975[20], e da historiadora Joan Scott, que escreveu um texto chamado “Gênero: uma categoria útil para análise histórica”[21], tornado referencial desde os anos 80, e lembrando que, logo depois, em 1990, Judith Butler, para citar uma das mais famosas entre as teóricas de feminismo contemporâneo, publicou “Problemas de Gênero – Feminismo e Subversão da identidade”, todo um novo cenário teórico se erigiu em torno do tema gênero. Surgiu um verdadeiro campo ao qual se deu o nome “Estudos de Gênero” e que se confunde, muitas vezes, com os estudos feministas em função de uma perspectiva metodológica comum. Vale lembrar que Judith Butler, em visita ao Brasil em 2017, foi perseguida e agredida no aeroporto da cidade de São Paulo e teve uma imagem sua queimada diante do centro cultural onde iria proferir sua palestra[22].

O uso distorcido e falacioso da expressão “ideologia de gênero” passou a ser comum a partir de uma “Conferência Episcopal da Igreja Católica” ocorrida em 1998 em Lima, no Peru. O tema da referida conferência foi “A ideologia de gênero – seus perigos e alcances”[23]. Vale a pena ler um trecho no qual verifica-se o tom de alerta inicial que será mais adiante usado para combater a categoria “gênero”:

“No se necesita mucha reflexión para darse cuenta de lo revolucionaria que es esta posición, y de las consecuencias que tiene la negación de que haya una naturaleza dada a cada uno de los seres humanos por su capital genético. Se diluye la diferencia entre los sexos como algo convencionalmente atribuido por la sociedad, y cada uno puede “inventarse” a sí mismo.

Toda la moral queda librada a la decisión del individuo y desaparece la diferencia entre lo permitido y lo prohibido en esta materia. Las consecuencias religiosas son también obvias. Es conveniente que el público en general se dé clara cuenta de lo que todo esto significa, pues los proponentes de esta ideología usan sistemáticamente un lenguaje equívoco para poder infiltrarse más fácilmente en el ambiente, mientras habitúan a las personas a pensar como ellos. Este librito puede ayudar mucho en precisar conceptos y llamar a una toma de posición con respecto a la mencionada ideología.”

O redator do texto, Monsenhor Oscar Alzamora Revoredo, entende o que está em jogo à luz de interesses religiosos que não são ocultados no texto, mas que não são totalmente declarados. Essa ambiguidade é importante para a conquista do leitor que deve ficar inocente quanto ao subtexto e que, embora seja tratado com excessiva didática, ao mesmo tempo, não deve se sentir um imbecil, mas apenas aceitar a visão da igreja como natural. Da perspectiva da igreja, sustenta-se uma espécie de monopólio epistemológico sobre o tema da sexualidade a partir da ideia de uma natureza sexual que o termo gênero vem questionar.

Gênero torna-se rapidamente, no texto do religioso, algo da ordem de uma ameaça. Em vez de se tratar gênero como uma questão de análise científica, a saber como uma “análise do ser”, o texto parte para uma forma de falácia naturalista: aquela que deriva um “dever ser” a partir do “ser” e que define a ética a partir da ideia de natureza. No entanto, há ainda mais que isso. A falácia naturalista está ainda ligada à de correlação coincidente (Cum hoc ergo propter hoc); Desse modo, tem-se que sempre que se fala em gênero, alguém muda de gênero; ou, sempre que alguém fala em gênero, se pretende ensinar alguém a mudar de gênero, ou seja, a conclusão falaciosa é que o termo gênero, a categoria analisada e estudada, ou simplesmente pronunciada, é que leva as pessoas a uma posição necessariamente “transexual”, como se pelo fato de estudar o tema as pessoas passassem a atuar ou agir para mudar de sexo ou gênero ou para levar outrem a mudar de sexo ou gênero.

O que está em jogo é o regime de controle da linguagem/controle do corpo. O gesto da autoafirmação, dizer e contar a própria história, assume o mesmo lugar de sujeito que o herege e a “bruxa” tinham na Idade Média[24]. Nesse contexto, estudar gênero, assim como estudar mulheres ou feminismo, bem como dizer-se feminista, torna-se uma ousadia e, no extremo, uma heresia pela qual a pessoa é demonizada e passa a ser tratada segundo o tratamento que se deve dar a um ser heterodenominado “bruxa”. Ora, a formulação de uma não-identidade como identidade é sempre uma estratégia política tanto para quem é nomeado quanto para quem nomeia[25]. Contudo, nomear-se significa romper com o poder linguístico do patriarcado. Nomear-se torna-se um gesto de empoderamento. Aquele que nomeia é dono do poder simbólico sobre o outro na ordem do discurso. O que está em jogo é ainda, mais uma vez, o problema da autoridade – e do autoritarismo característico do patriarcado que implica a “autorização” para dizer o que ou “quem” alguém é. A disputa sobre gênero tem a ver com esse domínio epistemológico que determina a ontologia patriarcal. E esse aspecto – o ser de uma coisa que “é” – diz respeito a um problema mais que verbal: o modo pelo qual algo entra na ordem da linguagem e adquire existência no mundo humano movido pela máquina da linguagem.

