• Thereza Santos (7 de julho de 1938 – 18 de dezembro de 2012)

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12 de setembro de 2023 por 

Atriz, teatróloga, filósofa, professora, ativista feminista negra e articuladora social.

Thereza Santos – nome artístico de Jaci dos Santos – foi uma atriz brasileira notória por suas contribuições artísticas e culturais à África diaspórica, através de suas atuações no Brasil, em Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Senegal. A intelectual teria colaborado com Estados-Nações africanos em formação no século XX. Segundo a 3ª Edição do NEABI Indica, Thereza Santos se formou em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, em sequência atuando em novelas da Extinta TV Tupi. Inclusive, atuou no filme Orfeu do Carnaval – Orfeu Negro, vencedor da Palma de Ouro do 12º Festival de Cinema de Cannes.

Tauana Olívia Gomes Silva em Mulheres negras nos movimentos de esquerda durante a ditadura no Brasil (1964-1985) revela que Thereza Santos nasceu no Rio de Janeiro, filha de funcionários públicos. Filha de Dona Marta, enfermeira, Thereza Santos cresceu com a expectativa familiar de cursar medicina. Inclusive, digno de nota que Dona Marta havia se inscrito para atuar junto às tropas brasileiras na Segunda Guerra Mundial, com o objetivo de obter melhores condições de vida para sua família. Nos termos de Thauana Silva, Thereza dos Santos revelou em sua autobiografia Malunga Thereza Santos: a história de vida de uma guerreira que tal recusa pelas Forças Armadas teria sido uma de suas maiores frustrações. Similarmente, seu pai a encorajava a atuar nos grupos político-partidários da época. Nitidamente, ambos tinham preocupação com a formação de Thereza Santos, de forma que buscavam orientá-la para tomar as melhores decisões pessoais e profissionais que pudesse.

Conforme nos ensina Flavia Rios em A Trajetória de Thereza Santos: comunismo, raça e gênero durante o regime militar, Thereza foi vítima de perseguição política durante a Ditadura Militar, levando-a a fugir para São Paulo em 1969. A autora descreve: “A fuga de Thereza Santos para São Paulo, em 1969, deixando para trás familiares, incluindo seu filho, não teve cobertura da imprensa. Em um contexto de maior repressão, com o Ato Institucional Número Cinco (AI-5), Thereza foi interrogada pelo Centro de Informações da Marinha (CENIMAR), um dos órgãos da polícia política, localizado no Rio de Janeiro, que atuou severamente na repressão à luta de resistência à Ditadura Militar e na perseguição aos quadros do movimento afro-brasileiro pró-independência dos países africanos (SANTOS, 2010). Thereza Santos tinha envolvimento em ambos os círculos políticos. Naquela ocasião, prestou depoimentos e foi interrogada por diversas vezes e, segundo sua autobiografia (SANTOS, 2008), conseguiu demonstrar que não tinha qualquer envolvimento com o PCB, sendo apenas uma atriz de teatro. Tão logo teve chance de sair da órbita de interesses dos órgãos de repressão, Thereza mudou-se em segredo de cidade. A atriz carioca chegou clandestinamente à capital de São Paulo e encontrou abrigo e proteção nas redes comunistas.  Por esses círculos, conheceu pessoas ligadas às associações negras de São Paulo, como o jornalista investigativo Odacir de Mattos, que, anos antes, a tinha entrevistado para coletar dados para a Revista Realidade, o que resultou em uma extensa reportagem sobre o racismo à brasileira, com depoimentos de pessoas de diferentes capitais do país. Odacir pertenceu à Associação Cultural do Negro (1954-1976), entidade central para encontros literários e culturais, cujos fins eram tanto lúdicos como políticos (SILVA, 2012b)”

Flávia Rios relembra vertentes teatrais relacionadas às seguintes organizações influenciaram a trajetória da atriz desde sua juventude: (i) Centro Popular de Cultura – CPC, na União Nacional de Estudantes – UNE; (ii) Teatro Experimental do Negro – TEN. Thereza havia ingressado, inclusive, na Juventude Comunista quando tinha 15 anos, de forma que construiu fortes vínculos com a militância político-artística do PCB através do movimento secundarista. Segundo Evaldo Ribeiro Oliveira em Narrativas de Thereza Santos – Contribuições para a Educação das Relações Étnico-Raciais, Thereza também começou a trabalhar no Grêmio Recreativo Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira, fundando o Departamento Feminino e o Departamento Cultural da Mangueira junto de outras mulheres da escola de samba.

