Artista Plástica
Tarsila do Amaral é uma das mais célebres artistas plásticas do Brasil. Schuma Shumaher e Érico Vital Brazil revelam em Dicionário Mulheres do Brasil que Tarsila nasceu em uma fazenda cafeeira em Capivari, São Paulo, em 01 de setembro de 1886. Sua mãe, dona Lídia, e uma professora belga foram as responsáveis pela educação europeia que Tarsila teve na infância, contrastando com a vida interiorana no final do século XIX. Tarsila se casou jovem com seu primo André Teixeira Pinto. Eles tiveram sua filha, Dulce, e Tarsila se separou do marido – um escândalo para a família e sociedade da época.
Em São Paulo, Tarsila estudou escultura com Zadiz e Matovani, recebendo orientação de Pedro Alexandrino em desenho e pintura a partir de 1917. Os autores descrevem o período: “O academicismo, no entanto, logo a enfastiou e seu caminho artístico dirigiu-se para as características impressionistas da pintura do alemão Georg Fischer Elpoms, que residia em São Paulo. Em junho de 1920, viajou para Paris, onde continuou seus estudos e frequentou ateliês de pintores como André Lhote, Albert Gleizes e Fernand Léger. Sua pintura foi fortemente influenciada por Léger, passando a evidenciar claras tendências cubistas. Em 1922, apresentou uma tela no Salão dos Artistas Franceses, em Paris, e em junho veio ao Brasil, aqui ficando até dezembro. Integrou-se ao movimento modernista em curso na cidade de São Paulo, formando com Anita Malfati, Menotti del Picchia, Oswald e Mário de Andrade, o chamado “grupo dos cinco”. Tarsila posteriormente ficou sendo um dos símbolos do movimento.”
Após estudar em Paris, voltou com Lhote e Gleizes para São Paulo, em 1923. Em 1924, na Semana Santa, em companhia de Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Olívia Guedes Penteado e Blaise Cendrars (poeta francês que conhecera pouco antes, em Paris), Tarsila viajou pelas cidades históricas de Minas Gerais. Schuma e Érico descrevem a relevância da viagem para a artista: “Essa viagem marcaria fundamentalmente sua obra. O contato com o barroco brasileiro fez com que formas e cores se amalgamassem em seu espírito, definindo seu estilo puramente nacional. No ano anterior já executara, em Paris, o quadro A Negra, que refletia muito as cores de sua pátria. Mas foi a viagem a Minas (como também o contato com o carnaval carioca) que lhe proporcionou uma vivência mais direta, instrumentando-a na fixação da vital brasilidade de sua pintura.”
Importa ressaltarmos que o legado de Tarsila do Amaral é perceptível na cultura brasileira. Vide Roxane Sidney Resende de Mendonça em Tarsila do Amaral: seu legado como objeto de memória e consumo (1995-2015), que informa ser notável que Tarsila do Amaral era uma das pintoras brasileiras mais conhecidas nas escolas e livros de história da arte no Brasil. A autora também reflete que o mercado da arte a havia consagrado como uma das mais valorizadas artistas do Brasil com a venda de Abaporu, datado de 1929, em 1995. Inclusive, sua obra, “A Caipirinha”, é a obra de arte mais cara negociada em uma venda pública no Brasil, arrematada por um colecionador brasileiro não identificado, conforme exposto na reportagem Obra de Tarsila do Amaral é vendida por R$ 57,5 milhões, de Juliana Andrade para a Revista Forbes. A mesma reportagem revela que a icônica Abaporu foi leiloada em Nova York, arrematada por US$ 1,3 milhão pelo empresário argentino Eduardo Constantini. A reportagem relembra sobre Abaporu: “A obra de inauguração do Movimento Antropofágico idealizado por ela e seu marido, Oswald de Andrade, passou a fazer parte da coleção do Malba – Museu de Arte Latina de Buenos Aires, fundado por Constantini em 2001.”
Roxane em artigo supra apresenta comentários relevantes sobre o consumo e a disseminação da obra de Tarsila: “Algumas empresas simplesmente reproduziram a imagem de obras, principalmente as mais consolidadas nas escolas e livros sobre a pintora. Este efeito saturação-repetição, segundo Cauquelin (2005), é uma estratégia que envolve as artes no regime de comunicação, voltada para promover a marca ou o produto. Já outras empresas reapropriaram-se de fragmentos do legado de Tarsila, em criações mais elaboradas, que desconstruíam elementos de suas obras. Tais iniciativas apostavam na criatividade, a partir de referências visuais ligadas às obras da artista, como paleta de cores alegres e formas orgânicas ou cubistas, para agregar valores estéticos e simbólicos aos produtos criados.”