O patriarcado é a máquina, o dispositivo, e o mecanismo que usa gênero e sexo como peças de sua engrenagem alucinada para produzir violência simbólica e física e, assim, dominação e poder. O feminismo vem mostrar que o funcionamento dessa máquina movida pelo “princípio de identidade masculino” e pela “política da identidade patriarcal” precisa ser freada. Nesse processo, a epistemologia feminista cumpre um papel fundamental e acaba por ser programática e pragmaticamente alvo do ódio orquestrado.

Colonialismo

O exemplo de Cristóvão Colombo ao invadir o território que veio a ser chamado de “América” ajuda a entender a política da linguagem colonizadora em analogia com a política da linguagem patriarcal entre as quais a continuidade é evidente. Colombo chamou de “índios” pessoas que ele encontrou em Guanahani (que Colombo invadiu e denominou de San Salvador) em 12 de outubro de 1492, lugar desconhecido dele e de seus compatriotas, e que tampouco lhe interessava conhecer[26]. Na postura de Colombo, é visível a negação do outro, negação que faz parte do caráter de dominação da nomeação enquanto principio colonializante. A nomeação do outro está implicada na política da colonização própria à história das Américas enquanto espaço violentado pela colonização[27].

Colombo tomava posse das terras que via por meio de atos de linguagem, organizando cerimônias tais como a que se deu em Guanahani: “Minha vontade”, escreve Colombo já em sua primeira viagem, “era não passar por nenhuma ilha sem dela tomar posse”. A atitude verbal é o que permite a ação da “posse” sobre Guanahani[28]. As palavras cerimoniais servem à legitimação da propriedade e acobertam o crime de apropriação indébita, para dizer o mínimo, do mesmo modo que os discursos cerimoniais de sedução romântica que fizeram sucesso do período do amor cortês ao romantismo acobertam violências sobre corpos femininos sob alegação de “conquista”[29].

Conquistar a terra e conquistar a mulher fazem parte da mesma retórica colonial/patriarcal[30]. Não é de espantar que discursos jurídicos de “legítima defesa da honra” e “crime passional” venham depois servir para acobertar crimes de feminicídio[31]. O destino das mulheres conquistadas ou das terras conquistadas é a sujeição ao homem e/ou a morte, ou seja, a eterna autoaniquilação e sujeição à normatividade estética e política do patriarcado ou a morte literal. A condenação à violência faz parte de uma cultura de condenação à morte que, embora continue sendo contemporânea, remete ao mais arcaico[32]. A relação entre o poder patriarcal e a violência que ele produz para se perpetuar no poder desemboca em simbolismos e práticas de feminicídio, seja na literatura, no cinema, bem como na vida. A docilização e submissão produzidas na matriz de subjetivação feminina tem relação direta com a morte à qual as mulheres estão condenadas. A perseguição às mulheres e a violência contra elas é sustentada pelo discurso misógino. Na cultura misógina própria ao patriarcado sempre é mais fácil odiar mulheres do que homens, mesmo quando eles seriam muito mais odiáveis do que elas. Para docilizar as pessoas marcadas como mulheres, foi inventado o conceito de “feminino”. O feminino é o termo usado para salvaguardar a negatividade que se deseja atribuir às mulheres no sistema patriarcal como uma coisa inofensiva.

Certamente o que Todorov chamou de “furor nominativo[33] era parte da prepotência capitalista dos “conquistadores”, assim como da dominação patriarcal, que visa dominar a terra como uma mulher usando o mecanismo da linguagem. Desenvolvi esse tema em outro trabalho[34] mas gostaria de notar que comparar o processo de produção epistemológica da colonização e do patriarcado nos faz ver que se trata de métodos e objetivos idênticos. A colonização é epistemológica e patriarcal assim como o patriarcado é uma forma de colonização baseado em uma epistemologia da dominação. Ela se dá sobre pensamentos e corpos, sobre o espírito e a matéria, sobre a cultura e a natureza, e sobre as mulheres e os territórios. Tal comparação permite entender o papel da linguagem no que concerne às relações entre sexo, gênero e poder (e certamente raça, discapacidades, e outras formas de opressão ideológica) que o feminismo vem perturbar.

Jogos vorazes da linguagem

Por meio da comparação entre o gesto colonizador de Colombo e o gesto nuclear da linguagem misógina utilizada pelo patriarcado está posta a questão da política do sexo enquanto política da linguagem.

Podemos definir o “patriarcado” como uma ordem teórica-prática, como um regime epistemológico e afetivo amparado na linguagem. Nele, o machismo e a misoginia são um jogo de linguagem pelo qual se exerce um controle milimétrico das ideias, dos conceitos, dos textos, e das palavras para o controle dos corpos. Todo o controle dos corpos passa pela linguagem e também pela língua[35]. O patriarcado passa pela linguagem que tem como estratégia e modo de ser colonizar a linguagem. Ora, ao longo da história, as instituições que dominam a linguagem dominam o corpo[36]. A Igreja, a Família, o Estado, e o sistema econômico dominam os corpos pela linguagem e as linguagens pelo corpo. Podemos dizer que as “mulheres” e toda a população marcada e visada pelo capitalismo como objeto útil, descartável, ou indesejável vive lançada em jogos de poder que são eles mesmos jogos de força e de violência. Além disso, os “jogos de linguagem” patriarcais/coloniais não são ingenuamente lúdicos: são “jogos vorazes” (Hunger Games[37]) nos quais os corpos em jogo devem lutar por sua vida e sobreviver apenas se puderem escapar.

