Considerada líder de rebelião na Bahia
Não se sabe ao certo o local onde Luísa nasceu, pois há dúvidas se ela veio da África, como escravizada, para a Bahia, ou se já nasceu livre em Salvador. A ausência de registros documentais que possam atestar sua trajetória tem provocado muitas polêmicas e interpretações a respeito de sua existência. No entanto, ficou consagrada como a líder da Revolta dos Malês, de 1835, e muito acolhida pelo movimento negro que a consideram referência e presença marcante da mulher negra na história do Brasil, que bravamente resistiu e lutou contra as barbáries da escravidão.
Através de uma carta do seu filho, o líder abolicionista Luiz Gama, que ao escrever sua autobiografia, em 1880, encaminhada ao jornalista Lúcio Mendonça, e o poema Minha Mãe, em 1861, foi possível a construção da biografia de Luiza Mahin.
Luísa Mahin era da nação nagô-Jeje, da tribo Mahi, e dizia ter sido princesa na África. Luísa sempre negou o batismo e manteve suas tradições africanas acima das doutrinas cristãs. Sua casa foi um quartel-general dos levantes escravos que abalaram a Bahia nas primeiras três décadas do século XIX. Na revolta de 1830, Luísa estava grávida de Luís Gama, filho de um português, que se tornou poeta, um dos maiores abolicionistas do Brasil e detentor da memória de sua mãe. Luísa participou da organização da Revolta dos Malês, como ficou conhecida a maior rebelião de escravizados ocorrida na Bahia do século XIX.
O levante foi liderado por escravizados africanos de religião muçulmana, os malês, e aconteceu durante a noite de 24 para 25 de janeiro de 1835. Aproveitando-se de seu trabalho como quituteira, Luísa despachava mensagens escritas em árabe para outros rebelados por meio de meninos que simulavam a compra de suas comidas para levar estes bilhetes. No entanto, os planos da revolta foram contados às forças de repressão. Os líderes foram perseguidos e castigados brutalmente. Luísa conseguiu fugir para o Rio de Janeiro, onde continuou a luta pela liberdade de seu povo. Nessa cidade foi presa e, possivelmente, deportada para a África.
Luís Gama escreveu: “Sou filho natural de negra africana, livre, da nação nagô, de nome Luísa Mahin, pagã, que sempre recusou o batismo e a doutrina cristã. Minha mãe era baixa, magra, bonita, a cor de um preto retinto, sem lustro, os dentes eram alvíssimos, como a neve. Altiva, generosa, sofrida e vingativa. Era quitandeira e laboriosa”. Outros versos do poeta indicam que Luísa Mahin teve mais um filho, porém não há registros a seu respeito.
Embora, muitas versões sobre a existência e os caminhos de Luiza Mahin tenham sido escritos, somente na década de 1980, o nome dela tornou-se referência para o movimento feminista negro, após a publicação da cartilha A Mulher Negra tem História de Alzira Rufino, Maria Rosa Pereira e Nilza Iraci (1987) e, desde então muitas homenagens tem sido feitas para preservar e dissiminar a presença e importância da chamada “Rainha da Bahia Rebelde”.
Em 1985, o Coletivo de Mulheres Negras de São Paulo iniciou um movimento para que seu nome fosse dado a uma praça em Cruz das Almas, bairro da capital paulista. Além da praça, o nome de Luísa Mahin também está presente em ruas do Rio de Janeiro e de Curitiba e em instituições como a Escola Estadual Luiza Mahin (localizada em Salvador) e o Centro Educacional Luiza Mahin (local onde jovens mulheres cumprem medidas socioeducativas no Rio de Janeiro).
Uma iniciativa inédita, em 2019, foi o projeto de Lei aprovado pela da Câmara dos Deputados (Lei nº 13.816) que inscreveu o nome de Luísa Mahin no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, depositado no Panteão da Pátria e Liberdade Tancredo Neves, em Brasília
Luiza também teve seu nome cantado em verso e samba no Carnaval de 2018 pela Escola Alegria da Zona Sul, do Rio de Janeiro, com o enredo “Bravos Malês! A Saga de Luísa Mahin”. No ano seguinte, foi a vez da Escola Estação Primeira da Mangueira conquistar o primeiro lugar com o enredo “História para ninar gente grande”, onde Luiza é uma das pessoas citadas como heroína histórica. O enredo teve inspiração no livro ficcional de Ana Maria Gonçalves, chamado “Um defeito de cor”, que narra a história de Kehinde, também conhecida como Luísa Mahin, desde seu sequestro ainda menina do Reino de Daomé, atual Benin, passando pela árdua vida de uma escravizada até alcançar a liberdade, contando a história do Brasil a partir da perspectiva de uma mulher diaspórica negra e escravizada que resiste às opressões, rebela-se e articula-se brilhantemente para viver e traçar uma vida digna para si mesma e todos a sua volta.
Texto Adaptado do verbete contido no Dicionário Mulheres do Brasil por: Ana Laura Becker, Schuma Schumaher e Sofia Vieira.
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REFERÊNCIAS:
- Produções acadêmicas
GONÇALVES, Aline Najara da Silva. Luiza Mahin entre ficção e história. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Estudo de Linguagens (PPGEL) da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), 2010.
LISBOA, José Maria. Almanaque literário de São Paulo para o ano de 1881. São Paulo: Imesp; Daesp; IFGSP, 1982, Edição fac-similar. In: Ki-Zerbo, J (Org): História Geral da África; Metodologia e pré-história da África. São Paulo, Editora Ática/Paris: UNESCO, 1982, Vol. 1.
RUFINO, Alzira, PEREIRA, Rosa Maria, Iraci, Nilza. A Mulher Negra tem História. 1987.
SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Dicionário Mulheres do Brasil, de 1500 até a atualidade: biográfico e ilustrado. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.
SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Mulheres Negras do Brasil. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2007.
- Sites:
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