Em relação às contribuições da atriz ao samba, Evaldo destaca que Thereza Santos participou de inúmeras atividades sobre o carnaval. Foi diversas vezes comentarista de desfiles de escolas de samba e outros eventos carnavalescos na Rádio Bandeirantes e TV Gazeta, de São Paulo, e na Rede Tupi e Rede Manchete de Televisão, no Rio de Janeiro. Inclusive, foi jurada no Evento Troféu Nota 10, organizado pelo Jornal Diário Popular de São Paulo, a partir de sua criação. Thereza Santos também escreveu sambas-enredo e participou da organização de comissões de frente, dentre outras atividades. Destaca-se que foi diretora na Mangueira, e que foi tema do enredo de 2007 do Grêmio Recreativo de Samba Unidos do Cabral, no Rio de Janeiro.

Tauana demonstra em sua obra supramencionada que Thereza Santos atuava de forma comprometida com o desenvolvimento cultural e educacional da região da Mangueira. Nos termos da autora: “A partir de 1964, com o regime militar em vigor, Thereza Santos informou ao partido comunista sua pretensão em coordenar uma frente de trabalho na escola de samba carioca Mangueira, a qual consistiu em propor aulas de português e matemática como reforço escolar, bem como aulas de pintura. Além disso, Thereza construiu com a colaboração da comunidade uma biblioteca e um teatro infantil. Com os adultos residentes do bairro que abrigava a escola de samba a filósofa organizou reuniões para debater a situação do local e, em seguida, promover estratégias políticas de intervenção. Por fim, devido ao seu grande empenho em organizar atividades inéditas, Thereza foi designada pelo presidente da Mangueira como Diretora Cultural.”

Válido refletir sobre como Thereza Santos articulava seus conhecimentos teóricos e práticos no desenvolvimento social da Mangueira, uma das maiores favelas do Brasil. Neste sentido, Evaldo Ribeiro em obra supra cita a autobiografia de Thereza Santos de forma a compartilhar a perspectiva da atriz em relação à sua trajetória: “A grande vantagem dos países africanos sobre os países europeus ou europeizados, é que os valores culturais são parte da formação do homem, e foi lá, no meio da miséria, da guerra, do barulho do obus [canhão] que aprendi a valorizar a cultura. Dentro do mesmo conceito que aprendi na Mangueira, ou seja, aprendi a não separar os valores culturais dos valores sociais e político do homem. Para alguns, incompreensíveis, para mim o caminho que descobri e resolvi trilhar.”

Apesar de seu relevante impacto social na Mangueira, Flavia Rios expõe que sua organização política à época não apoiava plenamente a atuação da intelectual. A autora descreve: “A coreografia foi uma dimensão artística que Thereza desenvolveu quando trabalhou na Escola de Samba Estação Primeira-Mangueira, onde dirigiu e montou uma ala composta somente por crianças, organizando a performance infantil para o desfile de carnaval. Essa atividade política junto à comunidade do samba não era bem vista pela cúpula do partidão, mas, mesmo assim, Thereza Santos percebia que esse espaço era o lugar privilegiado para a ação política, valendo-se da própria produção cultural popular. Foi na escola de Cartola, dona Zica e tantos outros sambistas que Thereza santos conseguiu organizar coletivamente as mulheres, que sugeriu a criação do departamento feminino da Mangueira. Quando a escola predileta de Thereza ganhou seu bicampeonato, em 1968, um amigo lhe escreveu da França: ‘A Mangueira ganhou pela segunda vez consecutiva, estou muito feliz que seja esse o pretexto de te escrever’. Esse trabalho pintaria para sempre o coração de Thereza em verde e rosa.” Logo, podemos perceber que Thereza Santos foi pioneira através de sua atuação, contrariando algumas opiniões políticas e produzindo frutos às comunidades de favela cariocas e à história do samba do Rio.

