• Pagu (1910 – 1962) 

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12 de setembro de 2023 por 

Poetisa, jornalista e ativista política.

Patrícia Rehder Galvão é uma das mais conhecidas ativistas pelos Direitos Humanos da história brasileira. Consagrou-se ícone da esquerda, que celebra a sua contribuição ao mundo através da escrita e da resistência civil.

Patrícia nasceu no dia 09 de junho, em São João da Boa Vista, São Paulo, filha de Adélia e Thiers Galvão de França. Veio morar na capital paulista ainda criança, onde cursou a Escola Normal e, aos 15 anos de idade, já colaborava com o jornal de seu bairro, o Jornal do Brás. Colocou sua vida a serviço dos ideais de igualdade e justiça. Participou ativamente do movimento modernista, no qual se engajou aos 18 anos e, aos 19, do movimento antropofágico, na ala dissidente, esquerdista, de Oswald de Andrade, Raul Bopp, Osvaldo Costa e Geraldo Ferraz, oposta à ala católica de Mário de Andrade, Alcântara Machado e Yan de Almeida Prado. Fazia desenhos para a Revista da Antropofagia, na época em que esta era veiculada como página especial do jornal Diário de São Paulo, fase mais radical do movimento.

Casou-se com o pintor Waldemar Belisário, mas o casamento durou pouco. Foi companheira do escritor Oswald de Andrade durante vários anos e com ele teve um filho, Rudá.

Era uma mulher corajosa. Aos 20 anos, em 1931, entrevistou Luís Carlos Prestes, quando o conheceu numa viagem que fez ao Uruguai, o qual estava iniciando sua trajetória no marxismo. Nesse mesmo ano, esteve envolvida em vários incidentes. Um deles, no porto de Santos, durante um choque entre trabalhadores e a polícia, quando recolheu o corpo agonizante do estivador negro Herculano de Sousa, enfrentando a cavalaria. Por conta deste imprevisto, o Partido Comunista do Brasil – PCB, receoso de ser responsabilizado, chamou-a de “agitadora individual, sensacionalista e inexperiente”.

Filiada ao PCB, tanto ela como Oswald eram mal vistos pelos militantes do partido. Em março do mesmo ano, lançaram o tabloide O Homem do Povo, pasquim político que circulou por apenas dois meses e oito números. A polícia proibiu a circulação do jornal em abril, por pressão dos estudantes de Direito do Largo de São Francisco (SP). Ainda em 1931, foi presa pela primeira vez, por participar de um comício do Partido em protesto contra a execução, nos Estados Unidos, dos anarquistas italianos Sacco e Vanzetti, acusados de homicídio. Tornou-se, assim, uma das primeiras mulheres brasileiras a ser presa por motivos políticos no século XX.

Pode-se considerar que Parque Industrial é a obra mais conhecida e estudada da autora. Schuma e Érico no Dicionário Mulheres do Brasil ensinam: “O romance Parque industrial, que escreveu em 1933 com o pseudônimo de Mara Lobo, provocou intensa polêmica por suas críticas à sociedade paulistana. Neste romance, Pagu denunciou as condições socioeconômicas em que viviam os proletários e desmistificou a figura feminina para além do espaço doméstico”.

Virgínia Celeste Carvalho da Silva e Emylayny Sarayna dos Santos Freire Filho em Entre a Exposição e a Invisibilidade: Uma leitura da crítica sobre vida e obra de Patrícia Galvão refletem, no entanto, sobre o apagamento da obra no Brasil: “Contudo, seus feitos e reconhecimento intelectual estiveram cada vez mais fora do sistema literário do Brasil, pois não encontramos palavras sobre Pagu dentro dos compêndios de literatura, como uma mulher que participou ativamente da Escola Modernista. Por outro lado, encontramos biografias e artigos acadêmicos que exaltam de sobremaneira aspectos íntimos de sua vida, como a sexualidade e os ‘escândalos’ amorosos. Mesmo quando encontramos artigos que falam sobre o romance Parque Industrial, vemos que estão centrados na crítica convencional, que não percebe uma continuidade de produção entre escritoras”.