A atitude dos dominadores em todos os tempos usa a linguagem como meio da violência. Mulheres e pessoas estrangeiras à heteronormatividade, enquanto lei sobre corpos e afetividades, são violentadas simbólica e fisicamente com base no duplo gesto da heteronomeação. O “furor nominativo” de Colombo nos mostra um regime de pensamento, de emoção, e de ação que se efetiva como “heteronomeação” em cuja base está o princípio de identidade masculinista: uma matriz subjetiva cujo principal ato é a marcação do outro com o objetivo de submetê-lo. Tal gesto linguístico aparece e reaparece mostrando seu caráter originário e constitutivo do patriarcado colonial ou da colonização patriarcal. Definições tais como “mulher”, “homem”, “macho”, “fêmea”, “hermafrodita”, “sexo”, e toda uma terminologia que escapa à criação feminina e feminista, fazem parte do “furor nominativo” falocêntrico, ele mesmo um “jogo voraz” instaurado nas instituições e na vida cotidiana desde a percepção da linguagem como arma de guerra.            

No regime patriarcal, não há palavra que se diga que não esteja a favor ou contra ele. Isso quer dizer que nenhuma palavra está isenta dos jogos de poder e violência nele estabelecidos. Ora, o patriarcado se constitui como uma equação: de um lado ficam os homens e o poder e, de outro, as mulheres (e demais corpos não-masculinos) e a violência. As mulheres são lançadas na violência e afastadas do poder. Embora poder e violência estejam entrelaçados intimamente e a violência possa ser exercida sem palavras, o poder precisa muito mais delas.

Assim como há países que servem de laboratório do neoliberalismo, os corpos femininos sempre foram cobaias. Mulheres na posição de indesejáveis para o sistema, ou seja, quando não servem sexual, maternal, sensualmente, quando não produzem, não consomem e também quando criticam a injustiça do sistema são, de algum modo, eliminadas. Esse estado de coisas só será transformado se nos dirigirmos à produção de uma consciência feminista verdadeiramente radical. A consciência feminista não pode ser solipsista, universalista, ou individualista como é a consciência patriarcal. Desse modo, proponho que estejamos atentas à intimidade entre diálogo e feminismo na superação dos jogos vorazes da linguagem patriarcal, bélica e devoradora.

Contra o homolinguismo: o diálogo como metodologia feminista

Proponho tomar o diálogo como o operador feminista fundamental que permite estabelecer a ligação entre os diversos modos de pensar e fazer feministas preservando a singularidade das agentes e avançando na produção de novos elos e novas interações, facilitando, assim, a ascensão do sujeito feminista como agente de práticas libertadoras e transformadoras. Contudo, o diálogo não é um elemento externo ao feminismo ou algo alheio que deveríamos introduzir no feminismo. Ao contrário, ele é uma potência do feminismo em todos os tempos de sua história e fundamental na teoria de algumas pensadoras. Por isso, ao falar do que venho chamando de “feminismo dialógico” é preciso entrar em contato com as camadas arqueológicas do feminismo compreendendo que o próprio feminismo se constrói como um diálogo no tempo e no espaço, ou seja, na história e na geopolítica. O feminismo conecta uma pluralidade de mundos. Vamos buscar na arqueologia dessa questão alguns dos seus momentos importantes que, a meu ver, se situam no processo pelo qual se funda o próprio conhecimento: a ética, a política, o saber, e o diálogo.

Em um trecho chamado “A Conversação” de seu livro Metafísica da juventude[38], Walter Benjamin nos ajuda a pensar nas potências do diálogo ao fazer a seguinte pergunta: “Como conversavam Safo e suas amigas?”. Essa pergunta se constrói no contexto de um elogio do silêncio, algo que, na visão de Benjamin, as mulheres conheceriam muito melhor do que os homens. Não é possível entrar na complexidade do tema do silêncio nesse momento, mas gostaria de guardar apenas a oposição silêncio e diálogo que surge nessa pergunta. Enquanto os homens fazem a experiência da fala e dialogam, as mulheres fazem a experiência do silêncio. Contudo, o silêncio também é parte do diálogo. Enquanto um participante fala, o outro escuta e essa é uma relação dialética. O que nos importa, no entanto, é o movimento que Benjamin realiza com sua pergunta. Esse texto de Benjamin nos serve de alegoria metodológica do que se produz em termos de um potencial e processual feminismo dialógico. Benjamin evoca Safo distante das conversas socrático-platônicas e desloca a atenção sobre o diálogo socrático para o desconhecido, complexo, e misterioso diálogo entre as mulheres.

A reflexão de Benjamin nos levaria a outras questões, mas o que nos importa, agora, é a sua pergunta. Ela nos permite comparar dois mundos: o masculino “falogocêntrico”[39], com seu domínio sobre a produção narrativa, e, por consequência, a vasta historiografia que lota bibliotecas e livrarias nas quais a biografia dos homens, seus cânones auto honoríficos em literatura e filosofia, e suas teorias constantemente misóginas são guardadas como documentos de cultura. Parafraseando Benjamin, para quem “nunca houve um documento de cultura que não fosse também um documento de barbárie” (1994), podemos dizer que “todo documento de cultura é, ao mesmo tempo, um documento patriarcal”. O patriarcado é análogo à barbárie.