Além de sua contribuição ao samba carioca, Thereza também colaborou com Eduardo de Oliveira para fundar o Centro de Cultura e Arte Negra – CECAN. Tauana Silva em obra supra descreve: “Seus princípios estéticos e ideológicos estavam respaldados na criação de uma identidade racial. Tratava-se de resgatar as experiências culturais e históricas do povo negro por intermédio da mobilização e, ao mesmo tempo, integrar os componentes de luta e resistência. Gérmen do movimento negro contemporâneo, o CECAN foi apresentado na obra de Silva (2012, p. 12) como a primeira organização da capital paulista “a trabalhar a ideia da negritude – isto é, a importância da consciência étnica –, afirmando a necessidade de que a redescoberta do negro, com base na recuperação do domínio cultural e histórico, faça-se cada vez mais sob a égide da identidade.” Em 1971, no âmbito da entidade paulista, Thereza e Eduardo inauguraram a peça de teatro intitulada E agora falamos… nós.”

É possível vislumbrar que a relação entre Thereza Santos e Eduardo Oliveira foi benéfica tanto pela perspectiva artística quanto pelo desenvolvimento pessoal e político de ambos. Neste sentido, Rafael Petry Trapp em O Elefante Negro: Eduardo de Oliveira e Oliveira, raça e pensamento social no Brasil (São Paulo, década de 1970) revela que a vivência do artista enquanto um homem negro gay era revestida de olhares e comentários racistas e homofóbicos, ainda que não haja tantos registros demonstrando tal realidade. Thereza Santos falou abertamente sobre a questão, denunciando: “Eduardo foi discriminado pelos brancos por ser negro e pelos negros pela sua opção sexual.” Inevitável refletir que a simbiose vivida pelos artistas foi benéfica para que os dois, em suas jornadas particulares de navegação da realidade desigual brasileira.

Importa descrevermos também a perseguição política sofrida por Thereza Santos pouco antes de se exilar em países africanos, posteriormente os auxiliando em seus processos de independência. Conforme explica Flavia Rios em obra supra: “A ruptura com o CPC ocorreu, no entanto, aos poucos. Antes Thereza tinha dedicado muitas de suas energias, no interior da UNE, especialmente à construção de um espaço físico voltado para as encenações teatrais: organizava eventos, fazia peças e arrecadava fundos para a organização estudantil, localizada na praia do Flamengo. Quando veio o Golpe, Thereza era testemunha in loco de uma das primeiras investidas da virada repressiva do Estado brasileiro: ‘depois de fugirmos pelos fundos do prédio e cair numa lavanderia, dei a volta pela Rua do Catete e voltei para frente da UNE, que estava em chamas. Chorava desesperada por ver todo o trabalho e os sonhos destruídos’. Era o dia 1º de abril de 1964.” Possível vislumbrar a frustação de Thereza e colegas frente à destruição de um movimento político-artístico de esquerda que proporcionava tantos benefícios à sociedade brasileira da época.

Anos após o início da ditadura militar, nos anos 1970, Thereza Santos se exilou em Guiné-Bissau. Flávia Rios descreve a experiência da atriz no país: “Em Guiné, seu primeiro lugar de atuação política, cujos registros são mais confiáveis, a atriz brasileira teria recebido treinamento militar e aprendido a manejar armas soviéticas, particularmente a metralhadora AK-47, modelo popular nas lutas revolucionárias anticoloniais. Nesse país, segundo seu depoimento, teria perdido seu passaporte, passando a circular nas fronteiras dos países africanos por meio de suas redes políticas.”

