Ativista feminista antirracista e escritora.
Alzira foi uma influente mulher negra feminista brasileira. A despeito do racismo e do machismo da sociedade, graduou-se em enfermagem e se destacou tanto na área da saúde quanto na política e na literatura. Alzira se destaca como importante ativista política do Movimento Negro e do Movimento de Mulheres Negras – inclusive, foi a primeira escritora negra a ter seu depoimento registrado pelo Museu de Literatura Mário de Andrade, de São Paulo.
Nascida em Santos, em 06 de julho de 1949, no seio de uma família humilde, Alzira seguia as tradições do candomblé. Se tornou referência na mídia impressa da região, “divulgando a situação das mulheres negras e da violência contra a mulher, o que muito contribuiu para o debate público, denúncias e o envolvimento da mídia nessas questões”.
Alzira escreveu artigos para revistas e jornais em todo o Brasil e no exterior. Reflexo de seu talento, ela ganhou vários prêmios de poesia, ficção e ensaio. Seu trabalho foi reconhecido com diversas homenagens, incluindo: Mulher do Ano, concedido em 1991 no Rio de Janeiro pelo Conselho Nacional da Mulher Brasileira; em 1992, como a primeira mulher negra a se tornar Cidadã Emérita, foi homenageada pela Câmara Municipal de Santos e pela Câmara Municipal de Cubatão (SP); Mulher Destaque em 2000 pela Câmara Municipal de Santos; e em 2004, Mulher Destaque na área de Direitos Humanos/Status pelo Clube Soroptimista Internacional de Santos. Alzira e a Casa de Cultura da Mulher Negra, da qual ela é uma das fundadoras, também receberam o Prêmio Zumbi dos Palmares, concedido pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
A partir de 1991, Alzira se tornou editora da Revista Eparrei!, voltada para a cultura negra, de circulação semestral. Já entre 1995 e 1998, coordenou a Rede Feminista Latino-Americana e do Caribe contra a Violência Doméstica, Sexual e Racial, na sub-região Brasil.
Em 2008, enquanto dava palestras pelo Brasil e no exterior, Alzira ocupava a presidência da Casa de Cultura da Mulher Negra e coordenava um serviço de apoio jurídico e psicológico para mulheres vítimas de violência doméstica, sexual e racismo. Ela também foi palestrante na Conferência Internacional sobre Violência, Abuso e Cidadania da Mulher, realizada na Grã-Bretanha, em novembro de 1996. Desde 1995, está à frente da campanha “Violência contra a Mulher, uma Questão de Saúde Pública.”
Segundo Lorrayne Thayse Pereira França, a busca por justiça sempre permeou a vida de Alzira Rufino. Sua determinação apareceu desde cedo, quando ainda criança, denunciou um pedófilo que pagava crianças e adolescentes para subirem em um muro, de forma que pudesse observar suas genitálias.
Também sua determinação e excelência acadêmica, tendo sido eleita oradora do curso, Alzira não pôde comparecer à cerimônia de formatura por estar hospitalizada. Seu discurso foi lido por um colega e, mesmo de ambulância, ela fez questão de ir buscar seu diploma. Ao chegar, foi aplaudida por todos. “Na ocasião, foi aplaudida por todos os presentes e destacou a emoção deste dia em suas memórias”, destaca Lorrayne.
Alzira Rufino se tornou uma referência de luta e resistência para as mulheres negras, marcando sua presença na história como uma voz ativa pela justiça e pelos direitos das mulheres da Baixada Santista.
Segundo Douglas Rodrigues de Sousa, Alzira Rufino guia o leitor na compreensão da identidade negra expressa pelo sujeito poético em seus versos. A maioria de seus poemas apresenta um eu lírico feminino, que, através de suas palavras, constrói uma poesia que evoca a história, a memória e o sentimento de ser negra. Sua obra aborda, em grande parte, dois temas delicados: gênero e etnia. Alzira Rufino retrata as mulheres a partir de suas raízes, nos mais diversos lugares para onde a vida a levou. Em 1988, ela intitulou seu livro Eu, Mulher Negra, Resisto, que expressa essa relação do livro com a estética de sua própria vida.
Rufino é uma referência cultural e de militância feminista antirracista tendo fundado a Casa de Cultura da Mulher Negra, em 1990. O nome foi escolhido de forma a honrar as mulheres negras como as guardiãs da cultura africana no Brasil, ainda que os homens brancos dominem a cultura e suas expressões de forma hegemônica. A Casa foi criada para acolher e apoiar mulheres negras em situação de violência doméstica, oferecendo assistência jurídica e psicossocial e cursos profissionalizantes.
