• Mãe Elda de Oxóssi (1939 – 2025)

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5 de junho de 2025 por 

Yalorixá, líder religiosa, política e cultural de Pernambuco, rainha do Maracatu Nação de Porto Rico

Elda Ivo Viana, nasceu em 06 de janeiro de 1939, no bairro de Mangabeira, Recife (PE), filha de Ocidalia Bandeira do Nascimento e Luiz Ivo Viana. Embora filha de pais evangélicos, tornou-se uma figura relevante do maracatu em Pernambuco. Como era comum na época, Elda Viana casou-se muito jovem com Enock José de Lira, também menor de idade, com quem teve sua primeira e única filha. Mais tarde, uniu-se a João Francisco Chacon, com quem teve mais quatro filhos, todos homens.

Elda se iniciou no candomblé ainda menor de idade e atuou por toda a vida como alfabetizadora, educadora e defensora das tradições afro-brasileiras. Por volta de 1958, Elda e família mudou-se para o Rio de Janeiro, onde viveram por alguns anos, antes de retornarem à Recife. Foi na sua terra natal que Elda construiu com seu corpo e sua palavra uma história de dignidade, liderança e espiritualidade enraizada nos fundamentos do candomblé e do maracatu-nação. Destaca-se sua atuação como conselheira comunitária, sendo referência para as mulheres de sua região. Segundo a Folha Pernambuco: “Em seu terreiro, não apenas ensinava os fundamentos do candomblé, mas também promovia ações educativas, rodas de diálogo e articulações para fortalecer a presença negra nos espaços públicos e culturais da cidade.”

Ao afirmar que “Maracatu é candomblé, é pra gente se desmanchar na avenida”, Rainha Elda desafia qualquer tentativa de dissociação entre cultura e religiosidade negra. Em sua fala, o tambor não é entretenimento: é invocação, é axé que vibra e ecoa saberes ancestrais. O baque virado, na batida do tambor e na cadência do cortejo, carrega os nomes dos orixás e reverencia os que vieram antes. Por isso, quando a rainha pisa na avenida, ela não apenas desfila — ela firma o pé no chão da memória e da luta.

Seu protagonismo não se limita ao figurino ou ao trono simbólico. Rainha Elda ocupa um espaço historicamente atravessado por contradições raciais e de gênero, ressignificando-o a partir de sua vivência e espiritualidade negra.

Sua trajetória, atravessando diferentes nações do candomblé — Umbanda, Nagô, Angola, Jeje — revela uma mulher em busca de si mesma por meio dos caminhos ancestrais. E sua realização espiritual se completa no Jeje, onde ela constrói há mais de quatro décadas uma casa de axé e cuidado, formando filhos e filhas de santo, muitos dos quais também filhos da luta, da arte e da periferia. Assim viveu a Rainha Elda da Nação do Maracatu Porto Rico, a memorável Yalorixá da Macaia de Oxossi. Neste sentido, podemos lembrar de entrevista de Elda para a página virtual da Nação Porto Rico: “Desde 17 anos de idade conheci a minha religiosidade e o candomblé […] primeiro conheci a Umbanda depois o Nagô, Angola e por último Jeje aonde eu me encontro realizada a mais de 43 anos. Sou a única rainha coroada dentro da Igreja de Nossa Senhora do Rosario dos Homens Pretos.”

Ser mulher preta, Yalorixá e rainha de maracatu é, em si, um ato de resistência. Num país onde o racismo religioso ainda queima terreiros, onde a mulher negra é a base da sociedade, mas raramente reconhecida como tal, Rainha Elda ensinou por décadas, com sua voz firme e seu olhar maternal, que espiritualidade, cultura e política são inseparáveis. Perguntada sobre o que é profano e o que é religioso, Mãe Elda ensinou: “Profano não sei o que é isso não, agora religioso é quando os bombos bate, dá um arrepio no corpo e aquela coisa na alma. Isso é maracatu. E de baque virado viu fia? Você já viu aquele toque, e cantando nagô, nagô.”

Rainha Elda nunca aceitou o esvaziamento do maracatu. Quando critica os carros alegóricos, a estética carnavalesca importada das escolas de samba, ela está defendendo a essência do maracatu como território de axé, e não de espetáculo vazio. Ela clama pelo retorno ao sagrado, ao toque que arrepia e à palavra que ensina. Sua crítica é uma denúncia à mercantilização da cultura negra, que busca apagar seus fundamentos para vendê-la como folclore. Buscando trazer luz à história negra e brasileira, Yalorixá Elda compartilhou em entrevista sobre como era o maracatu em sua juventude: “Quando cheguei na avenida, em 1990, criança era proibida de desfilar, só tinha idosos, com as saias compridas, chitão, cobrindo os pés… Lembro de seu Luiz Mãozinha, que era o melhor que tinha de todos, ele só tinha um dedo… E quando cheguei já botei a corte mirim… Agora está demais, vindo carro alegórico, corte de baile municipal, parece mais escola de samba…. se me tirarem esse ano estou saindo, maracatu não é isso não.”

Elda faleceu, na Bahia, em 12 de maio de 2025, aos 86 anos. A Yalorixá conviveu com o Alzheimer durante os últimos anos de sua vida. Neste país onde o apagamento das tradições afrodescendentes ainda são uma realidade brutal, figuras como Rainha Elda são faróis, intelectuais da oralidade e da vivência. Em nota de pesar, o MDHC – Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania expressou suas mais sinceras condolências e se solidarizou com os familiares e amigos de Mãe Elda de Oxóssi neste momento de luto, relembrando que seu legado permanece como inspiração a todas as pessoas que defendem os Direitos Humanos.

Texto escrito por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.

Palavras-Chave/TAG: #maracatu #yalorixá #mãedesanto #candomblé #racismo #antirracismo #espiritualidadenegra #mulheresnegras

REFERÊNCIAS:

  • Sites:

Folhape. Instagram, 21 de maio de 2025. Disponível em: Instagram. Acesso em 21 mai 2025.

Morre, aos 76 anos, Mãe Elda de Oxossi, guardiã da Nação Porto Rico. G1 Pernambuco, 12 de maio de 2025. Disponível em: Morre, aos 76 anos, Mãe Elda de Oxossi, guardiã da Nação Porto Rico | Pernambuco | G1. Acesso em 21 mai 2025.

Nota de Pesar – Mãe Elda de Oxossi. MDHC – Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, 12 de maio de 2025. Disponível em: Nota de Pesar – Mãe Elda de Oxossi — Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Acesso em 21 mai 2025.

noticia.preta. Instagram, 12 de maio de 2025. Disponível em: ‏‎Notícia Preta‎‏ | ‏‎Esta semana demos adeus a uma figura histórica da cultura e da espiritualidade afro-brasileira em Pernambuco: a Yalorixá Elda Viana,…‎‏ | Instagram. Acesso em 21 mai 2025.

Rainha Elda Viana, entrevista. Nação Porto Rico. Disponível em: Rainha Elda Viana, entrevista | Nação do Maracatu Porto Rico. Acesso em 21 mai 2025.

Sepultamento de Mãe Elda de Oxossi acontece nesta terça-feira, no Recife. Recife: CBN Recife, 13 de maio de 2025. Disponível em: Sepultamento de Mãe Elda de Oxossi acontece nesta terça-feira, no Recife. Acesso em 21 maio 2025.

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