Destaca-se que o lugar de desembarque de Thereza Santos foi Dacar, capital do Senegal. Tauana Silva em obra supra nos informa que a atriz descreveu a violência sexual sofrida nos primeiros instantes de sua chegada ao país. Flávio Proença, à época responsável pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde – PAIGC no Senegal, tentou invadir seu quarto na casa do Partido, de forma que Thereza reagiu energicamente à tentativa e ameaçou denunciá-lo para a direção. Sem pedidos de desculpas, Thereza foi encaminhada a um hotel no dia seguinte. Logo após, Thereza inaugurou suas atividades na Escola Teranga, do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF.

Conforme ensina Evaldo em obra supra, Thereza Santos atuou alguns anos em Guiné-Bissau, em sequência tendo sido convidada por secretários de Agostinho Neto para exilar-se em Angola. Segundo o autor: “Ao aceitar o convite, ela utiliza o teatro e a cultura como ferramentas para a reconstrução da sociedade angolana. Em seguida, foi nomeada diretora do ‘Departamento Nacional de Teatro do Ministério da Educação e Cultura’ e membro da ‘Comissão Interministerial de Implantação de Núcleos Socioculturais.’” Segundo Flávia Rios, Thereza Santos revelou em reportagem ao O Globo que teria passado um ano na fronteira entre Guiné e Senegal, na Escola Teranga, da UNICEF, para filhos de guerrilheiros e mortos na luta pela independência de Guiné, tendo também trabalhado como professora primária e teatróloga a pedido do presidente de Guiné, Luis Cabral. Thereza também afirmou que foi à capital do país, Bissau, em novembro de 1974, para fundar uma escola de teatro, montando peças – inclusive autorais – e promovendo a cultura naquela região do país.

Dentre as formas de atuação de Thereza Santos, mencionamos o câmbio de cultura, em Angola. A atriz revelou aos jornais, conforme Flávia Rios expõe: “Um dos trabalhos mais importantes que criei foi o comboio de cultura, utilizando os vagões da estrada de ferro. Fizemos a linha que vai de Luanda a Malage, cidade onde houve debate com a juventude do MPLA. O comboio era composto por dois vagões de passageiros, um de restaurante, e vagões de carga que foram preparados pelos principais organismos do partido. […] O espetáculo era na própria estação. Aberto a toda a população, que visitava e até participava. Foi magnífico.” Podemos vislumbrar o impacto positivo que esta e outras ações de Thereza Santos tiveram no continente africano, em um contexto político disruptivo.

Thereza Santos retornou ao Brasil em 1978, após sucessivas tentativas de golpe, em maio daquele ano, com o propósito de promover o intervencionismo político soviético sobre a Angola. Tais episódios significaram massacres e aprisionamentos de inúmeras pessoas, dentre elas figuras importantes do Movimento Popular de Libertação de Angola – MPLA e populares envolvidos nas movimentações políticas. Flávia Rios expõe: “Para Thereza, aquela experiência foi demasiadamente forte e abalaria parcialmente suas convicções socialistas, especialmente porque a violência tinha chegado muito perto de sua casa e de seus alunos, além de amigos e companheiros de trabalho. Por conta disso, decidiu sair do país. As forças políticas, entretanto, mantiveram-na presa a despeito de seus protestos e solicitações de retorno ao Brasil. Thereza Santos fez greve de fome por vinte e seis dias para forçar sua saída de Angola.” Tauana Silva também menciona que Thereza já vinha sofrendo discriminações xenófobas em Angola, de forma que sua permanência no país também era desconfortável neste sentido.

