• Mãe Menininha (1894 – 1986)

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15 de maio de 2024 por 

Líder religiosa e política

Mãe Menininha de Gantois foi uma das mais célebres mães de santo do Brasil.

Nasceu em 10 de fevereiro de 1894, em Salvador, com o nome de batismo Maria Escolástica Conceição Nazaré. É neta de Maria Júlia da Conceição Nazaré, que fundou o Terreiro dos Gantois em 1849. Teve duas filhas, Carmem e Cleusa, com seu marido Álvaro McDowell de Oliveira. Cleusa se tornou sua sucessora no Terreiro dos Gantois. Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil em Dicionário Mulheres do Brasil nos contam a história: “Maria Júlia, bisavó de Menininha, após acirrada disputa sucessória na Casa de Iá Nassô, desencadeada com a morte de Marcelina da Silva, Obá Tossi, fundou o terreiro no Alto do Gantois, na casa onde sua família já estava instalada desde a década de 1870. Essa propriedade pertencia anteriormente a uma família francesa, os Gantois, daí a origem do nome. No Gantois a sucessão foi sempre por via dinástica e herança genética. Assim, quando Maria Júlia morreu, foi sucedida pela ialorixá Pulquéria da Conceição Nazaré, sua filha natural; anos depois, após a morte desta, assumiu Maria da Glória Nazaré, que dirigiu o templo somente por dois anos. Com esta perda, Mãe Menininha se afastou dos trabalhos no terreiro, só frequentando algumas poucas cerimônias. Em uma destas ocasiões, em fevereiro de 1922, quando se celebrava um ritual pela memória de Pulquéria, ela foi designada, pelos orixás, a ocupar a direção do terreiro”.

O Terreiro dos Gantois passou a ser dirigido pela Mãe de Santo quando tinha 28 anos, à época já casada. Ao longo dos 60 anos de liderança do terreiro, Mãe Menininha construiu relações com inúmeras pessoas das mais diversas classes sociais. Neste sentido, teve atuação importante em diversas mudanças sociais de seu período. Viveu praticando sua fé, ensinando sobre o candomblé a todos. Similarmente, lutou contra injustiças a benefício de toda a sociedade. A exemplo, entre os anos 1930 e 1970, o Estado realizava invasões a terreiros, apreensões de objetos religiosos e agressões a participantes de cultos através das chamadas “batidas policiais”, sob responsabilidade da Delegacia de Jogos, Costumes e Diversões Públicas, amparado pela Lei de Jogos e Costumes de 1930. Mãe Menininha teria sido chave para a sanção, pelo então governador Roberto Santos, em 1976, do decreto que liberava as casas de Candomblé, centros religiosos, da obtenção de licença, bem como de pagamento de taxas à Delegacia de Jogos, Costumes e Diversões Públicas.

Dentre suas conquistas, Mãe Menininha também foi importante para a aceitação de mulheres com roupas tradicionais de religiões de matriz afro-brasileira nas igrejas católicas da época. Vale mencionar o racismo estrutural e a misoginia da época operando contra corpos de mulheres negras. Frente a essa realidade, Mãe Menininha vivenciou a sua fé de forma ecumênica, participando de cultos católicos e se aproximando de bispos baianos. Resultado de suas articulações, tanto ela quanto diversas outras mulheres puderam se vestir conforme suas tradições para acessar igrejas católicas, anteriormente proibido. Importa mencionar que Mãe Menininha abriu as portas de seu terreiro para pessoas de outras origens e costumes religiosos, permitindo uma realidade ecumênica no próprio Terreiro dos Gantois.

Mãe Menininha tem sua atuação relevante também para as ciências brasileiras. Conforme ensina o professor Lívio Sansone, do Centro de Estudos Afro Orientais da UFBA – Universidade Federal da Bahia, “era uma mensageira entre dois mundos: o mundo da casa de santo e o mundo da sociedade mais ampla”. Reflexo disso, Mãe Menininha era procurada nos anos 1980 por inúmeros políticos, artistas e pesquisadores, dentre tantas outras pessoas das mais variadas profissões e classes sociais. Mãe Menininha atuava espiritualmente através de seus conselhos e orientações, bem como através da prestação de informações a intelectuais para benefício das ciências.