O lugar do qual Benjamin parte é Platão e seu eterno personagem Sócrates. Para esses filósofos que, de fato, inauguram alguma coisa de muito importante em termos de filosofia, o diálogo é a forma filosófica por excelência, mas é também uma forma discursiva e literária. A filosofia ocidental se organiza principalmente a partir dessa forma textual, ela mesma um questionamento da textualidade e um apontamento para o que a transcende. Platão é o autor de uma formulação dialética fundamental: escrever para mostrar que é preciso ir além da escrita. O diálogo implica essa potência.

O diálogo é o pano de fundo de toda textualidade filosófica e literária das quais as mulheres sempre estiveram excluídas. É isso o que se pode ver em um diálogo como O Banquete[40], justamente na cena em que as mulheres devem se retirar para que a conversa filosófica tivesse lugar. É verdade que Platão coloca na conta de Diotima, uma outra mulher, a autoria do conceito fundamental do diálogo, a saber, o amor. Mas para compreender por que Diotima é autora de uma ideia tão importante, reconhecida por Sócrates, não se pode esquecer a simetria entre os dois modos de ser “mulher” no diálogo diante da “homossexualidade” como presença masculina em jogo na cena. O termo homossexualidade aqui, não se refere apenas aos jogos amorosos ou sexuais que possa haver entre os participantes, todos homens, interessados no tema do “eros”, que se traduz por amor, mas de uma “hegemonia” do sexo masculino que deve excluir os corpos femininos em sua presença física enquanto mantém uma presença metafísica, por assim dizer, ou idealizada: a de Diotima. Diotima não é uma flautista ou serviçal: ela é uma sacerdotisa e não está presente no local como estão as mulheres flautistas que se devem retirar.

Sócrates fala de Diotima através de uma memória e eliminando o problema de ter que bani-la da sala caso ela estivesse fisicamente presente. Não é difícil ver que o interesse de Platão está na alteridade idealizada e incorporal da sacerdotisa e não nas mulheres corporais e presentes que devem ser afastadas. Diotima está além do espaço físico e sua própria condição a define como a imagem conceitual. Sua presença na cena a coloca como imagem de uma mediação para o conceito de Eros. Diotima é o “não-presente” que é aceita por oposição àquelas que, estando presente, são banidas e que, se continuassem presentes, seriam tratadas como “intrusas”. A presença dos corpos femininos é indesejável e a permanência de uma mulher na esfera do não-corporal, imaterial, e ideal seria o desejável. O sentido de Diotima no diálogo tem mais a função de colocar em cena a diferença em relação aos corpos implicados na homossexualidade, seja ela uma prática ou uma construção simbólica de mundo e do que colocar politicamente algo como o “feminino” em cena[p1] . Nesse sentido, os limites do diálogo platônico são os limites dessa linguagem construída em um mundo ou sistema simbólico homossexual. O diálogo entre os homens tem algo de “monólogo” ou de “homogêneo”. Platão sabe que a diferença precisa ser demarcada para que o homolinguismo seja superado, mas o personagem Sócrates não garante isso.

Para os fins desse texto, podemos agora trazer a cena os conceitos de dialogicidade e de polifonia e a “multiplicidade de vozes e consciências independentes” que encontramos em Bakhtin[41]. Eles nos ajudam a pensar o feminismo como uma anti-monologia. Ou seja, mais vale buscar no feminismo a multiplicidade de visões, de questões, e, sobretudo, de singularidades que se expressam construindo o seu campo de ação do que uma visão unitária – homossexual e homofônica como vemos em Platão sob a qual devem se encaixar os discursos, as teorias, e as práticas feministas. A visão unitária remete a um padrão e às ideias de patamar e de “regra”. O feminismo não é uma “regula[42] sob a qual surge um “inferior” e a partir da qual surge o sujeito como um demônio incarnado. Ao contrário, o feminismo é um “aberto” diante da regula do patriarcado a ser superado.

Infelizmente, ainda é bastante desconhecido do público um livro de Cristine de Pizan chamado Cidade das mulheres, publicado pela primeira vez em 1405[43]. Podemos dizer que Cristine é uma feminista, mesmo que esse termo ainda não existisse naquela época. Aliás, a própria Cristine não é muito conhecida do grande público acostumado ao cânone patriarcal que define os textos a serem lidos e considerados como sendo importantes. Cristine, que foi uma mulher emancipada econômica e intelectualmente e bastante diferente para seu tempo, elabora no livro citado um diálogo entre ela e algumas personagens tendo como foco uma crítica da sociedade misógina. Naquela época, a consciência da misoginia foi o mesmo que a consciência do obscurantismo foi para o Iluminismo.

Em A Cidade das mulheres, Cristine construirá um diálogo muito criativo e rico no qual intercalará vozes de três figuras femininas que são personificações de virtudes: a “Senhora Razão”, a “Senhora Retidão”, e a “Senhora Justiça”, que se apresentam como aparições fantásticas. Não é um exagero dizer que o discurso dessas “mulheres”, na forma de aparições mágicas, mostra as “virtudes” gerais que elas personificam como virtudes tipicamente feministas. O diálogo é uma apologia das mulheres: seja porque as personagens são apresentadas como imagens de mulheres empoderadas como vozes potentes, seja por estarem em defesa de altos valores e na crítica daqueles que negam o valor das mulheres. Essa apologia se torna ainda mais radical quando essas vozes deixam claro que o projeto de construção de uma “Cidade das Mulheres” que elas têm em mente só poderá ser construída por uma mulher que seria um ser capaz de um ato tão grandioso e, ao mesmo tempo, um ser tão modesto.           