Em relação a sua atuação no teatro, Thereza Santos realizou 2 turnês artísticas na Europa, em 1962 e 1968, com Jorge Goulart, Nora Ney e Sérgio Ricardo, segundo Flávia Rios. Dentre outras produções, destaca-se também Pindura saia, dirigida e criada por Graça Mello, e que contava com a participação da Mangueira na encenação de 1966, no Teatro República. Ainda, mencionamos (i) A escada, criada por Jorde Andrade e dirigida por Ivan de Albuquerque, em 1963, (ii) A mulher sem pecado, de Nelson Rodrigues, dirigida pelo polonês Zbigniew Ziembiski, e (iii) Tom Paine, dirigida por Ademar Guerra em 1970, no teatro Vereda.

Evaldo Ribeiro descreve um pouco mais sobre a atuação da atriz e teatróloga, com base nas informações apresentadas em sua autobiografia: “’A filha da Besta Torta do Pageu’; ‘A Incelença’ e ‘Viva o Cordão Encarnado’, ambas de Luiz Marinha; ‘Pendura a Saia’; ‘Morte e Vida Severina’ de João Cabral de Melo Neto; ‘O Milagre de Anni Sullivan’ e ‘Tom Payne’ (SANTOS, 2008). Como autora, escreveu e dirigiu as peças ‘E Agora Falamos Nós’, ‘África Liberdade’, ‘História de Angola’. Também dirigiu as peças ‘Kuenha em Luanda’ e ‘Origira – Grito Afrinano’ (SANTOS, 2008).”

Na televisão, Thereza Santos viveu a personagem Beatriz na novela Nino, o italianinho, da extinta TV Tupi, de 1969 a 1970. Já em A fábrica, de Geraldo Vietri, viveu a personagem Rosita, em seguida atuando em Signos de Esperança, de Marcos Rey. Também contracenou com Adoniran Barbosa em Mulheres de areia, compondo o casal Vilma e Chico Belo entre 1973 e 1974. Já no cinema, além de atuar no filme Orfeu Negro, premiado no 12º Festival de Cinema de Cannes, Thereza Santos participou do documentário Músicas brasileiras.

Notável também a produção acadêmica de Thereza dos Santos. Nesta linha, Andreza Maria Sá Coelho e Sansarah da Silva Gomes em O movimento feminista negro e suas particularidades na sociedade brasileira refletem: “Podemos destacar um importante momento dentro do movimento feminista. Em 1985, Sueli Carneiro e Thereza Santos publicaram um diagnóstico acerca da situação da mulher brasileira em variados contextos sociais para avaliar e divulgar os progressos alcançados pelo governo brasileiro na década da Mulher 1975-1985. Tal publicação revelam dados sócio econômicos sobre a realidade da população negra em especial da Mulher Negra. (Damasco 2009, apud, Ribeiro 1995)” As autoras deixam evidente que o trabalho formulado por Thereza Santos e Sueli Carneiro era brilhante, tendo contribuído com o avanço dos debates sociais do país. Desta forma, as autoras também afirmam: “A partir dessa organização das mulheres negras foi possível considerar um avanço nas articulações e diálogos no interior do movimento feminista, verificando o reconhecimento em cessar com a invisibilidade negra, e conscientizando a respeito das diferenças femininas. A militância negra foi ganhando corpo, rompendo com a não representação e fazendo história, grandes ativistas como Thereza Santos e Sueli Carneiro engajadas na luta feminista e antirracista se dedicaram a produção de conteúdo que fomentava discussões desconsideradas pelas mulheres brancas.” Destaca-se que o trabalho é mencionado nas seguintes obras, dentre outras: (i) Autoras negras: protagonismo feminino, do Senado Federal, e (ii) Cadernos Geledés, republicado em edição comemorativa de 23 anos.