São notáveis a inovação e a preocupação com a realidade social brasileira que Pagu demonstra em sua obra. Conforme nos ensina Ana Luiza Mendes: “Parque Industrial é revolucionário, pois traz à tona uma realidade que por vezes tentava-se esconder. No período em que foi produzido estava em voga a ideologia de higienização, a partir da qual se tentava expulsar as camadas populares do centro das cidades. O Brás, em São Paulo, era considerado o bairro da degradação humana. E é este justamente o cenário da obra, que coloca em primeiro plano todos os personagens sociais que deveriam permanecer escondidos. Juntamente com os personagens, ela traz as consequências trágicas que uma parcela da população sofre por conta do processo de industrialização. Ainda sob o aspecto literário, podemos pensar o livro de Pagu como um rompimento e uma crítica à ideia da ‘natureza feminina’ e, portanto, da reprodução de estereótipos tanto nas personagens como na própria forma da obra e da concepção de escrita que, para Pagu, deveria ser engajada. À época do seu lançamento, talvez a única crítica positiva tenha sido de João Ribeiro (1860-1934), que reconhece Parque Industrial como um romance antiburguês, de onde a verdade ressalta involuntariamente das páginas veementes e tristes”.

Assim, sendo uma artista de sua época, foi uma das mais bem sucedidas ao retratar aquele período histórico, apresentando uma obra com elementos de combate à desigualdade social e de promoção aos direitos humanos.

Outra obra aclamada de Pagu é Paixão Pagu – uma autobiografia precoce de Patrícia Galvão, que foi originalmente escrito como uma longa carta para seu marido, Geraldo Ferraz, ao final da década de 1940.

Sobre a obra de Pagu, Bianca Ribeiro Manfrini escreveu uma análise à Teresa – Revista de Literatura Brasileira. Bianca reflete que Pagu demonstra a imagem jovial que tinha de si, uma mulher forte e inabalável, que vai se enfraquecendo enquanto Pagu enxergava a realidade com novos olhos, desfazendo o mito que criou de si mesma, “despindo também a imagem de ‘musa modernista’ criada por Oswald, Tarsila do Amaral e Raul Bopp, que recitava poemas de forte apelo erótico no Teatro Municipal”. Sobre Oswald de Andrade, destacamos que Bianca expôs a compreensão de Pagu sobre a relação que teve com o rapaz burguês, consciente de que era vista como parte da coleção de extravagâncias de Oswald. A autora revela que Pagu e Oswald passaram a viver juntos ao final de 1929, e que, apesar da visão objetificadora de Oswald sobre Pagu, não se anula a importância dela na vida do escritor.

Depois da prisão e da publicação de Parque industrial, Patrícia fez uma viagem de volta ao mundo, enviando, como correspondente, reportagens para os jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo. Visitou os Estados Unidos, Japão, Manchúria. Nesse país presenciou a coroação do imperador Pu-Yi. Na China, entrevistou, no navio, um passageiro ilustre: Freud. Entrou na Europa pelo trem transiberiano, indo de Moscou a Paris. Na capital francesa, participou do PC francês e travou amizade com os intelectuais Aragon, André Breton e Paul Éluard. Acabou presa pelo governo de Laval e foi salva pelo embaixador brasileiro Sousa Dantas. Voltou ao Brasil e foi novamente presa em 1935 por um período de quatro anos e meio. Retornou à liberdade em 1940 e desvinculou-se do PCB, passando a criticar o partido, especialmente com relação à política cultural.

Importa nos alongarmos sobre o encarceramento de Pagu, mencionado acima. Sobre o último, Letícia Nunes de Moraes em Histórias de Pagu: memória, feminismo e cultura política relata que Pagu esteve presa desde 1935, sob a governo de Getúlio Vargas, antes da instalação do Estado Novo. Pagu foi solta em 1940. Letícia expõe:“O ano de 1940 e a carta autobiográfica escrita naquele ano marcam, portanto, um momento de ruptura na vida de Patrícia, de repensar e de reescrever a vida, reinventar-se. Libertar-se de um ‘tempo-prisão’. De alguma forma, ressuscitar: ‘mundo que começa no nosso portão’. E despedir-se de Pagu, apelido que a tornou célebre, pois, de acordo com o filho Geraldo Galvão Ferraz, Patrícia Galvão detestava ser chamada de Pagu: ‘Pelo menos, foi o que me disse várias vezes no final de sua vida. Pagu era o rótulo que parecia designar, segundo ela, uma pessoa que já não existia. Alguém que morrera há muito tempo, vítima do esmagamento de seus entusiasmos juvenis por engrenagens implacáveis”.