A Cidade das mulheres é uma obra de crítica ao patriarcado e de crítica à misoginia. Cristine visa mostrar seu estarrecimento diante do discurso dos homens, das contradições que eles cometem, e dos seus erros em relação às mulheres sem perder de vista o compromisso ético e político do seu projeto intelectual. Nesse sentido, podemos dizer que o diálogo de Cristine não é apenas uma forma literária ou filosófica, mas está no cerne de um projeto a ser construído com a participação de outras mulheres.

Vou reconstituir brevemente os pontos do texto que podem ser úteis na fundamentação do feminismo dialógico que buscamos aqui.

Cristine está em seu gabinete a estudar e lhe cai nas mãos um texto de um tal Mateolo que ela resolve ler para divertir-se. Logo desiste, pois o texto não merece muita dedicação. Porém, ao ler as maldades e bobagens de Mateolo, ela percebe que discursos como o seu são muito comuns em textos sérios. Ela começa a se perguntar sobre discursos imaginando que tais filósofos e pensadores incríveis devem ter razão acerca do que dizem sobre as mulheres. Cristine está já pensando se Deus teria cometido um grande erro ao criar a mulher e está apavorada por ele a ter colocado em um corpo feminino. Então, a primeira aparição se faz ver.

O primeiro pronunciamento se dá no momento em que Cristine está duvidando de si mesma. A primeira mulher é a “Senhora Razão”. Ela chama a atenção de Cristine para sua própria consciência e a sua capacidade de discernir o certo do errado e analisa a habitual misoginia (sem usar essa palavra) dos homens. A Senhora Razão fará Cristine ver que a postura correta contra ofensas e injustiças não é a de se deixar levar pelos discursos carregados de más intenções dos homens. A difamação contra as mulheres é parte da história humana e depõe contra seus autores. As mulheres não se devem deixar atingir, afirma a dona da palavra. No momento da aparição, Cristine está sendo atingida moral e intelectualmente pelo discurso misógino. Tomada por uma falácia de autoridade, afinal são os grandes filósofos que dizem mal das mulheres e ela se questiona se ela mesma não estará errada. A Senhora Razão segue a apresentar seus argumentos a Cristine quem, segundo ela, precisa superar essa má influência que só a entristece. A aparição explica-lhe que está ali para ajudá-la e ajudar as mulheres frente a uma guerra sem defesa na qual elas se veem desamparadas. É então que esta imagem de mulher lhe anuncia a construção de um edifício do qual Cristine será a autora. Ela fala de uma cidade indestrutível, apesar de todos os ataques que ela vai sofrer. Além de tudo, ela nos diz que será uma cidade mais forte que o império das Amazonas.

A segunda mulher a falar-lhe é a Retidão”, que lhe apresenta o apoio moral e ético e lhe fala da bondade, do bem comum, da defesa da verdade, e do obstáculo aos perversos que ela vem a ser. A terceira é a Justiça”, que explica como habita no céu, na terra, no inferno, e fala da complexidade de seu dever de dar a cada um o que lhe é devido. É a Justiça que lhe explica o trabalho conjunto que ela realiza com as companheiras: as virtudes da Razão e da Retidão. Sua tarefa, na cidade de Cristina, é justamente concluir a cidade. Cristine responde com uma típica autocrítica relativa a seus limites, mas aceita com alegria e coragem a proposta que lhe é feita.

A estrutura do texto é alegórica. As três aparições são personificações de virtudes e portam objetos: um espelho, um bastão, e um cálice com seus significados próprios relacionados às virtudes. Na sequência, Cristine vai conversando com as aparições, tirando suas dúvidas, e obtendo respostas bastante desconstrutivas do patriarcado considerando a época e, sobretudo, quando percebemos que tais colocações ainda têm validade cultural hoje. Infelizmente, os tempos atuais guardam certas características insuperadas dos tempos passados. Os textos de Cristine inscrevem-se na tradição dos specula e exempla dedicando-se à defesa das mulheres como seres de direitos como fazemos ainda hoje.

Na sequência do texto, Cristine continua seu diálogo com as aparições levantando questões mais teóricas e são apresentados vários exemplos de personagens femininas todas consideradas importantes na construção da cidade das mulheres. Destaca-se um embate contra a misoginia, o puro preconceito contra as mulheres, e uma defesa da educação para as mulheres. Cristine é a primeira mulher a desconstruir de maneira sistemática a visão dos homens sobre esses seres marcados por preconceitos.

A posição de Cristine e seus textos já colocam o feminismo, embora na fase histórica em que ele ainda não havia sido nomeado, como uma postura crítica e analítica que visa modificar condições sociais injustas produzidas a partir do operador de gênero. O método de Cristine, tanto como forma, mas também como impulso político do texto, foi o diálogo. Em Cristine, o diálogo é uma forma, mas também uma busca por fundamentação. Com sua reflexão, ela mostra o papel político do texto para as mulheres e para a cultura que deseja superar o machismo, o sexismo, e todas as opressões patriarcais.

Conclusão: feminismo como forma dialógica

O feminismo continua carregando o mal-estar de sua origem e essa marca de uma anomalia original. Não há feminista que não seja vista com olhos feios, marcada pelos outros como uma pessoa degenerada e, dependendo do contexto, como uma figura que assume uma perspectiva monstruosa, a figura da mulher “desnaturada”, contra a natureza. O horror que o feminismo causa é proporcional à sua força. A potência de desmascaramento e desmontagem do patriarcado é o que ele carrega no seu simples nome.