Ainda sobre o trabalho realizado em conjunto com Sueli Carneiro, mencionamos Mariana Santos Damasco, Simone Monteiro e Marcos Chor Maio em Feminismo negro: raça, identidade e saúde reprodutiva no Brasil (1975-1993), que descrevem o trabalho em nota de rodapé: “Por ocasião da III Conferência Mundial sobre a Mulher em Nairóbi, em 1985, Albertina Costa, feminista branca, Thereza Santos e Sueli Carneiro, ativistas negras, organizaram juntas uma publicação que continha um diagnóstico acerca da situação da mulher brasileira em diferentes esferas sociais. Essa publicação, financiada pelo Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo, foi elaborada para avaliar e divulgar os avanços alcançados pelo governo brasileiro na Década da Mulher (1975-1985), conforme foi estabelecido pela ONU no momento da Conferência do Ano Internacional da Mulher, em 1975 (CARNEIRO, COSTA e SANTOS, 1985).” Inclusive, conforme exposto pela Revista Nova Escola, Thereza Santos foi a primeira mulher negra a ser nomeada para o Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo – o que por si é notório.

Dentre os registros cinematográficos de Thereza Santos, ressaltamos o vídeo Mulher Negra, de 1985, disponível no YouTube através do Acervo Digital de Cultura Negra – Cultne. O vídeo também é retratado no site do Observatório de educação em direitos humanos em foco, bem como no site de formação política TraduAgindo. Trata-se de entrevista histórica dada pela atriz, registrada por Amauri Pereira. A intelectual reflete diante das câmeras sobre feminismo negro, a realidade racial brasileira e a relação sócio-histórica das mulheres negras com o desenvolvimento da colônia e do Estado brasileiros. Na entrevista, a pensadora discorre sobre o papel da mulher negra pela perspectiva de desenvolvimento socioeconômico durante e após o holocausto negro proporcionado pela escravidão ibérica nas Américas. Ela também pontua sobre a relevância da mulher negra para a comunidade negra brasileira, cumprindo também o papel social de acolhimento afetivo e emocional a toda a comunidade negra. A exemplo, mencionamos uma simples e efetiva perspectiva compartilhada por Thereza: ela afirma que a família negra é bem estruturada muito antes do episódio genocida do segundo milênio, de forma que a organização genocida se esforçava especialmente para tentar diluir a família negra no território brasileiro. Vide a estratégia de manutenção da distância física entre homens e mulheres negras durante os períodos de trabalho forçado pela escravidão. Neste contexto, as mulheres negras conseguiram implementar estratégias para subverter as lógicas destrutivas escravocratas.

Após retornar ao Brasil, a atuação política de Thereza Santos é fora de série. Evaldo Ribeiro Oliveira em obra supramencionada relembra que Thereza Santos se tornou assessora da Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, instrumentalizando a função para a promoção de diversas atividades voltadas para a população negra. A exemplos, Thereza Santos promoveu o Projeto Kizomba, o I Perfil da Literatura Negra e o Encontro Internacional de Música Negra. Similarmente, Thereza Santos fundou e dirigiu a Associação Agostinho Neto, cujo objetivo era apoiar e divulgar o desenvolvimento da República de Angola. Thereza também realizou diversas palestras, seminários e atividades carnavalescas, além de elaborar livros e textos, sempre com o objetivo de lutar contra todas as formas de desigualdade social. Schuma Schumacher e Érico Vital Brazil também revelam que Thereza Santos criou o Coletivo de Mulheres Negras em São Paulo. À época, nos anos 1980, Lélia Gonzalez, Jurema Batista e Geralda Alcântara, dentre outras, fundavam o Nzinga Coletivo de Mulheres Negras, no Rio de Janeiro, e Alzira Rufino organizava o Coletivo de Mulheres Negras da Baixada, em Santos. Fruto de sua dedicação à sociedade brasileira e a todos os povos do mundo, Thereza Santos recebeu o título de Cidadã Paulistana da Câmara Municipal de São Paulo em 1993.