Uma forma interessante de pensar a trajetória de Pagu é apresentada por Everardo Rocha e Lígia Lana em Imagens de Pagu: trajetória midiática e construção de um mito. Eles apresentam: “Pagu, nascida na longínqua década de 1910, já deslocava os lugares da mulher – no sexo, no casamento, na maternidade e na atuação pública: engravidou e abortou aos 14 anos; casou-se em segredo, separou-se pouco tempo depois e deixou, durante as longas viagens ao exterior, o filho aos cuidados do pai ou da família; filiou-se a um partido político diversas vezes na ilegalidade, mudou de ideologia e revelou as contradições da agenda comunista; acreditou na arte e investiu no que pensava ser transformação social através do jornalismo e da literatura. A liberdade sexual, a maternidade tumultuada, a disposição para viagens comprometidas com suas ideias, o engajamento político e cultural, nenhuma dessas imagens pareciam adequadas para inspirar as mulheres brasileiras da década de 1970”.

De fato, Patrícia Galvão representava a não conformidade, sendo uma mulher que exercia a sua liberdade para combater injustiças sociais e contribuir para a literatura mundial.

Paralelamente à construção do jornal Vanguarda Socialista, em 1945, Patrícia Galvão lançou seu primeiro romance, A famosa revista, em parceria com Geraldo Ferraz. À época, Pagu também fez a primeira tradução do dramaturgo Ionesco e entrou na Escola de Arte Dramática. Já em 1950, concorreu a uma vaga de deputada estadual pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB, sem se eleger. Traduziu e dirigiu a peça Fando e Lis, do dramaturgo espanhol Arrabal. Impulsionou grupos amadores e estudantis de teatro, envolvendo-se com a produção cultural e tendo assumido a presidência da União do Teatro Amador de Santos, posição até então só ocupada por homens.

Patrícia faleceu em 12 de dezembro de 1962.

Palavras-Chave/TAG: #arte #modernismo #feminismo #europa #internacional #mulheresnomodernismo

Texto Adaptado do verbete contido no Dicionário Mulheres do Brasil por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.

REFERÊNCIAS

  • Produções acadêmicas:

ARMONY, Adriana, Pagu no Metrô. Edição Nós, 1ª Edição: 2022. Disponível em: Pagu no metrô – 9786586135565 – Livros na Amazon Brasil. Acesso em: 06 dez 2022. 

CAMPOS, Augusto de. Pagu Vida-Obra.  Companhia das Letras: 2014. Disponível em: 13720 – Pagu.indd (companhiadasletras.com.br). Acesso em: 06 dez 2022.

CORRÊA, Mariza. A propósito de Pagu. Cadernos Pagu: Campinas, 1993. Disponível em: .A propósito de Pagu | Cadernos Pagu (unicamp.br). Acesso em 06 dez 2022.

GALVÃO, Patrícia. Parque Industrial. Editora Cintra São Paulo: São Paulo, 1933. Disponível em: (99+) Patrícia Galvão (Pagu) Parque Industrial romance Editora Cintra São Paulo 2013 | Jade Martins Rassoé – Academia.edu. Acesso em 06 dez 2022.

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LEAL, Tânia; PEREIRA, Marcos Paulo Torres. As mulheres modernas de Pagu em Parque industrial. Revista Letras Escreve v. 9, n. 1: Macapá, 2019. Disponível em: As mulheres modernas de Pagu em Parque industrial | Leal | Letras Escreve (unifap.br). Acesso em 06 dez 2022.

MANFRINI, Bianca Ribeiro. PAIXÃO PAGU:A AUTOBIOGRAFIA PRECOCE DE PATRÍCIA GALVÃOPatrícia Galvão.  [São Paulo:  Agir, 200 5,159 p.]. Teresa – Revista de Literatura Brasileira, 8[9], p. 395-428: São Paulo, 2008. Disponível em: Vista do Paixão Pagu: autobiografia precoce de Patrícia Galvão (usp.br). Acesso em 6 dez 2022.

MORAES, Letícia Nunes de. Histórias de Pagu: memória, feminismo e cultura política. Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13thWomen’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos): Florianópolis, 2017. Disponível em: 1498843170_ARQUIVO_LeticiaNMoraes_Texto_completo_MM_FG.pdf (dype.com.br). Acesso em 06 dez 2022.

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ZATZ, Lia. Pagu – Coleção A Luta de Cada Um. Instituto Callis: Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: Pagu – Coleção A Luta de Cada Um | Amazon.com.br. Acesso em 06 dez 2022

  • Sites:

Pagu. Paixão Pagu – uma autobiografia precoce de Patrícia Galvão. 27 de maio de 2005. Disponível em: Paixão Pagu – uma autobiografia precoce de Patrícia Galvão – Viva Pagu. Acesso em 06 dez 2022. 

Pagu. Foco e Escopo. Sobre a Revista. Disponível em: Sobre a Revista | Cadernos Pagu (unicamp.br). Acesso em 06 dez 2022.

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