O feminismo sempre foi uma fala inadequada porque ele é uma fala de mulheres de todas as formas e tipos bem como de seres que escapam às heterodenominações do patriarcado. Essa é a sua anomalia, a sua monstruosidade, e o seu “mal” perante a língua patriarcal. Diante do discurso patriarcal, ele mesmo uma ideologia e um fundamentalismo, o feminismo é uma forma dialógica e uma nova episteme.

A história do feminismo é a história da luta contra a opressão epistemológica administrada pela misoginia enquanto prática astuciosa da razão patriarcal. A misoginia tem história e ela se confunde com a história da filosofia e da literatura. É a história de um discurso e de uma racionalidade. É a misoginia, ao mesmo tempo, que está na origem da palavra feminismo. O embate do feminismo é também o de ressignificar corpos e palavras subjugados por uma ordem injusta que se sustenta pela produção de um discurso de violência. A astúcia é sempre uma forma deturpada da razão. No patriarcado ela se expressa por meio da formulação linguística básica que é a misoginia. A misoginia é a própria astúcia da razão patriarcal.

Não existiria patriarcado sem misoginia. Sua astúcia consiste em escamotear a covardia inerente ao raciocínio machista que pensa que todos serão eternamente idiotas para não ver a verdade. É desse modo que se cria o termo “bruxa” que, ontem como hoje, tem a mesma função e produz esse efeito de vilipêndio contra mulheres, contra feministas, e contra quem possa perturbar a ordem da heterossexualidade compulsória.

Seja imaginária, simbólica, ou física, a violência é o destino das mulheres e de todos os seres inadequados à heteronormatividade traçada pelo patriarcado. Nunca houve nada mais eficaz nos processos de subjugação e por isso podemos dizer que não é apenas o poder que é um dispositivo, mas que a violência é um dispositivo quando se trata de mulheres. E, mais que isso, ela é método que foi introjetado na forma de pensar e de sentir dos sujeitos envolvidos.

Contra discurso patriarcal, o diálogo feminista é o caminho da libertação.

Bio Marcia Tiburi: é professora da Universidade Paris 8 ligada aos departamentos de filosofia e de artes. Bolsista do Programa Pause e do Artists Protection Fund do Instituto of Internactional Education (IIE). Escreveu diversos livros de filosofia:As mulheres e a filosofia (São Leopoldo, Unisinos, 2005),com Magali Menezes e Edla Eggert); Mulheres, filosofia ou coisas do gênero (São Leopoldo, Unisinos, 2008),com Bárbara Valle; Filosofia: machismos e feminismos (Universidade Federal de Santa Catarina, 2014),com Maria de Lourdes Borges); Feminismo em comum (Rio de Janeiro, Record, 2018); Il contrario della solitudine– Manifesto per un feminismo in comune (2020); Como conversar com um fascista (Rio de Janeiro, Record, 2015); Ridículo político – sobre o risível, a manipulação das massas e o esteticamente correto (Rio de Janeiro, Record, 2017); Delírio do poder – psicopoder e loucura coletiva na era da desinformação (Rio de Janeiro, Record, 2019); Como derrotar o turbo-tecno-macho-nazifascismo (Rio de Janeiro, Record, 2020); Complexo de vira-lata: análise da humilhação colonial (Rio de Janeiro, Record, 2021), entre outros. Escreveu seis romances indicados a diversos prêmios, além de artigos acadêmicos, artigos de revistas e jornais.


[1] Kay Schaffer, Scare words: ‘Feminism’, postmodern consumer culture and the media”, Continuum Journal of Media & Cultural Studies 12, no. 3 (1998): 321-334, https://doi.org/10.1080/10304319809365775.

[2] Howard Bloch, Misoginia medieval e a invenção do amor romântico ocidental, trad. Cláudia Moraes (Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995).

[3] Nancy Levit, “The F Word: Feminism and Its Detractors”, The Gender Line Book Subtitle: Men, Women, and the Law (New York: NYU Press, 1998), https://www.jstor.org/stable/j.ctt9qgdv7.8.

[4] Teresa De Laurentis, “A tecnologia de gênero, Tendências e impasses: o feminismo como crítica cultural, org. Heloisa Buarque de Holanda (Rio de Janeiro: Rocco, 1994), 206-242.

[5] Joana Plaza Pinto, “Performatividade radical: ato de fala ou ato de corpo, Revista Gênero 3, no. 1(2002), doi: https://doi.org/10.22409/rg.v3i1.260, https://periodicos.uff.br/revistagenero/article/view/31046/18135.

[6] Marcia Tiburi, Delírio do poder. psicopoder e loucura coletiva na era da desinformação (Rio de Janeiro: Record, 2019).

[7] Feminazi é uma expressão que mistura as palavras “feminista” e “nazista” e que foi popularizada por um radialista americano chamado Rush Limbaugh nos EUA. No Brasil, é utilizada pela extrema-direita. Algumas feministas a utilizam em tom de brincadeira.

[8] Angela Davis, Mulheres, raça e classe, trad. Heci Regina Candiani (São Paulo: Boitempo, 2016); Sueli Carneiro, Enegrecer o feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero”, https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/375003/mod_resource/content/0/Carneiro_Feminismo%20negro.pdf; Portal Geledés. “‘Enegrecer o feminismo: movimentos de mulheres negras no Brasil, http://www.geledes.org.br/enegrecer-o-feminismomovimentosdemulheresnegrasnobrasil/.