Outra autora que reflete sobre o reconhecimento público de Tarsila é Luana Silva da Cruz na obra Estética antropofágica: a brasilidade (re)vista na obra de Tarsila do Amaral, que também apresenta anexas reproduções de algumas de suas pinturas, além do Manifesto Antropofágico. Ela observa a constante presença de suas obras nas escolas, com o objetivo de divulgar e familiarizar seu trabalho com os estudantes. A autora também observa: “A busca por manter a divulgação e a popularidade do nome da artista também é feita através de produtos de consumo, intencionando a massificação de sua obra. Contudo, a partir das considerações que propomos sobre a intensa produção de significados de sua estética, questionamos até que ponto contribui a massificação das obras se não são capazes de gerar reflexão. De forma alguma pretendemos contrariar os próprios ideais modernistas, sempre vigilantes contra um tipo de academicismo elitista e restringir qualquer artista ao museu ou exposições ̶ infelizmente ̶ voltadas ao público mais abastado. Sua divulgação amplia as possibilidades de instigar o público ao contato com o que não seria conhecido pelos meios formais de recepção artística (museus, galerias, exposições, vernissages etc). O ponto que mantemos como questionamento é o tipo de circulação e de apropriação. Como essa utopia antropofágica, a alteridade, é considerada quando se trabalha com a padronização estimulada pela cultura de massas?”
Em Tarsila do Amaral – retrato da identidade brasileira, Marcela Martins de Lima já discute a forma na qual Tarsila representou o Brasil em suas obras: “As fases da pintura de Tarsila do Amaral buscaram sempre retratar os temas nacionais, as cores e as paisagens em traços cubistas pintavam um Brasil que até aquele momento não havia sido retratado. Pau-Brasil foi a sua primeira fase, entre as telas mais significativas estavam A Negra e A Cuca, discutidas neste trabalho e apresentadas como fonte histórica para retratar o período estudado. Na segunda fase da pintura de Tarsila, os desenhos ainda cubistas trouxeram também formas exageradas e destorcidas, são figuras que misturam o mundo real e imaginário, o Abaporu foi o maior símbolo da Antropofagia. Os temas sociais apareceram num período difícil da vida da artista, as dificuldades do país que afetavam a vida da classe aristocrática foram captadas por sua sensibilidade. Duas de suas obras pintadas no início da década de 1930 retrataram essas mudanças, Operários e Segunda Classe. Como não estava diretamente envolvida com os problemas sociais, Tarsila não estendeu esta fase em sua pintura. Diante da análise destas obras, percebemos que a identidade brasileira formada esteve diretamente relacionada ao cotidiano, a partir das misturas de várias culturas existentes no país desde a sua colonização.” Essa análise demonstra a relevância da obra da artista para o Brasil, sendo arte e registro histórico inestimáveis.
Luciane de Paula e Douglas Neris de Souza também contribuem para nossa compreensão da relevância e do pioneirismo das pinturas de Tarsila do Amaral: “O nosso olhar para a obra de Tarsila se pautou em sua construção de arte e sociedade. O movimento dialógico existente nas obras da pintora constitui uma ruptura com a hierarquia social e canônica da arte clássica. O homem (ser humano) é descentralizado, rebaixado, não identificável (mascarado), o corpo é grotesco e carnavalizado (enraizado, com partes agigantadas e diminuídas).” Já Maria Helena Cavalcanti Hoffmann em A Linha que Contorna a Crônica: a Obra de Tarsila do Amaral, escrevendo crônicas com o objetivo de ressaltar aspectos importantes da artista modernista, dados relevantes em sua carreira artística e fatos marcantes em sua vida, descreve a trajetória de Tarsila: “A artista dedicou-se à pintura por mais de cinco décadas. Pintou sua terra e pintou seus sonhos, assim, juntos em uma só tela. E foram muitos quadros ao longo de desses muitos anos. Conheceu pessoas e também ficou conhecida. Alguns diziam que ela retratava o Brasil, mas, o que não sabiam, é que ela pintava somente o que acreditava ser a sua terra, portanto, registrava apenas pedaços de um lugar qualquer em seu próprio caminho.”
Tarsila do Amaral faleceu em 17 de janeiro de 1973. Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil em Dicionário Mulheres do Brasil nos ensinam que Tarsila participou de mostras coletivas nos principais museus do Brasil, em Paris, Nova York e diversas outras cidades dos EUA. Inclusive, em 1953, o Museu de Arte Moderna de São Paulo editou uma pequena publicação ilustrada de suas obras. Hoje, suas pinturas se encontram no acervo de museus, instituições e coleções particulares, tais quais o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, a Pinacoteca do Estado de São Paulo e a Biblioteca Mário de Andrade. Já recentemente Nádia Battella Gotlib, professora de literatura brasileira e portuguesa da Universidade de São Paulo, homenageou Tarsila do Amaral com sua biografia Tarsila do Amaral, a modernista. O fato foi reportado por Priscila Sacchettin em As múltiplas faces de Tarsila do Amaral, que também noticiou exposição do Museu de Arte de São Paulo (Masp) que levou ao público um panorama da produção da pintora a milhares de visitantes em 2019. À época, havia sido noticiada a venda de uma das obras de Tarsila, A Lua, de 1928, para o Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMa). O MoMA é um dos mais prestigiosos museus do mundo, e em 2018 foi responsável por organizar a primeira grande retrospectiva da artista na cidade, expondo mais de 100 obras.