Lélia Gonzalez no prefácio de Eu, Mulher Negra, Resisto, de 1988 escreveu sobre Alzira Rudino: “A leitura dos poemas de Alzira remeteu-me também às nossas lutas dos tempos de escravidão, passados e atuais; reafirmando-me que somos Aqualtune, Dandara, Luiza Mahin, Tia Ciata, Mãe Aninha, Mãe Senhora, Dona Zica da Mangueira, Dona Ivone Lara, Maria Beatriz Nascimento, Benedita da Silva e tantas outras mais, atuando nas mais diversas frentes como legítimas representantes do nosso povo. Mas os poemas de Alzira, sobretudo, ressaltaram na minha leitura, que nós somos as anônimas mulheres negras do campo e da cidade; as sem-terra, as boias-frias, as serventes, as empregadas domésticas, as varredoras de rua que, de uma forma ou outra, estão presentes na luta por se organizarem nos sindicatos, nas associações de classe, nos movimentos de favelas e bairros periféricos”.
Alzira Rufino faleceu em 26 de abril de 2023, como pioneira do feminismo, deixando a companheira Urivani Carvalho.
Por ocasião do falecimento de Alzira, a Redeh – Rede de Desenvolvimento Humano publicou: “Boa viagem, parceria e amiga Alzira Rufino. Com você aprendemos muito sobre os privilégios da branquitude, sobre o racismo presente na sociedade, sobre o feminismo interseccional, sobre não desistir nunca. Você tem um lugar especial nos nossos corações. Com muita dor, olhamos pro céu e te vemos como uma estrela, cujo brilho nos enche de saudades”.
Elaborado por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.
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REFERÊNCIAS:
- Produções acadêmicas:
FRANÇA, Lorrayne Thayse Pereira. Alzira Rufino e o Coletivo de Mulheres Negras da Baixada Santista: nós, mulheres negras, resistimos. USP – Universidade de São Paulo: São Paulo, 2012. Disponível em: CELACC. Acesso em 5 mai 2023.
GONZALEZ, Lélia. Prefácio a Eu, Mulher Negra, Resisto. Montreal, junho de 1988. Disponível em: Marxists. Acesso em 5 mai 2023.
NUNES, Kelly Cristiane. A voz da resistência negra na poesia lírica de Alzira Rufino, Beatriz Nascimento e Esmeralda Ribeiro. BDTD – Biblioteca Digital de Teses e Dissertações: Cascavel, 2022. Disponível em: BDTD. Acesso em 5 mai 2023.
PAYNE, Katrina. “I, Black woman, resist]” Katrina Payne talks to Alzira Rufino. Interview. PubMed – National Library of Medicine: 1995. Disponível em: PubMed. Acesso em 5 mai 2023. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2007.
SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Mulheres Negras do Brasil. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2007.
SILVA, Nilza Iraci. Caderno IV. Geledés – Instituto da Mulher Negra: novembro de 1993. Disponível em: Geledés. Acesso em 5 mai 2023.
SOUSA, Douglas Rodrigues De. “Sou negra, ponto-final”: a construção identitária negra feminina na poesia de Alzira Rufino. Revista Eixo: Brasília, 2014. Disponível em: Research Gate. Acesso em 5 mai 2023.
SOUZA, Sérgio Luz. O que é ser mulher: análise de poemas de Alzira Rufino e Afua Cooper. Fazendo Gênero 10 – Desafios Atuais dos Feminismos: Florianópolis, 2013. Disponível em: Fazendo Gênero 10. Acesso em 5 mai 2023.
VAZ, Zélia Maria de N. Neves Vaz. Consciência feminina, étnica e cultural na Obra de Alzira Rufino. UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais: Belo Horizonte. Disponível em: Literafro. Acesso em 5 mai 2023.
- Sites:
Africanize. @africanize_. Twitter: 27 de abril de 2023, 14h10. Disponível em: Twitter. Acesso em 5 mai 2023.
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SILVA, Camila da. Alzira Rufino, fundadora da Casa de Cultura da Mulher Negra de Santos, morre aos 73 anos. Carta Capital: 27 de abril de 2023. Disponível em: Carta Capital. Acesso em 5 mai 2023.
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