[9] Marcia Tiburi, Feminismo em comum: para todas, todes e todos (Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 2018).

[10] Simone Beauvoir, O Segundo Sexo (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009), https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151028_simone_beauvoir_wikipedia_en em_rb

[11] Claudio Díaz, Vermeer o la mujer, naturaleza morta (Málaga: Universidad de Málaga, 2001), 119-121. O texto mostra como Vermeer retrata a mulher como “objet de luxe e rodeada de fetiches como frutas, livros, objetos pessoais, coisas. Nos diz Díaz, a mulher é “natureza morta de mulher, natureza detida, apreendida de mulher”. Buscando firmar sua tese em torno da questão de um olhar masculino, por trás do qual está um pensamento masculino cuja característica principal é a objetificação, Díaz tenta compreender o interesse barroco pela natureza morta e a permissão que havia para que as mulheres impossibilitadas de se construírem como pintoras de grandes temas pudessem pintar os “pequenos, sendo que ela mesma seria o pequeno objeto da pequena pintura de gênero. Díaz nos lembra que “a natureza morta não significa a representação de algo morto, mas o contrário”.

[12] Theodor Adorno e Max Horkheimer, Dialética do esclarecimento (Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985); Silvia Federici, Calibã e a bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva, trad. Coletivo Sycorax (São Paulo: Editora Elefante, 2017), http://coletivosycorax.org/wp-content/uploads/2019/09/CALIBA_E_A_BRUXA_WEB-1.pdf. O que estou chamando de negativo diz respeito ao que está fora do poder e que está sujeito, portanto, à violência, sendo o poder essa teia que captura os corpos e que “humilha a carne pelo poder”. É o capitalismo/patriarcado que, na visão de Federici, destruiu e sempre destruirá a figura da mulher desobediente, sublevada, e livre. A palavra latina mulier, por sua vez, vem de mulet, mula: em todas as línguas Latinas, seu significado é pejorativo.

[13]  Volkmar Sigusch. The Neosexual Revolution, Archives of Sexual Behavior 27 (1998): 331–359, doi:10.1023/A:1018715525493.

[14] Geneviève Fraise, Musa de la razón: la democracia excluyente y la diferencia de los sexos, trad. Alicia Puelo (Madri: Alinéa, 1989).Segundo Geneviève Fraise, teria sido um homem, o filho de Alexandre Dumas, a usar o termo “feminista” pela primeira vez, e de modo depreciativo, para designar uma anomalia que deixaria os corpos masculinos “afeminados”. Era o século XIX e as teorias sobre a natureza humana ainda tinham muita força. Até hoje não podemos dizer que essas teorias tenham desaparecido à medida que o machismo perde sua força sem elas.

[15] Michel Foucault, L’ordre du discours: leçon inaugurale au Collège de France prononcée le 2 décembre 1970 (Paris: Gallimard, 1971); Gayatri Spivak, Pode o subalterno falar? (Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010); Linda Alcoff, “The Problem of Speaking for Others”, Cultural Critique 20 (Winter 1991): 5-32; Judith Butler, Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade, trad. Renato Aguiar (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003). O feminismo vem demolindo muros epistemológicos. Daí a questão de quem pode falar e do que alguém pode falar que, de Michel Foucault a Gayatri Spivak e Linda Alcoff, se tornou fundamental. É nesse sentido que podemos dizer que feminismo é um dos seus primeiros e graves “problemas de gênero”, para parafrasear o título do livro de Judith Butler.

[16] Marcia Tiburi, The Functionality of Gender Ideology in the Brazilian Political and Economics Context, In Spite of You: Bolsonaro and the New Brazilian Resistance, ed. Conor Foley (New York/ London: Ok Books, 2018), https://nuso.org/articulo/funcionalidadedaideologiadegeneronocontextopoliticoeeconomicobrasileiro/.

[17] Teresa De Laurentis, “A tecnologia de gênero”.

[18] Toni Reis e Edla Eggert, Ideologia de gênero: uma falácia construída sobre os planos de educação brasileiros, Educ. Soc. 38, no. 138 (2017), 9-26, https://doi.org/10.1590/es0101-73302017165522.

[19] Uta Ranke-Heinemann, Eunucos pelo reino de Deus: mulheres, sexualidade e a Igreja Católica (Rio de Janeiro: Roda dos Tempos, 1996), 368.Não é por acaso que retornam ao centros dos interesses teorias ultrapassadas como o terraplanismo. A historiadora do cristianismo Uta Ranke Heinemann nos lembrou, há trinta anos, que a igreja que conseguiu liberar o planeta Terra e o Sol de suas teorias sem sentido não conseguiu liberar o corpo de uma mulher da falsa doutrina da concepção virginal e, acrescentou, que Maria seguia sendo usada para violar tanto a inteligência humana quanto a própria fé cristã. Hoje, precisamos levar a sério que nem mesmo a questão da terra ser redonda foi superada. Ao contrário, ela retorna com a onda obscurantista que acontece ao mesmo tempo em que fascismos avançam junto a toda sorte de violência de gênero.

[20] Gayle Rubin, Políticas do Sexo, trad. Jamille Pinheiro Dias (São Paulo: Ubu, 2017).