Há registros de que Mãe Menininha foi avessa à fama. Tal não impediu que admiradores e beneficiários de sua atuação religiosa e política prestassem suas homenagens à mãe de santo. Dentre as diversas recebidas por Mãe Menininha, menciona-se a canção Oração a Mãe Menininha, composta por Dorival Caymmi em 1972. Similarmente, a Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel homenageou a Mãe de Santo com o enredo Mãe Menininha do Gantois, do carnavalesco Arlindo Rodrigues. No desfile, em 1976, Elza Soares interpretou o samba, e Ney Vianna foi o puxador. A agremiação ficou em terceiro lugar na disputa carioca. Menciona-se que Mãe Menininha foi nomeada madrinha do afoxé pelos Filhos de Gandhy, afoxé brasileiro fundado por estivadores portuários de Salvador.

Schuma e Érico em Mulheres Negras do Brasil apresentam algumas fotos de Mãe Menininha. O livro apresenta os seguintes comentários ao lado de uma das fotos: “Mãe Menininha – Maria Escolástica da Conceição Nazaré (1894 – 1986), uma das mais representativas e veneradas Iyalorixás do Brasil. Inspirou poetas, recebeu inúmeras homenagens e magistralmente conjugou firmeza, sabedoria e doçura no exercício de seu sacerdócio. Esteve a frente do Terreiro do Gantois durante 64 anos. Na foto aparece com e sua filha mais velha, mãe Cleusa Cleusa Millet (1931 – 1998), que a sucedeu na direção da casa entre 1989 e 1998”.

Mãe Menininha faleceu em 13 de agosto de 1986, aos 92 anos, em Salvador, sua cidade natal. Sua vida marcou positivamente toda a sociedade brasileira, sendo até hoje lembrada com carinho. Vide o lançamento, em 1994, de um selo comemorativo em homenagem ao centenário de seu nascimento, pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. A composição de Caetano Veloso, “Bahia, minha preta”, de 1993, também menciona com afeto a mãe de santo. Tais são celebrações da vida da líder religiosa que afetou positivamente a vida de todas as mulheres e de todos os negros da Bahia e do Brasil através do amor ao próximo, de sua fé, do ecumenismo e do combate às desigualdades.

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Texto Adaptado do verbete contido no Dicionário Mulheres do Brasil e do Mulheres Negras do Brasil por: Emilson Gomes Junior e Schuma Schumaher.

REFERÊNCIAS

  • Produções acadêmicas:

SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRAZIL, Érico. Dicionário Mulheres do Brasil, de 1500 até a atualidade: biográfico e ilustrado. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

SCHUMAHER, Schuma; VITAL BRASIL, Érico. Mulheres Negras do Brasil. Senac Editora: Rio de Janeiro, 2006. Disponível em: Mulheres Negras do Brasil 9788574582252 – DOKUMEN.PUB. Acesso em 22 nov 2022.

  • Sites:

Fundação Cultural Palmares. Personalidades negras – Mãe Menininha do Gantois. Disponível em: Personalidades Negras – Mãe Menininha do Gantois – Fundação Cultural Palmares. Acesso em 22 nov 2022.

ISER – Instituto de Estudos da Religião. CINCO FATOS SOBRE MAE MENININHA DO GANTOIS EM DEFESA DA DIVERSIDADE RELIGIOSA NO BRASIL. Rio de Janeiro, 12 de fevereiro de 2021. Disponível em: Cinco fatos sobre Mae Menininha do Gantois em defesa da diversidade religiosa no Brasil | ISER – Instituto de Estudos da Religião. Acesso em 22 nov 2022.

Memorial Mãe Menininha do Gantois. Criação. Disponível em: Memorial | Terreiro do Gantois. Acesso em 22 nov 2022.

Museu Afrobrasil. Mãe Menininha. História e Memória: São Paulo. Disponível em: Mãe Menininha (museuafrobrasil.org.br). Acesso em 22 nov 2022.

RODNEY, Pai. Mãe Menininha do Gantois e o poder dos terreiros. Carta Capital: Rio de Janeiro, 20 de abril de 2018. Disponível em: Mãe Menininha do Gantois e o poder dos terreiros – CartaCapital. Acesso em 22 nov 2022.

SAMBIO – Associação de Amigos do Museu de Biologia Mello Leitão. Mãe Menininha. Santa Teresa, 12 de novembro de 2018. Disponível em: Mãe Menininha – SAMBIOSAMBIO. Acesso em 22 nov 2022.

UOL. Mãe Menininha do Gantois. Página 3 Pedagogia & Comunicação: 21 de agosto de 2005. Disponível em: Mãe Menininha do Gantois – Biografias – UOL Educação. Acesso em 22 nov 2022.

VAINSENCHER, Semira Adler. Mãe Menininha do Gantois. Jornal do Sudoeste, postagem de Antônio Novais Torres. Disponível em: Mãe Menininha do Gantois – Jornal do Sudoeste – Apenas a verdade. Acesso em 22 nov 2022.

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