Emilson Gomes Junior*
Em Cascadura, o CAPSad – Centro de Atenção Psicossocial – Álcoo e Outras Drogas Ivone Lara abriga o projeto Seguir em Frente, da prefeitura do Rio de Janeiro. A inauguração foi em dezembro de 2023. O Seguir em Frente se destina a assistir pessoas em situação de rua, especialmente dependentes químicos. Apesar das boas intenções, devemos criticar o projeto na medida em que o estado não pode causar danos a direitos de quaisquer cidadãos. Logicamente, pessoas em vulnerabilidade social não são exceção – ao contrário, a proteção dessas pessoas deve ser maior, dada a sua vulnerabilidade.
O CAPSad Ivone Lara homenageia a Rainha do Samba, mulher importantíssima na luta antimanicomial e no desenvolvimento da saúde pública brasileira. Inclusive, ela atuou no Serviço Nacional de Doenças Mentais com a doutora Nise da Silveira, uma das pioneiras da luta antimanicomia brasileira. Considerando estes fatos, é uma contradição hoenagear Dona Ivone Lara com uma instituição de saúde que pratica internação compulsória de usuários de drogas, ato inconstitucional. Como parte do Seguir em Frente, à época da inauguração do CAPSad Ivone Lara, o prefeito publicou decreto para internar compulsoriamente mendigos no Rio de Janeiro. Segundo o Diário do Rio, o decreto surge em resposta a cenas de assalto, estupros e overdores na cidade. Devemos criticar esta noção de que a internação compulsória – inconstitucional – tem qualquer espaço no Brasil, na medida em que significa gastos públicos com um serviço que representa infração a direitos humanos. Além disso, a internação compulsória não traz efetiva recuperação.
Christian Dunker, psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da USP – Universidade de São Paulo, a internação compulsória é arcaica e ineficiente, comparada à internação consentida. Ele revela que as internações compulsórias reconhecidamente causam uma indisposição na vítima. Ela enxerga a internação compulsória como uma violência, uma coerção – o que de fato ela é, concluímos. A partir da internação compulsória, a atitude de confrontação e violência potencial aumenta, o que significa maiores riscos para o pessoal que trabalha no CAPSad Ivone Lara. Logo, permitir a internação compulsória tanto fere os direitos das vítimas quanto aumenta o risco violência contra os trabalhadores que cuidam das pessoas internadas compulsoriamente.
Ainda sobre os trabalhadores do CAPSad, podemos notar que não há informação de que todos os contratados tenham especialização em saúde mental de pessoas em vulnerabilidade social ou dependentes químicos. Também não se tem notícias de programas de capacitação e treinamento específico desse pessoal. Assim, notamos descaso do empregador – prefeitura do Rio – com seus trabalhadores, colocando-os em risco sem a necessária preparação. Destaca-se que esta realidade de insegurança foi criticada pelo MPF – Ministério Público Federal e DPU – Defensoria Pública da União, pois em 2023 as organizações afirmaram em Nota técnica que é inconstitucional a internação compulsória de usuários de drogas, tal como defendida pelo prefeito Eduardo Paes.
Por fim, devemos estar alertas a possíveis denúncias de vítimas de internação compulsória, principalmente mulheres. Alguns questionamentos surgem com isto em mente: (i) existem canais de comunicação para relato de violências sofridas pelas vítimas de internação compulsória? (ii) existem dados públicos sobre estas denúncias? (iii) quais as medidas realizadas pela prefeitura do Rio de Janeiro para impedir a violação de direitos humanos – além, é claro, da própria danosa internação compulsória? Se não realizarmos tais questionamentos, corremos o risco de não apenas assistirmos a um cenário inconstitucional, mas também de permitir que ainda mais infrações de direitos humanos ocorrem neste cenário. Afinal de contas, estamos falando de internação compulsória de usuários de drogas, algo feito por organizações como a prefeitura do Rio de Janeiro e o PCC – Primeiro Comando Central. Com isto em mente, devemos dimensionar a gravidade desta prática, seja pela prefeitura carioca, seja por qualquer outra pessoa.
Colocar crédito do Emilson
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REFERÊNCIAS:
- Produções acadêmicas:
BATISTA, Wagner Vinhas. Palavras sobre uma historiadora transatlântica: estudo da trajetória intelectual de Maria Beatriz Nascimento. UFBA – Universidade Federal da Bahia: Salvador, 2016. Disponível em: TeseFinalizadaCDWagberVinhas.pdf (ufba.br). Acesso em 15 jul 2024.
- Sites:
Dona Ivone Lara: enfermeira, a Rainha do Samba participou da luta antimanicomial. História Ciências Saúde Manguinhos: abril de 2018. Disponível em: Dona Ivone Lara: enfermeira, a Rainha do Samba participou da luta antimanicomial | História, Ciências, Saúde – Manguinhos (fiocruz.br). Acesso em 5 ago. 2024.
Espaço para acolhimento de pessoas em situação de rua é reinaugurado em Cascadura. O Dia: 23 de dezembro de 2023. Disponível em: Espaço para acolhimento de pessoas em situação de rua é reinaugurado em Cascadura | Rio de Janeiro | O Dia (ig.com.br). Acesso em 5 ago. 2024.
HENRIQUE, Alfredo. PCC impõe “internação compulsória” a usuário de drogas da Cracolândia. Metrópoles: 14 de junho de 2024. Disponível em: PCC impõe “internação compulsória” a usuário de drogas da Cracolândia | Metrópoles (metropoles.com). Acesso em 5 ago. 2024.
Rio lança projeto que autoriza internação forçada de dependentes. Carta Capital: 22 de dezembro de 2023. Disponível em: Rio lança projeto que autoriza internação forçada de dependentes – Política – CartaCapital. Acesso em 5 ago. 2024.
Rodrigues, Léo. MPF e Defensoria endossam críticas à internação compulsória no Rio. Agência Brasil: Rio de Janeiro, 24 de novembro de 2023. Disponível em: MPF e Defensoria endossam críticas à internação compulsória no Rio | Agência Brasil (ebc.com.br). Acesso em 5 ago. 2024.
SLOBODEICOV, Laura. Internação compulsória é realmente a solução? Periscópio: 9 de fevereiro de 2023. Disponível em: Internação compulsória é realmente a solução? – Portal de Divulgação Científica do IPUSP. Acesso em 5 ago. 2024.