[21] Joan Wallach Scott, “Gênero: uma categoria útil de análise histórica”, Educação & Realidade 20, no. 2 (Julho/Dezembro 1995), 71-99, https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/1210/scott_gender2.pdf.

[22] http://www.jb.com.br/pais/noticias/2017/11/10/filosofa-americana-judith-butler-e-alvo-de-protestos-no-aeroporto-de-congonhas/; “Judith Butler: ‘O ataque ao gênero emerge do medo das mudanças’”, Carta Capital, 6 de novembro de 2017, verificada em 12 de abril de 2018, https://www.cartacapital.com.br/diversidade/judith-butler-o-ataque-ao-genero-emerge-do-medo-das-mudancas.

[23] Oscar Alzamora Revoredo, “La ideología de género: sus peligros y alcances” (apresentado na Conferência Episcopal Peruana, Lima, Abril de 1998), https://www.aciprensa.com/controversias/genero.htm

[24] Peter Haidu, The Subject Medieval/Modern: Text and Governance in the Middle Age (Stanford: Stanford University Press, 2003).

[25] Theodor Adorno, Negative Dialektik. Jargon der Eigentlichkeit: Gesammelte Schriften in 20 Bänden, Band 6: 1706 (Frankfurt: Suhrkamp Verlag AG, 2003).

[26] Tzvetan Todorov, A conquista da América: a questão do outro, trad. Beatriz Perrone-Moisés,edição (São Paulo: Martins Fontes, 2003).

[27] Silvia Federici, Calibã e a bruxa.

[28] Cristóbal Colón, Relaciones y cartas de Cristóbal Colón (Madri: Librearia de Hernandoy Cº, 1892), 23. Guanahani é a ilha que ele vem batizar como “San Salvador”, conforme descreve em sua Carta aos Reis em 11 de outubro de 1492.

[29] Howard Bloch, Misoginia medieval.  

[30] Vandana Shiva, Monocultures of the Mind: Perspectives on Biodiversity (Nova Delhi: Natraj Publishers, 2011); Carolyne Merchant, The Death of Nature: Women, Ecology and Scientific Revolution (New York: Harper & Row, 1990). A cultura antiecológica que nos trouxe à iminência de uma catástrofe planetária relaciona-se diretamente com o ódio à natureza, às mulheres, e à ciência moderna, bem como aos seus efeitos tardios como a destrutiva “Revolução Verde” contra a qual feministas como Vandana Shiva vem lutando há muito tempo.

[31] Marcia Tiburi, Ofélia morta do discurso à imagem”, Estudos Feministas 18, no. 2 (maio-agosto 2010): 352; Cristiani Nobre de Arruda, Andrea Stopglia Guedes Braide, e Marilyn Nations, “‘Carne crua e torrada’: a experiência do sofrimento de ser queimada em mulheres nordestinas, Brasil”, Cad. Saúde Pública 30, no. 10 (outubro 2014). Para muitas mulheres, a queima em fogueiras virtuais nos contextos de redes sociais e internet se tornou comum. Porém, para muitas, a morte nas fogueiras, infelizmente, é mais do que simbólica. Não é por acaso que a “queima” de mulheres tenha se tornado uma prática constante em diversos territórios do mundo onde feminicídios acontecem.

[32] Nicole Loraux, Maneiras trágicas de matar uma mulher: imaginário da Grécia antiga (Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988).

[33] Tzvetan Todorov, A conquista da América: a questão do outro, trad. Beatriz Perrone-Moisés,edição (São Paulo: Martins Fontes, 2003), 38.

[34] Marcia Tiburi, Complexo de vira-lata: análise da humilhação colonial (Rio de Janeiro: Record, 2021).

[35] Glória Anzaldua, Como domar uma língua selvagem”, trad. Joana Plaza Pinto, Karla Cristina dos Santos, Viviane Veras, Caderno de Letras da UFF 39 (2009): 297-309, http://www.campogrande.ms.gov.br/semu/wp-content/uploads/sites/26/2019/10/15-anzaldua%C2%A6%C3%BC_como-domar-uma-lingua-selvagem.pdf

[36] É nesse sentido que, de Spinoza a Nietzsche, de Adorno a Foucault, encontramos diversas discussões sobre os enlaces entre poder e corpo. As teorias feministas (da filosofia à antropologia), contudo, dão ênfase aos tópicos de gênero e raça. No entanto, o que produzem é um desmascaramento do sistema que vem a ser combatido pelo próprio sistema que perde ao ser desmascarado.

[37] Suzanne Collins, The Hunger Games (New York: Scholastic, 2008); Gary Ross, dir., The Hunger Games (Lionsgate, 2012).

[38] Walter Benjamin, Walter Benjamin: Selected Writings, 1: 1913–1926, (Cambridge: Harvard, 2002).

[39] Jacques Derrida, La carte postale: de Socrate à Freud et au-delà. (Paris: Flammarion, 1980).

[40] Platão, O Banquete,trad. José Cavalcante de Souza (Brasil: Ed. 34, 2016).

[41] Mikhail Bakhtin, Problemas da poética de Dostoiévski, trad. Paulo Bezerra (Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2013).

[42] Peter Haidu, The Subject Medieval/Modern.

[43] Luciana Eleonora de Freitas Calado, A cidade das damas: a construção da memória feminina no imaginário do imaginário utópico de Cristine de Pizan, PhD diss., Universidade Federal de Pernambuco, 2006.


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