Por fim, vale mencionar mais algumas obras sobre a artista e sua produção. Nádia Battella Gotlib em Tarsila do Amaral, a Modernista permite o contato do leitor com a vida e a obra de Tarsila do Amaral, gerando reflexões. Outro autor, Rodolfo Jonasson de Conti Medeiros, em Tarsila do Amaral: análise de imagem da obra ‘A Feira I’, explora a relevância de Tarsila no cenário das artes plásticas no Brasil, ao final desdobrando-se na análise imagética da referida obra. Enfim, mencionamos a publicação A infância de Tarsila do Amaral, de Carla Caruso, uma narrativa que mostra momentos mágicos da infância da pintora.
Texto Adaptado do verbete contido no Dicionário Mulheres do Brasil por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.
Palavras-Chave/TAG: #arte #modernismo #feminismo #europa #internacional #brasilidade #artistaplasticamodernista
REFERÊNCIAS:
- Produções acadêmicas:
CARUSO, Carla. A infância de Tarsila do Amaral. Editora Callis, 3ª edição: 2018. Disponível em: A infância de Tarsila do Amaral | Amazon.com.br. Acesso em 04 dez 2022.
CRUS, Luana Silva da. Estética Antropofágica: a brasilidade (re)vista na obra de Tarsila do Amaral. Curso de Jornalismo, Departamento de Ciências da Comunicação, Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRS: Porto Alegre, 2017. Disponível em: 001063236.pdf (ufrgs.br). Acesso em 04 dez 2022.
GOTLIB, Nádia Battella. Tarsila do Amaral, a modernista. Serviço Social do Comércio – Sesc, Edições Sesc São Paulo: São Paulo, 2018. Disponível em: TARSILA DO AMARAL, A MODERNISTA by Edições Sesc São Paulo – Issuu. Acesso em 04 dez 2022.
HOFFMANN, Maria Helena Cavalcanti. A Linha que Contorna a Crônica: a Obra de Tarsila do Amaral. Instituto de Artes, Centro de educação e Humanidades, Universidade do Estado do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: ( PDF ) A linha que contorna a crônica: a obra de Tarsila do Amaral (livrosgratis.com.br). Acesso em 04 dez 2022.
LIMA, Marcela Martins de. Tarsila do Amaral – retrato da identidade brasileira. Departamento de História, Centro de Ciências Humanas Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN: Natal, 2007. Disponível em: TARSILA DO AMARAL – RETRATO DA IDENTIDADE BRASILEIRA.pdf (ufrn.br). Acesso em 04 dez 2022.
MEDEIROS, Rodolfo Jonasson de Conti. Tarsila do Amaral: Análise de imagem da obra ‘A Feira I’. Revista Interdisciplinar de Cultura e Imagem, v. XII, nº. 32, setembro-dezembro/2021. Disponível em: TARSILA DO AMARAL.pdf (jackbran.com.br). Acesso em 04 dez 2022.
MENDONÇA, Roxane Sidney Rosende de. Tarsila do Amaral: seu legado como objeto de memória e consumo (1995-2015). Programa de Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG: Belo Horizonte, 2016. Dosponível em: Repositório Institucional da UFMG: Tarsila do Amaral: seu legado como objeto de memória e consumo (1995-2015). Acesso em 04 dez 2022.
PAULA, Luciane de; SOUZA, Douglas Neris de. Antropologia Dialógica: olhar Tarsila do Amaral. Signum: Estudos da Linguagem, Londrina, v. 22, n. 3, p. 75-105: Londrina, 2019. Disponível em: (PDF) Antropofagia Dialógica: olhar Tarsila do Amaral | Luciane de Paula – Academia.edu. Acesso em 04 dez 2022.
SACCHETTIN, Priscila. As múltiplas faces de Tarsila do Amaral. Revista Pesquisa Fapesp, edição 282: agosto de 2019. Disponível em: 091_Resenha_282.pdf (fapesp.br). Acesso em 04 dez 2022.
SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Dicionário Mulheres do Brasil, de 1500 até a atualidade: biográfico e ilustrado. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.
- Sites:
ANDRADE, Juliana. Obra de Tarsila do Amaral é vendida por R$ 57,5 milhões. Revista Forbes: 18 de dezembro de 2020. Disponível em: Obra de Tarsila do Amaral é vendida por R$ 57,5 milhões em leilão – Forbes. Acesso em 04 dez 2022.
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Tarsila Popular MASP. Acervo Digital da Unesp. Disponível em: Acervo Digital: Tarsila Popular MASP (unesp.br)