Digno de nota que, conforme exposto pelo Geledés no texto Thereza Santos – Teatróloga, professora, filósofa e militante negra, Thereza foi a primeira mulher negra convidada a participar do Conselho Estadual da Condição Feminina do governo de São Paulo, em 1984, após a radialista Marta Arruda ter alertado que não havia qualquer mulher negra entre as 32 conselheiras convocadas. Na gestão seguinte, Sueli Carneiro, sua companheira de luta, também participou do conselho. O texto também revela que o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar pesquisou as contribuições didático-metodológicas da atriz para a educação das relações étnico-raciais. A iniciativa foi premiada no Concurso Nacional de Monografias 2009, da Coordenação de Educação a Distância da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, em parceria com a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade com o Ministério da Educação.

Thereza Santos faleceu em 18 de dezembro de 2012. Nos termos do texto Morre Tereza Santos (1930 – 2012) Guerreira da Cultura Negra: “Estudiosa dos temas raciais e de gênero, ela viveu por cinco anos no Continente Africano, contribuindo para a reconstrução cultural de Angola, Cabo Verde e Guiné Bissau.” Seu corpo foi velado na Capela A do Cemitério do Caju, no Rio de Janeiro, em 19 de dezembro, e seu corpo foi enterrado na manhã do dia 20 de dezembro.

Elaborado por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.

Palavras-Chave/TAG: #mulhernegra #feminismonegro #colonialismo #independênciaafricana #comunismo #teatro #cinema #cultura #ativismo #samba #arte

REFERÊNCIAS:

  • Produções acadêmicas:

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COELHO, Andreza Maria Sá; GOMES, Sansarah da Silva. O movimento feminista negro e suas particularidades na sociedade brasileira. São Luís: VII Jornada Internacional de Políticas Públicas da Universidade Federal do Maranhão, Centro de Ciências Sociais, Programa de Pós Graduação em Políticas Públicas, 2015. Disponível em: o-movimento-feminista-negro-e-suas-particularidades-na-sociedade-brasileira.pdf (ufma.br). Acesso em 20 jun 2023.

DAMASCO, Mariana Santos; MAIO, Marcos Chor; MONTEIRO, Simone. Feminismo negro: raça, identidade e saúde reprodutiva no Brasil (1975-1993). Florianópolis: Revista Estudos Feministas, 2012. Disponível em: p 133-151 Damasco-Maio-Monteiro.pmd (scielo.br). Acesso em 20 jun 2023.

NEABI Indica – Sugestões de biografias de personalidades negras e indígenas e atividades para abordar a História e Cultura Africana, Afro-brasileira e Indígena na sala de aula – nº. 3.  São Paulo: NEABI – Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas do IFSP – Instituto Federal de São Paulo, 2019. Disponível em: NEABI_indica_n3_aprovacao2.pdf (ifsp.edu.br). Acesso em 20 jun 2023.

OLIVEIRA, Evaldo Ribeiro. Narrativas de Thereza Santos – Contribuições para a Educação das Relações Étnico-Raciais. São Carlos: Universidade Federal de São Carlos: 2008. Disponível em: Microsoft Word – CAPA DISSERTAÇÃO COMPLETA_03_02_09.doc (ufscar.br). Acesso em 20 jun 2023.

PETRY TRAPP, Rafael. O elefante negro: Eduardo de Oliveira e Oliveira, raça e pensamento social no Brasil. Niterói: UFF – Universidade Federal Fluminense, 2018. Disponível em: UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE (uff.br). Acesso em 20 jun 2023.

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SCHUMAHER, Schuma: VITAL BRAZIL, Érico V. Mulheres Negras do Brasil. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2008.

SILVA, Tauana Olívia Gomes. Mulheres negras nos movimentos de esquerda durante a ditadura no Brasil (1964-1985). Rennes: Université Rennes 2 em cotutela com o Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina, 2019. Disponível em: PHST0683-T.pdf (ufsc.br). Acesso em 20 jun 2023.

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  • Sites:

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Thereza Santos – Teatróloga, professora, filósofa e militante negra. Portal Geledés. 2015. Disponível em: Thereza Santos – Teatróloga, professora, filósofa e militante negra (geledes.org.br). Acesso em 20 jun 2023.

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