O Julho das Pretas surgiu em 2013, a partir do diálogo entre o Instituto Odara e mulheres negras de Salvador, Feira de Santana, cidades do Baixo Sul e do Recôncavo. Valdecir Nascimento, coordenadora executiva do Odara, afirmou na ocasião que é necessário “fortalecer e ampliar parcerias, dar visibilidade à luta, às ações, promover e valorizar o debate e a identidade da mulher brasileira”. Este mês foi escolhido porque no dia 25 de julho se comemora o Dia Internacional da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha e, para o Instituto Odara, seria estratégico construir uma agenda comum de intervenção do movimento de mulheres negras da Bahia, ação essa que acabou se espalhando para o Brasil afora.
Na época em que foi criado, a agenda de intervenções buscou marcar oficialmente a consolidação do julho como o mês de referência da luta das mulheres negras. Dois anos depois, dentre as diferentes ações realizadas no mês foi priorizado a construção e produção da Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo e Pelo Bem Viver que aconteceria em 18 de novembro de 2015. Reunindo cerca de 50 mil mulheres negras de todo o Brasil, na capital federal, foi um marco na luta contra o racismo.
Em 2021, 6 anos após a Marcha, o Instituto Odara publicou artigo com a reflexão: “Para onde marchamos?”. Nele, elas lembram que a ideia de realizar uma Marcha foi de Nilma Bentes, ativista do Cedenpa – Centro de Estudo e Defesa do Negro do Pará, que desde 2011, durante o Afro XXI – Encontro Ibero-americano do Ano Internacional dos Afrodescendentes, em Salvador, havia proposto essa estratégia. Logo mais, em 2013, durante a III Conapir – Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial, foi lançado o Comitê Impulsor Nacional da Marcha, formado pelas seguintes instituições: (i) AMNB – Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras, (ii) APNs – Agentes de Pastoral Negros, (iii) Conaq – Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas, (iv) Conen – Coordenação Nacional de Entidades Negras, (v) Fenatrad – Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, (vi) FNMN – Fórum Nacional de Mulheres Negras (vii) MNU – Movimento Negro Unificado, e (viii) Unegro – União de Negros e Negras pela Igualdade. Assim, militantes negras de todo o país fizeram da Marcha uma denúncia unificada das diversas opressões vividas pelo povo negro no Brasil, especialmente mulheres negras.
Segundo a Pnad – Pesquisa Nacional de Domicílios do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, mulheres negras ocupam aproximadamente 2% das cadeiras do Congresso Nacional e 1% das cadeiras na Câmara dos Deputados, o que representa uma crise política institucional, considerando que mulheres negras são o maior grupo populacional – 60,6 milhões de mulheres, sendo 10,3 milhões de mulheres pretas e 49,3 milhões de mulheres pardas, correspondendo juntas 28% da população nacional. Ainda assim, a representação das mulheres negras nos espaços de decisão é ínfima, evidenciando que essa disparidade está sustentada pelo preconceito e racismo estrutural existente na sociedade brasileira.
Ainda assim, mesmo que haja muitas barreiras a serem rompidas, que continua baixa a representação institucional de mulheres negras, elas têm resistido e se organizado para atingir esses espaços, furar a bolha dos partidos e propor políticas públicas relevantes para a comunidade negra, pautando projetos que dialogam com a garantia de moradia, acesso à saúde, diversidade religiosa, combate ao racismo, ao machismo, à gordofobia e LGBTQIAfobia e promoção de melhores condições de vida para todas/os/es.
Texto escrito por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.
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REFERÊNCIAS:
- Sites:
Julho das Pretas: Proposta de uma agenda negra e feminista para a Bahia. 2013. Disponível em: Agenda-Julho-das-Pretas_2013.pdf (institutoodara.org.br). Acesso em 29 jun 2024.
Odara promove “Julho das Pretas” em homenagem às mulheres negras. Fundo Brasil de Direitos Humanos: 16 de julho de 2013. Disponível em: Odara promove “Julho das Pretas” em homenagem às mulheres negras – Fundo Brasil. Acesso em 29 jun 2024.
Seis anos da Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver: Para onde marchamos? Odara – Instituto da Mulher Negra: 11 de outubro de 2022. Disponível em: Odara – Seis anos da Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver: Para onde marchamos? (institutoodara.org.br). Acesso em 29 jun 2024.
Criado em 25 de julho de 1992, durante o I Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, em Santo Domingo, República Dominicana, a data é o marco inicial da luta e resistência da mulher negra. Deste então, a sociedade civil tem atuado para consolidar e dar visibilidade ao dia, levando em consideração condição de opressão de gênero e racial/étnica que vivem estas mulheres.
Algumas pessoas que me abordam eu digo o que realmente penso, sobre ter sido a propositora da Marcha: certamente fui escolhida para ser um canal de comunicação. Propor não significa realizar, efetivar e muitíssimas pessoas fizeram a Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver acontecer do jeito que aconteceu: lindíssima! O nosso livro-relatório (do Pará), mostra um pouco do que foi, do nosso ponto de vista, o processo de construção da Marcha 2015.